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A crítica aberta à política econômica do governo feita pela nova direção do PT, no último sábado, quebrou os três anos de controle do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no partido. A mudança que o presidente do PT, Ricardo Berzoini, chamou de "deslocamento das forças internas", acendeu a luz vermelha para os dirigentes do partido mais ligados a Lula, que esperam uma nova crise, às vésperas da campanha pela reeleição. A expectativa deles é de que o presidente Lula ajude a promover uma rearrumação interna em uma reunião com a executiva nacional pré-agendada para o próximo dia 21.

- Ficou claro agora que Lula perdeu a hegemonia. Vai ter que ser feita uma negociação interna e um pacto com o presidente, de modo que possamos acertar o passo para a campanha - disse Francisco Campos, secretário-adjunto de Organização do PT.

O terceiro-vice do PT, Jilmar Tatto, avaliou que houve uma inflexão à esquerda dentro do PT, articulada de forma errônea pelo próprio presidente, Ricardo Berzoini, e com a complacência dos membros do governo que atuam no partido. Eles participaram da reunião do Diretório Nacional sem defender o governo Lula nem evitar a crítica à política de superávit primário elevado do ministro da Fazenda, Antonio Palocci.

- Foi um grande erro. No primeiro pito do Lula, eles terão que mudar de posição. Como é que pode integrante do governo votar contra o governo? Ou nós nos acertamos internamente, ou o Lula se afastará do partido - disse Tatto, da direita petista.

Grupo de Dirceu se cala

Durante a reunião de sábado, dirigentes próximos de Lula, como o assessor especial de assuntos internacionais do governo, Marco Aurélio Garcia, que também é o primeiro-vice-presidente do PT, o secretário-geral da Presidência da República, Luiz Dulci, o ex-ministro Humberto Costa e integrantes do grupo do ex-ministro José Dirceu ficaram em silêncio em vez de defender a política de Palocci, segundo dirigentes.

Marco Aurélio disse que não fez defesa do governo e votou na resolução final porque não achou a decisão do diretório crucial e chamou as críticas internas de "tempestade em copo d'água". Para ele, o que houve foi uma convergência interna e uma redução de antagonismos.

- O próprio presidente Lula queria uma posição mais firme do PT. Embora a gente esteja perto do Natal, o PT não pode se comportar como vaca de presépio - disse Marco Aurélio.

O ataque à polêmica emenda da resolução petista, que critica a economia e pede a queda do superávit primário, foi apoiado apenas pelo senador Aloizio Mercadante, que acabou derrotado por 35 votos contra 34. Mercadante avalia que a crítica não ajuda o governo em nada.

- Não vejo espaço para a redução da meta do superávit. Ele é indispensável, porque reduz o endividamento do estado, permite a queda sustentável dos juros e, no futuro, ajudará na redução da carga tributária para termos um crescimento sustentável. Além disso, o compromisso com a responsabilidade fiscal sempre foi cláusula pétrea no PT - reafirmou ele.

Para o senador, o compromisso do partido em apoiar o governo não está em discussão.

- O que há é uma divergência de um setor do partido com a política econômica - avaliou ele.

No entanto, o setor vencedor - no caso a esquerda, que foi ajudada por Berzoini - ganhou do centro e dos governistas um total de 60 votos na resolução final, dos 83 membros do diretório. Embora a emenda com a crítica à economia tenha recebido 35 votos favoráveis e 34 contra, o próprio Mercadante votou em apoio à resolução final, com a emenda sobre o superávit primário já incluída.

Berzoini avaliou que o PT não subiu o tom, mas apenas marcou sua independência do governo.

- O governo Lula é o nosso governo, mas não é apenas nosso. O governo tem suas próprias disputas. Por isto, não há contradição. O que houve foi um deslocamento de forças internas e eu só fui um porta-voz dessas mudanças - disse Berzoini logo após a reunião.

Alguns membros da direção do PT avaliam que no final, as críticas foram direcionadas apenas a Palocci, compondo uma estratégia para enfraquecê-lo no governo e servir de ferramenta para que Lula consiga mudar a política econômica no ano eleitoral. Com a mudança, o PT conseguiria se reaproximar de suas bases eleitorais, principalmente dentro do movimento social, com vistas às eleições de 2006.

- Não se trata de uma vitória da esquerda no PT e o governo terá a sensibilidade de entender isto. No documento, nós expressamos o nosso apoio ao governo. Na verdade, a crítica se trata de uma sensibilidade do PT diante de suas bases eleitorais. O que não dá mais é para fecharmos os olhos para o movimento social e para a própria militância - disse Raul Pont, secretário-geral do PT.

Para Pont, ficou estabelecida uma nova demarcação no partido. A expectativa da esquerda petista é de que o encontro nacional do PT, em abril, siga o mesmo caminho. Se isto acontecer, Lula terá que se candidatar fazendo mudanças na economia e propostas mais à esquerda para um segundo mandato.

Pont: PT não abandonou o governo

Sobre a perda da hegemonia de Lula no partido, Pont argumentou que antes havia tanta submissão ao governo que o próprio presidente cobrou mudanças em seu partido.

- Não estamos abandonando o governo. Só não vamos mais abrir mão da autonomia e da crítica. Agora, pode ser alcançado um equilíbrio, desde que o governo faça algumas mudanças - disse Pont.

O deslocamento de forças dentro do PT acontece em função da derrocada do Campo Majoritário, integrado por Lula e pelo próprio Berzoini. Como geriu o PT por 15 anos e foi responsabilizado pelo escândalo do caixa 2, perdeu poderes. Na última eleição, em setembro, a esquerda e o centro cresceram um pouco. Agora, a Unidade na Luta, corrente que criou o Campo Majoritário e ainda é integrada por Lula, quando se alia à direita do PT, reunida no PT de Massas e de Luta (PML), ficou com 50% no máximo do poder dentro do Diretório Nacional. O antigo aliado, Movimento PT, de centro, e outras correntes menores, estão mais unidos à esquerda, ajudados por Berzoini.

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