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No dia 12 março deste ano (portanto, há quase seis meses) a Valec – a estatal federal que cuida dos projetos ferroviários – lançou edital visando a contratar empresas para elaboração dos projetos de engenharia de alguns trechos componentes da ferrovia Norte-Sul, incluindo os que atravessariam o território paranaense. A secretaria estadual de Infra-Estrutura e Logística tinha conhecimento do edital, um documento de 172 páginas nas quais constavam até mapas dos exatos trechos que cortariam estado.

Na edição do dia 28 de junho, esta coluna previu já no primeiro parágrafo: "O governo estadual precisa vencer a letargia e correr para evitar que o Porto de Paranaguá deixe de ser o destino das exportações agrícolas do Paraná e do Mato Grosso do Sul, que tenderão a ser despachadas pelo Porto de Rio Grande (RS)." O texto, com informações garimpadas no próprio edital da Valec, descrevia os trajetos, informava sobre a diferença de bitolas entre as previstas ferrovias e as existentes no estado e informava que, em razão desses fatores, a produção do Paraná e do Mato Grosso do Sul tomaria o rumo do porto de Rio Grande deixando Paranaguá a ver navios. O título da matéria resumia o problema: "A ferrovia que deixa o Paraná sem destino".

Alegar surpresa tão tardia e apelar para retórica política segundo a qual "o Paraná foi varrido do mapa pelo governo federal", como disse o governador Beto Richa, só "cola" entre os desinformados. É difícil imaginar que o governo estadual se classifique na categoria dos desinformados e por isso, antes mesmo do lançamento do edital da Valec, o Paraná deveria ter tomado a iniciativa de "brigar" para que, pelo menos, a estatal Ferroeste (administrada pelo governo do estado) fosse integrada à nova malha.

Nem isto seria suficiente: ainda que com o sacrifício de transpor gargalos técnicos e empresariais (estes causados pela privada ALL, que explora a Central do Paraná), restaria ainda um outro gargalo sobre o qual não se tem notícia de que o governo estadual tenha lutado para romper: trata-se da obsoleta travessia da Serra do Mar, feita numa ferrovia construída no século 19. Na melhor das hipóteses, a produção chegaria "bem" até Curitiba. E, quando conseguisse chegar a Paranaguá, encontraria lá as crônicas deficiências do porto paranaense.

Esta falta de visão estratégica não é privilégio do atual governo. A última grande obra de melhoria da infra-estrutura do estado se deu na década de 90 com a instituição do pedágio que, embora muito caro, pelo menos tornou transitáveis as depauperadas rodovias do Anel de Integração. E parou por aí: obras contratadas deixaram de ser feitas, o pedágio não acabou, a tarifa não abaixou e nem foi para frente a prometida negociação com as concessionárias.

À procura do tempo perdido

Já se passaram quase 17 anos. E o que aconteceu nesse tempo?

• A Ferroeste (então privatizada para a Ferropar, um "rabicho" de 300 km que liga Cascavel a Guarapuava) foi à falência e, de volta ao domínio estatal em 2007, sequer tem locomotivas e vagões próprios para transportar a produção do Oeste, que continua vindo em maior parte de caminhão para Paranaguá.

• Também nunca se chegou a um acordo sobre o melhor traçado de uma extensão para Ferroeste – se por Ipiranga, interligando-se à Central do Paraná, ou se em linha direta para Curitiba via Irati.

• O Porto de Paranaguá, autarquia do governo estadual, se inviabiliza a cada dia por falta de dragagem de aprofundamento (que só agora se inicia) e péssima administração ao longo de oito anos. Como decorrência desse descaso, ontem 113 navios aguardavam ao largo para atracar, alguns já há 45 dias em alto mar, gerando prejuízos de muitos milhões de dólares.

• Já quase entrando na metade do mandato, após descobrir que não há nenhum na gaveta, Richa prometeu, ontem, destinar R$ 50 milhões para a elaboração de projetos rodoviários no estado. É bom frisar: serão ainda projetos e não obras que, promete, só serão iniciadas no ano que vem e executadas ao longo de cinco anos. Os projetos de engenharia serão terceirizados, pois o DER já não conta com quadros próprios sequer para fiscalizar as rodovias existentes.

Em resumo, o Paraná não fez e não faz a sua parte. Ao contrário, no passado recusou recursos federais disponíveis e agora não se articula politicamente nem busca parcerias privadas – nada, ou quase nada. E agora chora tarde sobre o leite derramado.

Não sejamos injustos: ontem, o governador Beto Richa convenceu a Assem­­bleia Legislativa a aprovar uma mensagem dirigida à presidente Dilma Rousseff rogando correções no programa ferroviário lançado há uma semana. É pouco e talvez seja até inútil a essa altura dos acontecimentos.

Interessante que no mesmo dia em que o Paraná ainda implorava atenção, o jornal O Estado de São Paulo noticiava que "o Porto do Rio receberá investimentos de R$ 3 bilhões até 2016, tendo seu tamanho multiplicado em até quatro vezes. Do total de novos investimentos, os governos federal, estadual e municipal irão aportar R$ 1,27 bilhão. O restante virá da iniciativa privada".

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