Com a entrada, nos últimos anos, de milhões de novos brasileiros no mercado de consumo, as filas para compra e uso de serviços – que já eram muitas – se multiplicaram de forma exponencial. Mais gente comprando e usando serviços – mais filas. É justa a participação dos nossos patrícios nesse imenso mercado, o que não é justa é a nossa eterna falta de estrutura para usufuí-lo.

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O descaso, por parte dos governos, às necessidades básicas do povo faz nascerem filas para tu­­do: em hospitais, escolas, bancos, estradas, portos e, principalmente, nos serviços públicos. A contrapartida dos impostos pagos é sempre devedora.

Hoje temos fila até para entrar na fila. Vamos ao supermercado, tem a fila do pão, sai da fila do pão, tem a fila do caixa. Ah! a eterna fila do caixa! Quanto mais se atualizam os meios eletrônicos com cartões, chips e códigos de barra, mais elas teimam em crescer.

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Saímos das compras e vamos ao estacionamento – fila de novo. Galgamos à rua e entramos nas eternas filas de trânsito. Saudades do tempo em que pegávamos fila para comprar carros – hoje já não há mais filas para comprá-los, eles é que ficam enfileirados esperando por nós. Re­­sultado: os carros saem das filas das revendas e ficam estocados nas ruas. Isso mesmo, estocados e com a gente dentro.

Cinema nos fins de semana, não mesmo. Fila para escolher fil­­me, comprar ingressos e até pipocas. Na saída, entramos na fila para pagar o estacionamento. E se, depois da sessão, quiser comer uma pizza, entre na fila. Se você não quiser esperar e preferir solicitar a entrega em domicílio, entre na espera telefônica: "Um momentinho, por favor."

Em Curitiba, a mãe de todas as filas é justamente a do Dia das Mães para quem vai comemorar com a progenitora um almoço em Santa Felicidade. O enfileiramento começa nas imediações do Passeio Público e se estende até a porta dos restaurantes, onde entramos em outra fila – a de espera – só que com direito a batidinhas de maracujá. A fila começa a se formar lá pelas 10 horas nas imediações do Passeio Público e vai até a 17 h quando se emparelha no sentido contrário com a enorme fila da volta. Com novas famílias a engrossar as classes populares e a tomar gosto por homenagens gastronômicas, em breve a mãe-de-todas-as-filas começará em Piraquara, e aí teremos a oportunidade de comemorar dois Dias das Mães ao mesmo tempo. Isto é, dois anos seguidos dentro dos nossos carros, aguentando avós, mães e netos e sem chegar ao local do almoço. Haja paciência. É melhor ficar em casa e dar um "alô" para a mãe pelo skype – todas já têm o seu.

Percebe-se o lugar de origem dos enfileirados pelo comportamento. A fila dos cariocas é de­­sorganizada, barulhenta e brincalhona e ninguém reclama se um engraçadinho tenta furá-la fingindo um papo com o simpático casal que chegou antes. Já a fila dos baianos é ainda mais animada, todo mundo brinca, conversa e conta piada. Em algumas até rola uma percussãozinha. Tem a madrugadora fila mineira e a organizada e eficiente fila dos paulistas – já que foram eles que inventaram a senha. Mas, cuidado, em São Paulo, na hora do "vamos ver", ninguém respeita ninguém, todo mundo avança na frente. Já a fila dos curitibanos é fria, calculista e anda passo a passo. Nessa fila ninguém fala com ninguém, porque não foram apresentados e curitibano que é curitibano não fala com estranhos. Na fila curitibana, se al­­guém erguer um pouco a voz pa­­ra reclamar da demora ou do péssimo serviço, vai ser olhado meio de lado e todos os nativos pensarão baixinho, rosnando: "Quem esse cara pensa que é para falar alto assim na fila?"