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Olho vivo

Quem sobra? 1

O ex-presidente da Câmara Municipal vereador João Cláudio Derosso carregava sozinho até agora todo o peso das denúncias que pipocaram contra a sua heterodoxa gestão. Vê-se, agora, graças à série "Negócio Fechado" deste jornal e da RPC TV, que se cometia uma injustiça – não apenas ele, mas boa parte dos vereadores se aproveitava da farra. A tal ponto que até mesmo o novo líder do prefeito Luciano Ducci na Câmara, o vereador Roberto Hinça, foi destituído da função 25 dias depois de tê-la recebido. Contra o presidente atual, João do Suco, eleito para suceder Derosso, pesam também descobertas semelhantes.

Quem sobra? 2

Assim como Derosso foi abandonado pelo esquema político que o queria como vice de Ducci na chapa da reeleição, Hinça foi também arremetido ao limbo dos indesejáveis. Procura-se agora um novo líder, mas que apresente o requisito essencial de não estar envolvido em nenhuma daquelas operações de avanço ilegal ao erário para financiar jornais de bairro, programas de rádio etc. Pelas revelações que a cada dia emergem das investigações, estreita-se cada vez mais a possibilidade de sucesso.

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Então, é de se perguntar: se querem expulsar Derosso do partido; se já se fala em não lhe dar legenda para se candidatar à reeleição; se já ninguém do seu grupo político – aqueles que outrora o incensavam – não o quer por perto, sucederia o mesmo com todos os outros, cúmplices ou beneficiários do esquema? Taí um argumento que o próprio Derosso agora pode usar contra seus algozes, com a vantagem de que, na condição de arquivo vivo, sabe tudo de todos.

O melhor que o governador Beto Richa tem a fazer é retirar da Assembleia Legislativa a proposta de emenda constitucional (PEC) em que suprime a exigência de diploma universitário para ingresso na Polícia Militar – requisito aprovado na Legislatura passada, em 2010, por unanimidade dos deputados. Dois motivos aconselham o governador a tomar esta iniciativa.

O primeiro deles, de ordem meramente política mas não menos importante, é o de não constranger os deputados. Afinal, a maioria dos que lá estão hoje foi reeleita para a atual Legislatura, e portanto votou, em 2010, pela instituição da exigência. Aliás, até posou para fotos vestindo camisetas de apoio à reivindicação da Polícia Militar de olho nos votos que sua participação em favor do aprimoramento profissional da corporação lhes renderia.

Esses mesmos deputados fazem parte hoje da majoritária bancada de apoio a Beto Richa. Seu comportamento, capitaneado pela liderança do deputado Ademar Traiano – que representa os interesses do Palácio Iguaçu no Legislativo – tem sido de obediência cega às ordens emanadas de cima. Agora, com a proposição da PEC de Beto Richa, esses deputados esquecerão o passado recente e votarão contra a decisão que eles mesmos apoiaram e, festivamente, em véspera de eleição, aprovaram em 2010? A menos que o governador queira pregar-lhes na testa o carimbo da incoerência.

O outro motivo para que Beto Richa mande recolher rapidamente a PEC funda-se nas declarações desastradas que deu logo após o primeiro protesto tornado público pela Amai, a associação que representa os milicianos. O presidente da entidade, coronel Elizeo Furquim, conforme registrou esta coluna na última quinta-feira, foi enfático: a proposta de Beto de eliminar a exigência de curso superior para ingresso na PM equivale a um "diploma do atraso" que o governo se confere.

O governador respondeu ao protesto no mesmo dia em entrevista à rádio CBN, justificando ser contra o diploma. Afirmou textualmente: "É uma questão de insubordinação: uma pessoa com curso superior muitas vezes não aceita cumprir ordens de um oficial, de um superior com patente maior." Traduzindo o que quis dizer Beto Richa: um soldado diplomado em Direito teria mais tendência a transgredir a disciplina militar. Logo, partindo de tal premissa, infere-se que, na visão do governador, é melhor ter soldados menos intruídos, pois estes seriam mais obedientes!

Não seria, então, o caso de eliminar a exigência de diploma também para os oficiais? Ou, no extremo, fechar as universidades e a Secretaria da Educação, já que são instituições formadoras de um povo questionador, inclinado a não concordar passivamente com seus governantes?

É claro que Beto Richa, bem formado Engenheiro Civil, não pensa assim. Em razão da herança de amor à democracia que recebeu, certamente sempre discordou (e discordará) da política de descaso que governos autoritários costumam dedicar à educação, da qual foi vítima o próprio Brasil.

Vai daí que talvez lhe reste, para manter a coerência, tomar a sábia atitude de retirar seu projeto de pauta. A menos que detenha ainda outros argumentos para convencer o povo das ruas de que é melhor ter uma polícia com baixa escolarização.

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