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De uma prática absolutamente usual, confessa, aceita e disseminada ao ponto de servir de justificativa para se instituir o financiamento público de campanhas eleitorais, o uso do caixa 2 nas doações aos partidos políticos passou, nos últimos dias, a ser algo nunca visto, jamais cometido, rechaçado e, quando muito, adotado de forma muito restrita.

Todos os partidos e políticos até agora citados no âmbito da Operação Castelo de Areia, que investiga entre outros crimes repasses "não contabilizados" da construtora Camargo Correa, alegaram que as transações quando, e se, ocorreram, estavam dentro dos conformes da legislação.

Alguns já apresentaram comprovantes, outros juram que o farão em breve, manifestando a indignação dos justos. Como se o uso do caixa 2 fosse a exceção e não a regra. Um excelente serviço prestado pela Polícia Federal aos santos do pau oco que agitam seus recibos comprobratórios da face legal da relação de financiamento de partidos, certos de que da face ilegal a polícia não achará rastros. A expressão delubiana já diz, não são contabilizados, deles não há registro. Sem digital identificada ou confissão oficializada, vale o que pode ser escrito.

A PF alega ter baseado sua investigação na "suposição" de que os diálogos gravados entre funcionários da construtora e intermediários de partidos, faziam referências a doações ilegais, notadamente por causa das expressões "por dentro" e "por fora" registradas nas transcrições.

Se for só esse o tipo de indício, é lamentável, mas a PF politizou a operação. Saem cheios de razão aqueles que desde o início denunciaram o "viés" político, apontando como evidência a exclusão do PT da lista dos receptores de doações.

Diz a polícia que PT, PTB e PV ficaram de fora porque as conversas não revelaram sinais suficientes de que esses partidos poderiam ter recebido dinheiro "por fora". Pois bem, e os outros cujos nomes foram incluídos e divulgados e que comprovaram a legalidade das doações? As referências, ao que se conhece do inquérito, eram também inconsistentes.

Tanto eram que a defesa da Camargo Corrêa, o ex-ministro Márcio Thomaz Bastos à frente, será toda baseada na apresentação de comprovantes dos repasses cotejados com a transcrição dos telefonemas. A equipe de Thomaz Bastos está recolhendo os recibos, lendo o inquérito para tentar estabelecer a ligação entre as conversas e os documentos. "Vamos mostrar que as referências feitas nos telefonemas são todas relativas a atos perfeitamente legais", diz o advogado.

Se as coisas assim transcorrerem realmente, ficará o dito pelo não dito, os inocentes misturados aos culpados e a Polícia Federal, até prova em contrário, servindo como fiadora à candura contábil dos partidos.

Síndrome de diretoria

Aberto o nicho da proliferação de diretorias na administração pública, por ora já se descobriu que a criação de instâncias artificiais de comando para melhorar proventos e status de apaniguados é adotada no Senado, no Palácio do Planalto, na Assembleia Legislativa de São Paulo, na Câmara Municipal da cidade do Rio de Janeiro.

A adoção dessa modalidade de empreguismo é típica da noção de que dinheiro público não tem dono.

Na iniciativa privada alguém ocupa uma diretoria por promoção resultante do mérito profissional. Há critérios, pois são em menor número os funcionários que têm maiores responsabilidades e, por isso, ganham mais.

No setor público ocorre o oposto: primeiro criam-se as diretorias e depois se distribuem os cargos em função da necessidade, e não necessariamente da capacidade, de cada um dos favorecidos. O conceito de mérito é estilizado: a cada qual segundo suas melhores relações políticas, pessoais e, no limite, comerciais.

Melhor parte

No anúncio do pacote de habitação Lula deixou a regra clara: "Não quero ninguém me cobrando prazo". Quer dizer, firmado o compromisso com o lançamento do projeto, carimbara a autoria e garantido o bônus político decorrente, tudo o mais que se refira à promessa de construção de 1 milhão de casas populares – vale dizer, execução e conclusão do projeto – está fora da alçada do presidente.

Se algum dia for concluído, terá sido obra de Lula. Se ficar aquém do prometido ou não passar da fase das boas intenções, a responsabilidade será do governante da vez. É mais ou menos a lógica aplicada à política econômica: enquanto o mundo cresceu e favoreceu o Brasil, a bonança interna era uma realização do homem que veio de baixo e fez o que "nunca antes neste país" havia sido feito.

Quando a canoa virou, inverteu-se a relação de causa e efeito e espetou-se a conta nas costas da "gente branca e olhos azuis".

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