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Jacir Marcelino da Veiga e o barco Mestre do Mar, que é como o dono se sente quando vai para a pesca em Pontal do Paraná | Walter Alves/Gazeta do Povo
Jacir Marcelino da Veiga e o barco Mestre do Mar, que é como o dono se sente quando vai para a pesca em Pontal do Paraná| Foto: Walter Alves/Gazeta do Povo

Batismo

Quando a embarcação é nova, não há um ritual padrão para batizá-la. Mesmo assim a festa é garantida com pelo menos um churrasco e uma cervejinha.

Mas se a embarcação é oceânica, a tradição de batismo é milenar: assim que a ela atravessa a linha do Equador, os tripulantes e passageiros fazem uma festa em homenagem ao deus do mar da mitologia romana, Netuno. Todo novato veste-se como Netuno, com barba branca feita de algodão e um tridente para pedir proteção, conta o marinheiro Emerson Antonio Araújo, 38 anos, que trabalha com barcos de turismo em Paranaguá.

O batismo de Emerson aconteceu em 1998 em um navio petroleiro em que ele trabalhava como mecânico naval. "É como colação de grau, às vezes jogam ovo, farinha, é só brincadeira", conta.

Reza a lenda entre os pescadores que nome dado a um barco é nome mantido. É como uma pessoa batizada: a nomenclatura mostra muito da personalidade da embarcação e, claro, de quem a escolheu e vai trabalhar com ela. Além de tudo, dizem, que mudar a identificação do barco ou da canoa não é sinal de sorte no mar.

Hoje, fora a superstição, há também a burocracia que dificulta a troca de nomes. Assim como o registro de carros no Detran, as embarcações têm de ter o cadastro na Capitania dos Portos. Além disso, para determinadas áreas e para a captura de determinadas espécies, o pescador também precisa de licença do Ministério da Pesca.

O cadastro desses dois documentos é feito a partir do nome da embarcação. Por isso, quando o nome do barco é mudado, todas essas licenças precisam ser renovadas.

Com tamanha responsabilidade, recorre-se a nomes bíblicos ou de parentes, em especial de filhos, para que a nomenclatura tenha força. Sempre levando em conta a tradição de que canoas recebem termos femininos e barcos, masculinos.

É o caso da canoa de Edson da Veiga Martins, 53 anos, pescador há 28, que foi comprada há três anos em Paranaguá, com o nome Barata I. Por coincidência, Barata é o apelido de uma amiga de Edson, que sempre quis a homenagem. "Ela ficou louca de contente", conta ele. Além da Barata I, Edson teve também uma embarcação batizada por ele de Renascer I. A inspiração veio da novela de mesmo nome, que passou em 1993, na Rede Globo, e de uma fase ruim pela qual passava. "Eram tempos muito difíceis, de uma fase em que perdi tudo o que tinha e resolvi colocar este nome", diz.

O que não é muito comum entre os donos de embarcações é batizá-las com o nome da esposa. "Os filhos são para sempre, já a mulher...", explica Edson.

Mesmo assim, o presidente da Associação Barcopar, Luiz Carlos Gonçalves Souza, de 48 anos, foi contra a maré e decidiu dar o no­­me de sua esposa, Irani, à embarcação que leva passageiros de Paranaguá a outras ilhas da re­­dondeza. O casal está junto há nove anos e antes de Irani, a ex-mulher de Luiz também deu nome a um barco, mas isso são águas passadas, brinca ele.

Histórias inspiradas não faltam. Jacir Marcelino da Veiga, 54 anos, mais conhecido como Catum, é vice-presidente da colônia de pescadores de Pontal do Paraná. Sua atual canoa é uma exceção e leva um nome masculino, de Mestre do Mar, que é como Catum se sente quando está na água. Mas a primeira canoa do pescador é a de nome mais curioso: chamava-se Fio de Cabelo, em homenagem à música da dupla Chitãozinho e Xororó.

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