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Política à rolê

Que atire a primeira pedra o curitibano com menos de 35 anos (ou até um pouco mais) que nunca deu um rolezinho no shopping quando era adolescente. Quem estudou em escola pública ou particular próxima ao Centro e não saiu em grupo para uma praça de alimentação muito mais para socializar do que para comer. Não é um modismo de outro mundo – o que realmente mudou hoje é a capacidade de juntar gente pela internet.

Eis um exemplo concreto: quando o Shopping Estação (se não me engano, originalmente não havia o nome shopping) foi inaugurado, em 1997, havia cobrança de entrada. Pela localização, facilidade de acesso e ares de novidade todo jovem tinha que dar um jeito de ir. O resultado foi que o mo­delo de negócio inicial não deu certo: o pessoal pagava a entrada, ia lá para ver e ser visto, mas não comprava nada nas lojas.

Poucos lembram que o formato dos rolezinhos que se espalham pelo país neste começo de 2014 já foi visto em Curitiba em 2008. Na época, o recém­inaugurado Shopping Palladium, no Portão, também barrou jovens que se reuniam para desvendar o espaço. Fora do Centro, o Palladium era um mundo novo para o pessoal do Novo Mundo, Pinheirinho e Capão Raso.

Quase tudo já se falou nos últimos dias sobre o preconceito contra jovens da periferia, o direito de circular em um espaço que é privado e a necessidade de coibir furtos e vandalismo. Há argumentos plausíveis para todos os lados. A pergunta que fica é a seguinte: se o povo do rolezinho não vai aos shoppings para consumir (afinal, para isso existem esses lugares), não seria mais lógico juntar todo mundo em um espaço público?

Seja nos anos 1990, seja atualmente, havia e há a percepção de que o shopping é muitíssimo mais seguro do que qualquer praça ou parque. Adolescentes pobres também têm pai e mãe. E eles se sentem mais tranquilos de saber que seus filhos estão em um espaço vigiado.

Claro que há rolezinhos e rolezinhos. Aglomeração de gente é o ambiente mais perfeito para confusões. É assim em estádios de futebol, foi assim nas manifestações de junho de 2013.

Aliás, a interpretação de que os protestos têm conexão com os rolezinhos faz sentido. Nos dois casos, percebe-se uma necessidade de extravasar algo reprimido, seguida por uma sensação de descontrole causada pela ausência de líderes e de motivações objetivas. E se há uma coisa que aflige político é não ter a mínima ideia do que está acontecendo.

Por isso chegou a ser hilária a tentativa do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), de se reunir com as "lideranças" do rolezinho. O tema também foi até ao gabinete da presidente Dilma Rousseff. Prepare-se: daqui a pouco vai ter gente posando de interlocutor dos rolezeiros, alguém que responde às demandas das ruas, ou melhor, dos corredores de shoppings.

O que fica daqui para frente é a perspectiva de que uma nova febre social organizada pelo Facebook pode sair a qualquer momento. Ainda mais em ano de Copa e eleições. Só não vai ter rolezinho nos estádios do Mundial porque esses sim são espaços privados intransponíveis.

Se fosse para apostar, diria que o futuro é uma tentativa de mera marginalização de qualquer evento organizado pela internet. É mais fácil satanizar o que foge ao controle do que lidar com as incertezas do desconhecido.

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