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Faichecleres: banda agora conta com um novo baixista, Ricardo Junior (primeiro à direita). | Divulgação
Faichecleres: banda agora conta com um novo baixista, Ricardo Junior (primeiro à direita).| Foto: Divulgação

Castro – Foram dez meses de aterrorizar. Em setembro houve o primeiro caso de tortura seguida de morte, em novembro o estupro de uma menina de 8 anos, em dezembro a segunda morte por tortura, no início de maio o seqüestro de um ônibus com 60 passageiros e no final de maio, a invasão de vândalos a uma escola. Não bastasse a gravidade de cada caso isoladamente, todos esses acontecimentos foram intercalados por tiroteios freqüentes e um tráfico de drogas que não dá trégua. Rio de Janeiro? Não! Tudo isso vem acontecendo em Socavão, uma vila de 978 habitantes num longinquo distrito rural de Castro, a 180 quilômetros de Curitiba.

Reunidos na associação de moradores, na semana passada, representantes da população local nem sabiam por onde começar o relato diante de tanta desgraça. Não há mais lugar seguro, seja na escola ou na única rua asfaltada do lugarejo. Outro risco são as balas perdidas nos tiroteios, possivelmente em acertos de conta do tráfico de drogas, que chegou bem antes do que o progresso neste lugar onde só se chega depois de enfrentar 45 quilômetros de uma sacolejante estrada de chão.

Ninguém arrisca a se expor, mas muitos aceitam falar sem se identificar. Assim, contam do choque mais recente: a invasão do Colégio Estadual Fabiana Pimentel, no último dia 30. Faltava pouco para as 18 horas quando um grupo de vândalos entrou no ginásio de esportes, ameaçou de morte o professor de Educação Física e estabeleceu o terror entre as crianças que treinavam para os Jogos Estudantis de Castro. Não houve feridos, mas os alunos, cuja idade variava de 7 a 10 anos, ficaram aterrorizados. Alguns ainda estão com medo de voltar às aulas. Dias antes, ladrões já haviam arrombado a porta do mesmo colégio para roubar a carne doada pela comunidade para a merenda escolar.

Mães das crianças ainda cobram da polícia a localização da arma com a qual o grupo teria ameaçado o professor. O diretor de Segurança Pública da Prefeitura de Castro, o subtenente licenciado da PM Antônio Sérgio de Oliveira, diz que a maioria era menor de 18 anos e por isso o Conselho Tutelar foi acionado. Segundo ele, um adolescente apenas teria feito a ameaça com a mão na cintura, simulando segurar algo. "Em momento algum mostrou arma", garante Oliveira. Os pais dos arruaceiros foram notificados a comparecer à delegacia para prestar esclarecimentos.

Segundo os moradores, no dia seguinte à invasão do ginásio de esportes, numa atitude nada usual, a Polícia Militar levou o professor e dois empregados da escola na casa de cada um dos suspeitos para que, de cara limpa, fizessem o reconhecimento dos integrantes do grupo. "Em nenhum momento os policiais se preocuparam se isso iria colocá-los em perigo", diz o filho de um dos empregados. O subtenente nega que eles tenham sido expostos desta forma. "Eles apenas apontaram onde ficava a casa dos acusados", diz. Quem estava lá garante que ficou exposto ao alcance dos olhos dos suspeitos.

Outro acontecimento ainda vivo na memória dos moradores de Socavão é o seqüestro do ônibus que transportava 60 passageiros, na maioria aposentados e servidores públicos que foram a Castro para sacar a aposentadoria ou o salário, já que na vila não há posto bancário. Na volta, três homens embarcaram no ônibus e logo deram voz de assalto. Com um revólver apontado para a cabeça, o motorista teve de entrar no mato, onde outros integrantes da quadrilha aguardavam num carro bordô. Tiraram a roupa do motorista e o colocaram no bagageiro do ônibus, junto com mais cinco passageiros.

Os demais tiveram de deitar no chão e os bandidos passaram a recolher dinheiro, roupas e celulares. Rasparam o caixa do cobrador e, no total, levaram cerca de R$ 15 mil em dinheiro. Um idoso levou uma coronhada na cabeça por se recusar a entregar os pertences. Passado o susto, um adolescente que conseguiu esconder o celular avisou a polícia. Ninguém foi preso. "Eram pelo menos seis bandidos e sabiam que essa gente toda tinha ido buscar dinheiro na cidade", diz um comerciante. "Agora está todo mundo com medo que isso se repita."

Os moradores do Socavão têm ainda outros motivos para se preocupar. Dois crimes chocaram a pequena vila. No dia 7 de setembro, Antônio Carlos Rodrigues do Nascimento, de 50 anos, foi morto apedrejado, na região da Lagoa dos Alves, por dois irmãos. O mais novo tinha 16 anos de idade e o mais velho era fugitivo da cadeia de Castro. Em dezembro, no dia 26, um homem foi encontrado agonizando na rua central da vila. Ele havia sido espancado, teve os cabelos incendiados e partes do corpo cobertas por plástico derretido. O homem morreu deixando cinco filhos. O crime continua sem solução.

Em outras localidades isoladas do distrito de Socavão pipocam denúncias de assaltos e pequenos furtos. Mas não só isso. Em Imbuial, por exemplo, uma menina de 8 anos de idade foi estuprada em novembro. O acusado, vizinho da vítima, fugiu. Nem o cemitério da vila escapou. Em novembro, ladrões fizeram uma limpa nos túmulos, levando cerca de 80 placas de bronze e alumínio. Os moradores do Socavão não entendem as causa desta onda de violência, mas têm uma certeza: a impunidade está contribuindo para o aumento da criminalidade. "O bandido vê que o outro não foi punido, então sente-se mais seguro para agir", analisa uma líder comunitária.

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