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OAB irá ao STF contra as doações ocultas

Rhodrigo Deda, com Agência Estado

O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto, afirmou ontem ser um absurdo a permissão de doações ocultas nas campanhas eleitorais – um dos itens do projeto aprovado pela Câmara dos Deputados na noite de quarta-feira. A regra permite repasses de pessoas físicas e jurídicas a partidos políticos que, por sua vez, podem encaminhar indiscriminadamente recursos aos candidatos. Isso impediria que o eleitor saiba quem foram os reais financiadores das campanhas dos eleitos.

"Não se pode esperar de um parlamento que se notabiliza pelo uso de atos secretos que deixe de manter secretas as doações", disse Britto ontem em Curitiba. Ele informou que a OAB deve questionar o dispositivo no Supremo Tribunal Federal (STF).

Segundo Britto, a OAB vem fazendo uma discussão aprofundada sobre a necessidade de financiamento público de campanha. Ele considera importante desvincular os financiadores de campanhas eleitorais de futuros benefícios que poderiam ter dos políticos eleitos. "Ora, se torna oculto quem é financiador, você não vai permitir ao eleitor, que é soberano, saber qual dos interesses serão representados economicamente ou socialmente por aquele que venha a ser eleito", afirmou. "Ocultar o financiador é o mesmo que esconder o futuro compromisso de nosso representante."

Ele também comentou a derrubada da emenda do senador Pedro Simon (PMDB-RS) que exigia "reputação ilibada" para os candidatos. Para Britto, a queda da proposta não quer dizer que ela não será exigida. "Ao contrário", disse ele. "Na nossa compreensão, essa regra continua e faz com que não nos desmotivemos em exigir conduta ilibada dos candidatos". Para Britto, outras leis já exigem para qualquer cargo público o pressuposto da idoneidade e conduta ilibada. "Esse requisito deveria ser inerente ao próprio exercício profissional."

Recall

O presidente da OAB também afirmou ontem que a entidade está encampando um projeto que instituiria o "recall" dos eleitos – em que seria possível realizar "nova eleição" para submeter ao eleitorado a decisão de renovar ou não os mandatos políticos que passam por problemas durante o mandato. A proposta prevê que o referendo poderia ser convocado por 5% do eleitorado, depois de transcorrido pelo menos um ano do mandato.

Brasília - A Câmara dos Deputados derrubou no noite de quarta-feira, em uma votação-relâmpago, parte do texto da reforma eleitoral aprovada pelo Senado na terça-feira. O principal ponto barrado pelos deputados era o trecho da lei que tentaria coibir a candidatura de políticos com fichas sujas nas eleições. Também foi autorizado a ampliação de programas sociais pelos governos em ano eleitoral, o que havia sido proibido pelos senadores. A Câmara também derrubou a emenda do Senado que estabelecia eleição direta para substituir governantes cassados, em todos os casos de cassação.

Apesar disso, os deputados mantiveram a liberdade de cobertura jornalística e de opinião na internet durante o período eleitoral. O projeto de lei agora só depende da sanção do presidente Lula para entrar em vigência já nas eleições do ano que vem.

Idoneidade caiu

Uma emenda do senador Pedro Si­­­mon (PMDB-RS), aprovada pelo Senado, exigia comprovação de idoneidade moral no momento do registro da candidatura. Para os de­­­putados, o texto daria margem a que diversos juízes eleitorais barrassem candidaturas a partir da avaliação de que esses po­­­líticos não tinham idoneidade.

"Isso é ridículo, é fazer lei sem responsabilidade", justificou o líder do PT na Câmara, Cândido Vaccarezza (SP). "Dizer que tem que ter reputação ilibada é jogar para a plateia. Quem vai dizer: o juiz? A boa técnica legislativa não combina com pirotecnia."

Com a modificação do texto do Senado, fica mantida a candidatura dos "fichas-sujas". Só poderão ter candidaturas barradas os políticos que estejam condenados em última instância pela Justiça.

Outros pontos derrubados pelos deputados foram a emenda que proibia a criação e ampliação de programas sociais no ano da eleição e a que permitia a propaganda paga na internte exclusivamente pelos candidatos à Presi­­­dência. Agora, nenhum candidato poderá fazer propaganda eleitoral na rede.

Os deputados também restabeleceram a obrigatoriedade de 2% dos votos serem impressos a partir das eleições de 2014, para efeito de auditoria – ponto que havia sido derrubado pelos senadores. Os votos impressos terão de manter o anonimato do eleitor e poderão ser usados para determinar uma eventual recontagem. Também foi aprovada a possibilidade de os eleitores, nos pleitos presidenciais, votarem quando estiverem fora de seu domicílio eleitoral.

A Câmara só acatou as mudanças aprovadas pelo Senado no que diz respeito à liberdade de cobertura jornalística e de opinião, durante o período eleitoral, na internet. Para debates em sites comerciais, as regras serão as mesmas aprovadas no Senado: dois terços dos candidatos têm de aprová-las. A doação oculta aos candidatos por meio dos partidos, uma pro­­­pos­­­­­­­­ta original da Câmara aprovada pelo Senado, também se manteve.

Às pressas

A votação da reforma eleitoral na noite da quarta-feira na Câmara aconteceu às pressas, após um acordo de lideranças, e pegou muitos deputados de surpresa. "É um absurdo! Vamos vo­­­tar sem sequer saber o que o Se­­­nado aprovou. Deram um chega para lá nos senadores", reclamou o deputado Arnaldo Ma­­­­deira (PSDB-SP).

O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), evitou ontem fazer qualquer comentário sobre as mudanças introduzidas pela Câmara no projeto aprovado no Senado. "Temos de manter o princípio da harmonia nas duas Casas Legislativas", disse Sarney.

Para o TSE, reforma tem mais retrocessos do que avanços

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Carlos Ayres Britto, avaliou que o projeto final de reforma eleitoral aprovado pelo Congresso teve mais retrocessos do que avanços. Ayres Britto ainda disse que a Justiça Eleitoral "se viu descontemplada na sua jurisprudência em vários aspectos e também nas suas expectativas".

Ele não gostou das regras para as doações eleitorais. "O trabalho da Justiça Eleitoral ficou extremamente dificultado. Queríamos uma lei que nos possibilitasse fazer um caminho seguido pelo dinheiro, desde o primeiro doador até o último destinatário. Espe­­­rávamos que a lei investisse em mecanismos coibitivos de caixa dois e doação oculta", disse Britto.

"Continua faltando transparência (...) A menos que o Poder Exe­­­cutivo vete esses dispositivos. Não tenho expectativa quanto a isso mas, no plano da possibilidade, o veto é viável."

Para o presidente do TSE, o retorno do voto impresso também "foi um retrocesso". "Temos que lamentar porque, se o objetivo é auditar a urna eletrônica, é possível auditar com toda segurança a urna eletrônica sem precisar do voto impresso que, quando testado em 2002, resultou em atraso de votação, no atolamento das má­­­­quinas impressoras. O voto im­­presso onera a eleição."

Britto criticou ainda a decisão da Câmara dos Deputados de manter para a internet as mesmas regras de debates eleitorais que são impostos às emissoras de rádio e televisão – que são concessões pú­­­­blicas e, a partir do ano que vem, terão de convidar ao menos dois terços dos candidatos para produzir esse tipo de programa.

"Temos a lamentar que terminou prevalecendo a analogia entre a internet e as emissoras de rádio e de televisão", disse Ayres Britto. "Achamos que qualquer analogia cabível só poderia ser com a mídia im­­pressa ou escrita, porque o espaço de liberdade é muito maior, in­­­clusive para posicionamentos a favor de determinadas candidaturas ou contra. A comparação da in­­­ternet com mídias que dependem da concessão do poder pública, para nós, prejudica esse dinamismo que queremos para o processo eleitoral."

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