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Dilma: mudança, mas nem tanto. | Roberto Stuckert Filho/
Dilma: mudança, mas nem tanto.| Foto: Roberto Stuckert Filho/

As pioneiras no Paraná

A Gazeta do Povo conversou com as três primeiras mulheres eleitas no Paraná para o Congresso Nacional sobre a questão da representatividade feminina na política. Confira o que elas pensam:

Gleisi Hoffmann (PT, foto)

Para a petista, primeira senadora eleita do estado, pelo que a mulher é na sociedade, a representatividade é mínima. "Tivemos um avanço considerável, pois há quase 80 anos nós não éramos consideradas capazes de discernir, e agora nós elegemos uma mulher presidente. Ainda estamos nos acostumando com a política." Para Gleisi, é preciso que muitas mulheres sejam eleitas para endossar as propostas delas. "Um mulher sozinha em um cargo público tem menos coragem de se colocar e ela, sozinha, não muda a face da política. As mulheres são capazes de fazer uma política menos bélica, menos agressiva, mais voltada à união e à solidariedade", afirma. Com relação ao mandato que vai assumir a partir de 2011, a senadora acredita que a força feminina estará mais evidente. "Acredito que a Dilma dará atenção especial à essas questões de gênero por ser mulher, mãe e avó", afirma.

Selma Schons (sem filiação partidária)

Eleita deputada federal pelo PT em 2002, Selma considera que a questão de preconceito com relação à mulher é muito velada. "Quando fui buscar a chave do meu gabinete, fui informada que o melhor era que o próprio deputado fosse fazer isso", conta, em tom de brincadeira. "Em algumas ocasiões percebi que não era reconhecida como parlamentar porque a quantidade de homens comparada com a de mulheres é impressionante. O Congresso Nacional ainda é uma Casa sem mulheres." Para ela, o olhar do homem, na política, está muito presente. "Sentia, às vezees, que para ser ouvida e reconhecida, era preciso fazer política da mesma forma que os homens", considera. Para ela, as mulheres observam a sociedade de uma forma diferente, mas os projetos nem sempre são tratados com a mesma importância. Selma aponta que o problema está na base. "As siglas não fecham o porcentual mínimo de 30% de candidaturas de mulheres e nada acontece, não há nenhum tipo de restrição. Os partidos têm de incentivar essa participação porque as mulheres vão no aniversário, no batizado, vão fazer filantropia, mas não vão em uma reunião política porque acreditam que não tem nada a ver com elas", reclama.

Clair da Flora Martins (PV)

Deputada federal por um mandato, Dra. Clair, como é mais conhecida, afirma que há preconceito contra mulheres na política, mas não coloca a questão de gênero como a principal dificuldade encontrada no Congresso. "Nosso maior problema era que os deputados e senadores eram subservientes ao Executivo", aponta. No entanto, ela lembra que, em toda a história do Legislativo, nunca nenhuma mulher ocupou um cargo na Mesa Executiva da Câmara de Deputados. "Isso é, explicitadamente, um preconceito. Há mulheres com o mesmo nível político e com o mesmo grau de inserção na sociedade que os homens", argumenta. Para ela, a representatividade de Marina Silva (PV) e de Dilma na corrida presidencial indica um avanço, mas não significa uma mudança de paradigma. "O número de mulheres eleitas não foi acentuado. Esse é um processo que deve ter modificações, mas para isso precisamos de uma reforma política", defende.

Por pelo menos quatro anos, a principal representatividade política do Brasil deve estar a cargo de uma mulher: Dilma Rousseff. É a primeira vez que isso acontece em 121 anos de República e em 80 anos desde que as mulheres passaram a poder votar e ser votadas. Embora uma mulher esteja ocupando o posto máximo do Execu­­­tivo brasileiro, no Congresso Na­­­cio­­nal e nos estados, a representatividade feminina não é tão expressiva, cenário que demonstra o caráter essencialmente masculino da política brasileira.

No pleito deste ano, o porcen­­tual de eleitas ficou estagnado em relação a 2006. Em outubro, duas mulheres foram escolhidas como governadoras de estado, uma a menos que na campanha anterior. As mulheres representavam 8% dos 513 ocupantes das cadeiras da Câmara dos Deputados, porcentual que não mudou nas últimas eleições. No Senado, o índice era de 13%, ou seja, oito mulheres. Nesta eleição, sete senadoras foram escolhidas.

Para Alberto Carlos Almeida, autor do livro A Cabeça do Eleitor, o fato de uma mulher ter obtido êxito na disputa presidencial não significa que o eleitorado tenha pesado o fato de Dilma Rousseff ser mulher na hora de votar. "O voto nela não significa o voto na mulher. Ela foi eleita porque estava na esteira de um governo bem avaliado. Então se fosse homem, negro ou homossexual, provavelmente o desempenho não seria muito diferente", aponta. No en­­­­tanto, Almeida considera que o desempenho da presidente vai determinar a ampliação da votação em mulheres nos próximos pleitos. "Ela é que vai dar o exemplo. Se a Presidência conseguir mudanças significativas, se o mandato for considerado bom, vai ser um pontapé inicial para avanços na representatividade feminina."

A cientista política e professora da Universidade Federal de São Carlos Maria do Socorro Braga compartilha da mesma opinião. De acordo com ela, a eleição de Dilma não se tratou de uma questão de gênero: "Eleger uma mulher não foi uma bandeira levantada pelos partidários", aponta. Porém, para a socióloga, parece ser o indicativo de uma mudança. "É uma sinalização. Elas estão ocupando vários cargos de chefia, em diversas áreas. Esse processo forte de modernização de comportamentos acontece não só no Brasil, mas em toda a América Latina."

A professora Maria do Socorro também afirma que a chegada de Dilma à Presidência pode instigar a participação de outras mulheres. "Quanto melhor for o desempenho delas, mais serão instigadas. A sociedade brasileira é tradicional, mas se a governança em si for positiva, todos vão olhar com outros olhos a situação e passar a entender que tanto um homem quanto uma mulher podem gerir ou governar o que é público", diz.

De acordo com estimativas da União Interparlamentar, organização que reúne representantes de parlamentos do mundo todo, o Brasil está em uma das últimas posições do ranking quando o as­­­sunto é equilíbrio na participação de homens e mulheres na política: o país ocupa a posição de número 106, na frente apenas da Colômbia e Honduras. "Somos a 8.ª economia do mundo, mas quan­­­­­­do se trata de igualdade e representação dos gêneros, nossa situação é vergonhosa", avalia a cientista política e consultora do Centro Femi­­nista de Estudos e Assessoria (CFEMEA) Fernanda Feitosa.

Para ela, há motivos bem deli­­­nea­­­dos que inibem essa participação: "O preconceito para com a condição feminina, as jornadas múltiplas como profissional e mãe, a falta de estrutura e incentivo por parte dos partidos políticos e a legislação eleitoral, que privilegia o voto personalista".

Ações positivas

A pretensão da presidente eleita Dilma Roussef (PT) de destinar um terço dos ministérios para mulheres tem o intuito de elevar e intensificar a participação feminina no governo. Hoje, três mulheres ocupam cargos de chefia das pastas. Se a indicação de Dilma for seguida à risca, 12 representantes serão do sexo feminino.

Mas, de acordo com especialistas, a indicação de mulheres não basta para que elas deixem de ser subrepresentadas na política. Para Fernanda Feitosa, é essencial que a iniciativa da participação feminina seja feita de dentro dos partidos. "As siglas têm de investir em cursos de formação política, colocando-as em cargos de chefia", comenta.

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