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“A medida, na verdade, não está encerrando a prerrogativa de foro, mas está criando um modelo de foro duplo, de compartilhamento. Se trata de um modelo bastante complexo que certamente retardará ainda mais o processo penal e poderá trazer ainda como ensejo a prescrição.” Gilmar Mendes, presidente do STF | Rodolfo Bührer/ Gazeta do Povo
“A medida, na verdade, não está encerrando a prerrogativa de foro, mas está criando um modelo de foro duplo, de compartilhamento. Se trata de um modelo bastante complexo que certamente retardará ainda mais o processo penal e poderá trazer ainda como ensejo a prescrição.” Gilmar Mendes, presidente do STF| Foto: Rodolfo Bührer/ Gazeta do Povo

Consequências

Gafanhoto e mensalão sairiam do STF

Se a PEC que cria o foro duplo entrar em vigor, o Supremo Tribunal Federal (STF) será obrigado a transferir para a Justiça de primeira instância milhares de investigações e processos em andamento, como os do caso do mensalão e os do esquema gafanhoto.

Este último caso envolve 63 deputados e ex-deputados estaduais do Paraná, que estão sob suspeita de envolvimento na apropriação de salários de funcionários e de contratação de servidores fantasmas. O esquema está sendo investigado desde 2005 pela Polícia Federal e Ministério Público Federal.

Outro caso que sairia das mãos do STF e seria investigado pela Justiça de primeira instância envolve os 39 réus do escândalo do mensalão, que respondem a processo desde 2007. Entre eles, estão os ex-deputados paranaenses José Borba e José Janene.

Para o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Paraná, Alberto de Paula Machado, a transferência facilitaria a vida de quem está sendo julgado pelo STF. Segundo ele, na primeira instância os processos teriam de começar do zero e isso faria com que tenham vida longa no Judiciário.

"Da forma como a PEC está, piora a situação porque os tribunais terão de autorizar a abertura dos processos e remeter para a primeira instância. Vai demorar muito mais tempo para serem julgados, por causa dos recursos", disse Machado.

O foro privilegiado, segundo o presidente da OAB, criou o mito da impunidade. Mas, para ele, o sistema pode ser mais ágil porque elimina recursos, ao contrário do que muita gente pensa. (KC)

A Câmara dos Deputados reacendeu a polêmica sobre o fim do foro privilegiado. A pretexto de acabar com essa prerrogativa das autoridades em seus julgamentos, uma proposta de emenda constitucional (PEC) acaba por criar na verdade um foro duplo.

A PEC, que ainda não tem data para ser votada, chegou a ser incluída pelo presidente da Câmara, Michel Temer (PT-SP), na pauta de votação da última quarta-feira. Mas o assunto acabou não sendo discutido. A proposta estabelece que as autoridades dos três poderes não serão mais julgadas diretamente nos tribunais superiores ou de segunda instância, sem passar pela primeira instância judicial. Mas, ao mesmo tempo, o projeto estabelece que os tribunais superiores terão a tarefa de autorizar ou não a abertura da ação penal pela Justiça de primeira instância.

Atualmente, os prefeitos só podem ser julgados pelos Tribunais de Justiça (TJs), governadores e desembargadores pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e senadores e deputados federais pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Pela proposta, além de decidir sobre a abertura dos processos, os tribunais superiores ou os TJs também deverão ser consultados pelos juízes de primeira instância sobre medidas como a quebra de sigilo telefônico ou autorização para grampear e prender autoridades suspeitas.

A PEC foi apresentada em agosto de 2007 pelo deputado Marcelo Itagiba (PSDB-RJ), mas o texto atual é do deputado Régis de Oliveira (PSC-SP), que atuou no Judiciário por 31 anos, tendo por quatro exercido a função de desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo.

A pressão para votação do projeto teria partido justamente de deputados que são réus do mensalão, o suposto esquema de compra de apoio político no Congresso, em 2005. Eles temem ser condenados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e, com as mudanças nas regras do foro, ganhariam mais tempo na Justiça – especula-se que seria uma estratégia para o crime prescrever.

O presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, criticou o projeto: "A medida, na verdade, não está encerrando a prerrogativa de foro, mas está criando um modelo de foro duplo, de compartilhamento. Se trata de um modelo bastante complexo que certamente retardará ainda mais o processo penal e poderá trazer ainda como ensejo a prescrição", afirmou.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) também atacou a proposta com o argumento de que favorece governadores e desembargadores e pode levar à impunidade. Se­­­gundo Walter Nunes, conselheiro do CNJ, a eventual aprovação da PEC promoverá "um dos maiores retrocessos" no sistema criminal do país nos últimos anos. "Um processo relativo a um governador hoje fica no STJ porque, se ficar no Tribunal de Justiça do estado, isso pode ensejar algum tipo de interferência ou pressão. Isso não pode mudar", afirmou Nunes. Outro problema, segundo ele, seriam os de­­­­sem­­­bargadores – magistrados que compõe os TJs – que seriam julgados pelos próprios colegas.

O deputado Régis de Oliveira, relator da PEC, considerou "ridículas" as críticas. "Eu confio na Justiça. Pode haver maior pressão lá embaixo (na Jus­­­tiça estadual)? Pode. Mas pode ocorrer aqui também (na Justiça superior). Os argumentos do conselheiro não procedem."

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