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O jurista curitibano René Ariel Dotti está participando de uma comissão especial, criada pelo ministro Carlos Velloso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), para rever e atualizar os crimes previstos pelo Código Eleitoral. A comissão, que vai se reunir pela segunda vez nesta semana, está elaborando um projeto de lei que será encaminhado ao Congresso Nacional e, além de tornar as penas mais rígidas, deve aperfeiçoar o sistema de prestação de contas.

Desde 1979, Dotti vem sendo convidado para ajudar na revisão de códigos. Participou da elaboração da Lei de Execução Penal, de 1984, da Reforma da parte Geral do Código Penal, de 1982, da Lei de Lavagem de Dinheiro, em 1996.

Há dez anos, quando Carlos Velloso presidiu o TSE pela primeira vez, fez parte de uma comissão para reforma da lei eleitoral, ao lado dos juristas Fábio Konder Comparato e Ives Gandra. A comissão apresentou um amplo projeto que foi engavetado no Senado.

Mesmo com a frustração de ver o trabalho da comissão deixado de lado, Dotti diz acreditar que essa nova comissão vai conseguir ver as propostas aprovadas. O momento, de acordo com o jurista, pede reforma eleitoral e política. Seria uma maneira do Congresso dar respostas à situação de falta de credibilidade.

Para René Dotti, há justificativa jurídica para um pedido de impeachment do presidente Lula, mas o Congresso não teria legitimidade para julgá-lo. Essa foi a resposta a uma consulta do senador Jorge Bornhausen (PFL) há duas semanas. Em outro momento, em 1992, Dotti deu um parecer, a pedido do deputado federal Hélio Bicudo (PT), sobre a possibilidade de Lula processar o então presidente da República Fernando Collor de Mello, que teria cometido injúria ao chamar Lula de "meliante". Apontou os elementos que tornavam possível o processo por injúria.

O jurista reconhecido não deixa de se engajar em causas políticas. Na entrada do escritório em Curitiba, exibe um documento, emoldurado, em que é nominado procurador da Ordem dos Advogados do Brasil para elaborar petição do impeachment de Collor. Pedido assinado pela OAB e Associação Brasileira de Imprensa que resultou na renúncia do presidente, em dezembro de 1992.

Há dez anos, o sr. participou de uma comissão para mudar a legislação eleitoral, e as propostas acabaram não sendo votadas no Congresso. O que aconteceu?Na época os objetivos eram mais amplos. Agora estão mais delimitados. Estamos estudando crimes eleitorais e financiamento de campanhas. Na época, em 1995, comissão da qual participaram Fábio Konder Comparato, Ives Gandra, ministro Marco Aurélio, era revisão dos crimes do Código Eleitoral mas também reforma eleitoral e política. Foi um trabalho longo, feito por meses, encaminhado ao Congresso Nacional e não teve seqüência. Quando o presidente do TSE levou ao presidente do Senado, José Sarney, ele teria dito a assessores que esse assunto de reforma somos ‘nós’ que entendemos. O que firmou em mim a convicção que, lamentavelmente, as leis que modificam o código eleitoral, que precisam ser votadas um ano antes do pleito, são de ocasião porque não são debatidas de forma ampla.

O sr. considera a proposta que tramita no Congresso, de autoria do Senador Jorge Bornhausen, modificando a lei eleitoral, também de ocasião?Sim. Ela pode resumir tendências legislativas, mas não foi levada a um debate maior.

Mas no geral, pode trazer avanço?Há partes importantes. A mais polêmica é a parte de publicação de pesquisa. Na Justiça Eleitoral existe uma proibição de campanha e de consumo de bebida alcoólica na véspera das eleições. O mesmo critério pode ser utilizado, mas com um prazo maior. Não 15 dias antes, talvez cinco dias.Se a pesquisa for publicada com informações inverídicas, não há tempo de denunciar como uma fraude. As externas não deve ser proibida totalmente, mas que não fosse superior a 30% do tempo do programa eleitoral porque coloca no cenário a presença da população.

Tanto no período em que o sr. foi juiz do TRE quanto na época em que foi convocado pela primeira vez para participar de uma proposta de reforma eleitoral, já se ouvia falar de caixa paralelo de campanha?Na época, havia caixa 2 mas nunca na proporção e com defesa pública cínica como temos visto. Tratei desse assunto na reforma de 1995. A sonegação de tributo ganhou uma lei específica em 1990, com o chamado crime de sonegação fiscal, punido de dois a cinco anos. A minha proposta era que quando o crime fosse previsto no Código Penal também seria punido pelo código eleitoral. Se o motivo fosse eleitoral, deveria ter pena aumentada.

O próprio presidente da República disse que caixa 2 é prática comum. Como sr. vê esse episódio?Com essa declaração, o presidente da República violou o decoro do cargo. Esse é um dos motivos do impeachment. Ele não é sociólogo criminalista para comentar. Ele é presidente da República.

Então o presidente poderia sofrer impeachment?Essa falta de decoro justificaria impeachment. Mas não acho adequado, embora seja possível juridicamente. Primeiro porque não se confunde do processo Collor. O Collor tinha um mito de Caçador de Marajás, mas não tinha tradição de luta social que tem a história de luta do presidente Lula. E a reação popular era contra a figura do Collor e não contra o governo em geral. A pedido do senador Bornhausen, escrevi uma carta respondendo a uma consulta dizendo que não tem nenhuma conveniência agora o Congresso se envolver porque está comprometido. O fundamental agora é que o país apure os fatos.

O trabalho da comissão formada pelo TSE deve ter efeito, ou acabará como em 1995, engavetado?Dessa vez terá efeito em função da crise do poder legislativo quanto a sua representatividade e denúncias de corrupção. Em 1995 não havia clima de gravidade como agora. No momento temos fatos. A CPI no Congresso não está sendo "chapa branca" como se dizia. O trabalho está tendo efeito, o que nos leva a acreditar que o Congresso Nacional vai se sensibilizar para a realização de uma reforma eleitoral que possa corresponder às expectativas.

A sua parte na comissão da reforma cuida de crimes eleitorais. Quais são os pontos mais importantes?Diferente das leis que definem normas, as mudanças em crimes eleitorais podem ser votadas depois de 30 de setembro. Não precisam ser aprovadas um ano antes porque não alteram o processo eleitoral. Em face da urgência do nosso trabalho, alguns pontos devem ser enviados rapidamente ao Congresso, como aqueles que podem inibir caixa 2. Por ser um crime grave, não pode ser tratado com a mesma pena com crime de sonegação fiscal, que ofende o interesse do Estado. O crime eleitoral ofende interesse da nação. Os pontos mais urgentes são os que têm relação à campanha. Seriam punições em relação à propaganda e campanha eleitoral.

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