Pode haver mais aviões de carreira nos céus de uma licitação do que a vã filosofia pode imaginar. A concorrência, impugnada pelo Tribunal de Contas na quinta-feira passada, diz respeito à aquisição de 1.255 viaturas policiais a um custo estimado de R$ 136 milhões. A primeira irregularidade encontrada pelo TC para impedir que as propostas fossem abertas foi dada a conhecer no próprio ato de impugnação.
E é a seguinte: o governo pretendia comprar da indústria automobilística carros que já viessem equipados com sistemas de rádio-comunicação, rastreadores, tablets e outros apetrechos que não saem de fábrica de veículos. Isto é, as montadoras é que teriam de adquirir os equipamentos dos respectivos fornecedores e instalá-los como acessórios, sem precisar discriminar o valor básico da viatura e de cada um dos acessórios. O Tribunal condenou a falta de transparência: "nesta situação, a administração teria dificuldade de detectar eventual sobrepreço em algum desses elementos [acessórios]", escreveu o corregedor Nestor Baptista.
Mas há outras observações de fontes distintas que levam a outras estranhezas: os equipamentos especificados pelo edital levam os especialistas a inferir que a compra dos acessórios estaria direcionada para alguns fornecedores. No caso do rastreador, por exemplo, ele só poderia ser do modelo MXT-151, fabricado no Brasil pela empresa Maxtrack adotado pela polícia paulista e objeto de denúncias de mau funcionamento.
Há também problemas de preço notados por quem estudou o edital a fundo: no cômputo final, um tablet com tela de sete polegadas, por exemplo, que nas lojas mais careiras é encontrado por R$ 2 mil poderia entrar no "pacote" licitado custando até quatro vezes mais. Relação de preço com diferença tão grande atingiria também os rádio-comunicadores escolhidos, que podem ser encontrados no mercado a R$ 4 mil mas que, se a licitação fosse mantida nos moldes do edital, chegariam a custar até R$ 12 mil.
O Tribunal de Contas notou também outros agravantes: embora os equipamentos digitais exigidos pelo governo sejam de última geração, eles apresentariam um problema grave caso fossem instalados. Eles não "falam" com o sistema já em uso pelas polícias o que tornaria inúteis os investimentos que já foram feitos no estado a partir de 2006 na modernização das comunicações policiais.
São citados pelas fontes dois exemplos: em 2006, o Copom (da Polícia Militar) passou a contar com um sistema digital e desde então ficou à espera de que viaturas e outras dependências recebessem equipamento com sistema compatível. O edital, porém, estabelece aquisição diferente, o que significa tornar inútil a modernização já implementada há cinco anos. O mesmo ocorreria com o equipamento que está em uso pelo 13.º Batalhão da PM desde 2010.
O Tribunal de Contas quer que a secretaria estadual de Administração responsável pelos termos do edital se explique e justifique as opções que fez ou que reinicie do zero uma nova licitação. Até ontem à tarde o Tribunal não havia ainda registrado um protocolo correspondente às eventuais explicações, QSL?



