Já logo no início da sua gestão, em 2011, o governador Beto Richa atribuiu à Bíblia um ensinamento que diz seguir em sua vida pessoal e pública: pode-se perdoar o pecador, mas o pecado nunca. Nenhum exegeta encontrou algo parecido nas Escrituras, mas, como o governador acredita em tal conceito, torna-se outra vez apropriado um breve exercício de meditação sobre o que disse.
A oportunidade apareceu ontem quando, em entrevista à rádio CBN, Richa pediu perdão à Polícia Militar por ter afirmado, dias antes, ser contra a exigência de curso superior para ingresso na corporação porque, segundo ele, os detentores de diploma universitário costumam ser insubordinados e, por isso, ofereceriam resistência a obedecer ordens superiores. Logo, numa instituição que prima pela disciplina hierárquica, não seria conveniente recrutar soldados bacharéis.
O argumento do governador (que diz tê-lo ouvido de um oficial e o reproduziu sem pensar) foi apresentado como uma das justificativas para a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que encaminhou à Assembleia revogando a exigência criada por outra PEC, a de número 28, promulgada em 2010.
Seguindo a máxima de que o pecador arrependido deve ser perdoado, o pedido de desculpas foi caridosamente aceito pelos que, dentro da Polícia Militar, lutam pela exigência do curso superior. Entretanto, mantêm a outra parte do conceito defendido por Richa: o pecado não pode ser perdoado.
O pecado é manter em tramitação na Assembleia a PEC que atrasa a possibilidade de a Polícia Militar se aprimorar. Assim, o pedido de perdão não o absolve do pecado original, que, afinal, é o que está em questão.
Na contrita entrevista radiofônica, o governador reforçou outro argumento para manter sua decisão. Segundo ele, a exigência de curso superior impede que a Polícia Militar recrute soldados entre os jovens de 18 ou 19 anos que acabam de cumprir o serviço militar. Na sua opinião, além de oferecer oportunidade de emprego para estes jovens, a PM já receberia uma mão-de-obra treinada nos quartéis em que serviram.
O presidente da Amai, a associação que representa os milicianos, coronel Elizeo Furquim, contesta também este argumento: "Isto podia valer nos tempos da guerra do Paraguai, mas no século 21 a complexidade da vida social exige policiais que tenham aprendido muito mais do que dar tiro de canhão e marchar com passo certo".



