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Com trajetórias políticas na luta contra a ditadura militar, na fundação do PT e na ascensão do partido à Presidência, os dois Josés – Dirceu e Genoino – acabaram condenados na última semana pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por envolvimento no mensalão, esquema de corrupção que angariou apoio político para o governo petista no Congresso. Segundo especialistas, a condenação deles é um marco na história do país justamente por atingir dois personagens que, para a esquerda brasileira, foram heróis. Simbolicamente, significa que nem mesmo os vultos históricos estão acima das leis.

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Durante o julgamento de Dirceu e Genoino, a ministra Carmem Lucia, do STF, fez referência à história dos petistas antes de votar. "O juiz, infelizmente, não julga histórias, porque as histórias às vezes são feitas de desvios que seriam impensáveis de serem praticados em outra circunstância. Não estamos julgando a história de pessoas que, em diversas ocasiões, tiveram vidas retas", disse.

Análise

"O julgamento é um fato histórico em si, inédito no país", diz o cientista político Wilson Ferreira da Cunha, da PUCGO. "O que é importante é que eles foram declarados culpados perante toda a sociedade", diz Roberto Romano, professor de ética e filosofia política da Unicamp. "Para uma pessoa que tem um passado reto, esse é o pior julgamento, a pior pena que pode ocorrer. Além disso, a reprovação popular é um castigo violento", acrescenta Romano.

Para os especialistas, a condenação não representa necessariamente o esquecimento das lutas de Genoino e Dirceu pelo fim da ditadura. Mas marca um erro cometido pela fidelidade ao partido. "Eles fizeram da política uma religião – tanto que vão enfrentar a cadeia [se forem sentenciados à prisão] como se fosse mais um trabalho para o partido. Eles fazem tudo pelo partido, inclusive roubar os cofres públicos", afirma Cunha. "É preciso conhecer a lógica do militante, que é aquele que diz: 'Errado ou certo, é meu partido'. Quando existe uma ideo­logia de partido, ela relativiza todos os outros elementos que, para outros partidos e outras pessoas, são essenciais", complementa Romano.

Cunha ainda afirma que o mensalão é fruto uma desvirtuação da ideologia petista quando Lula chegou à Presidência, em 2003. "O partido se desvirtuou da sua ideia inicial e tornou-se pior que a oligarquia política brasileira. Eles profissionalizaram tanto a política que o discurso virou de obediência, não mais de diálogo, como era antigamente. O PT acabou inaugurando uma nova fase na corrupção brasileira."

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Fundador do PT defende história de Dirceu e Genoino

Companheiro de José Dirceu e José Genoino na luta contra a ditadura militar e na fundação do PT no Paraná, o advogado Vitorio Sorotiuk minimiza as consequências do julgamento do mensalão e defende a história política dos petistas. "O homem é um processo de acerto e erros", diz ele. "Não existe ninguém que não tenha errado na vida como, por exemplo, quando comete uma infração de trânsito. E isso não pode acabar com toda a história de vida do indivíduo."

Para o historiador Lafaiete Neves, que também participou ativamente dos movimentos de base esquerdista em Curitiba, é preciso fazer uma reflexão mais profunda sobre o julgamento do mensalão, que vai além do crime de corrupção.

"Isso não é particularidade do PT", diz Neves. "Entrar no processo eleitoral que nós temos significa enfrentar forçar econômicas muito poderosas. Para chegar ao poder, não basta só o idealismo, a garra e a boa vontade dos militantes. Tem de entrar nesse sistema de poder já organizado na Lei Eleitoral e acabar fazendo alianças que acabam desvirtuando os partidos políticos." Neves afirma que foi justamente essa "desvirtuação" ideológica do PT, já anterior ao mensalão, que o levou a se afastar do partido.

Raízes tucanas

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Neves e Sorotiuk lembram ainda que o mensalão teve suas raízes no PSDB, na campanha para a eleição do tucano Eduardo Azeredo para o governo de Minas Gerais, em 1998. Eles criticam a falta de exposição desse caso. "Isso [o julgamento do mensalão] é uma parte do seriado que pegou o PT, mas ainda existe a parte do PSDB que vai ser julgada", aponta Sorotiuk. "Eu acho uma falsidade o pessoal do PSDB e do DEM cobrar por um julgamento do PT, sendo que a prática deles é a mesma", complementa Neves.