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Motoristas

Boa educação e gentileza não resistem ao caos no trânsito

Qualidades que o curitibano identifica em si – gentileza, boa educação e simpatia – parecem desaparecer quando o habitante da cidade segura o volante. "O brasileiro, e o curitibano em particular, age no trânsito de uma forma individualista e olha o outro como o inimigo que está atrapalhando o caminho", observa a coordenadora do Núcleo de Psicologia do Trânsito da UFPR, Iara Thielen.

Ela ressalta que, apesar de o comportamento individual ser o grande responsável pelos acidentes, a questão envolve políticas do poder público. "Há formas de orientar as pessoas a terem um comportamento mais solidário", afirma ela.

Para Iara, qualquer melhoria na condição geral do trânsito em Curitiba passa por fiscalização rigorosa e educação. "É necessário unir uma campanha educativ com medidas políticas efetivas: faixas de pedestres, travessias elevadas, semáforos inteligentes e uma fiscalização ao mesmo tempo rígida e educativa."

A psicóloga acredita que o novo prefeito precisa deixar claro a importância que a cidade dá para o trânsito. Iara sugere que o poder público faça um estudo amplo para indicar o custo social e real dos acidentes para a cidade. "É preciso ver os reflexos de um trânsito violento, que é responsável por mortes e mutilações. Isso imporia uma nova forma de tratar o trânsito na cidade."

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Ideias para uma Curitiba melhor

Confira algumas sugestões para que o poder público aproveite as características dos curitibanos:

Educação

• Aproveitar o período da Copa do Mundo, em que a cidade irá receber turistas estrangeiros, para promover campanhas educativas. O sentimento de orgulho do curitibano pela cidade será maior nesse período e, consequentemente, ficará mais fácil para o poder público obter engajamento da população.

• Capacitar agentes de turismo e os cidadãos curitibanos para receberem com hospitalidade os turistas – em especial os que visitarem a cidade durante a Copa do Mundo de 2014.

• Promover rotineiramente amplas campanhas educativas nas mais variadas áreas: promoção da gentileza e cumprimento das leis no trânsito; respeito às vagas de idosos e deficientes em espaços públicos; separação do lixo reciclável; conservação da limpeza pública; respeito à lei do silêncio; educação para que jovens não depredem e pichem o patrimônio público e particular.

• Estimular o uso do transporte coletivo, com respeito a idosos, gestantes e pessoas com deficiência.

• Estimular os moradores a promoveram a ligação do esgoto doméstico na rede de coleta, impedindo assim a poluição dos rios urbanos de Curitiba.

• Promover o uso consciente da água, para evitar o desperdício.

• Incentivar os festivais culturais que promovem o convívio de diferentes segmentos da sociedade.

Solidariedade e altruísmo

• Estimular o voluntariado e a participação social do curitibano. Ampliar a rede de voluntários.

• Estimular práticas como a carona solidária.

Discrição

• Aproveitar o caráter reservado e discreto do curitibano para mostrar que, se ele gosta que seu espaço e privacidade sejam respeitados pelos vizinhos, ele deve fazer o mesmo com os demais cidadãos de Curitiba.

Recordar é viver

Nas últimas décadas, uma série de campanhas educativas da prefeitura tiveram grande repercussão em Curitiba. Confira algumas delas:

Lixo Que Não É Lixo

A campanha começou há mais de 20 anos. Inicialmente, com a Família Folhas, que ensinou o curitibano a "se-pa-rar o lixo que não é lixo". Na última década, uma outra campanha ensinava os cidadãos a separar os resíduos por tipo de materiais. Quem ensinou onde depositar o lixo foram os personagens Papelucho, Vidrovaldo, Ed Metal e Plastilde.

Limpeza urbana

Uma bem-humorada campanha televisiva com o jogador de basquete Oscar Schimidt convidava os curitibanos a "jogar o lixo no lixo". Na peça publicitária, moradores da cidade acertavam a cesta de lixo sempre que arremessavam algo. Mas Oscar errou, e acabou sendo reprimido por um velhinho: "O senhor não é daqui?"

Bichos no trânsito

Um rato, uma perua e uma anta personificavam os maus motoristas da cidade de forma engraçada.

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Que tipo de comportamento o curitibano deveria mudar? E o que a prefeitura pode fazer para que isso ocorra?

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Ela é curitibana da "gema". Ele, de "criação". A can­­tora e compositora Iria Braga nasceu e cresceu em Santa Felicidade. O professor de Português e escritor Wellinton Wella é paulistano, mas há 18 anos trouxe os livros e a vida para Curitiba. A despeito das origens diferentes, ambos concordam: o morador da capital paranaense ainda é fechado, mas está mudando.

VÍDEO: Assista propagandas educativas da prefeitura de Curitiba que marcaram as últimas décadas

No bairro da infância, Iria conheceu de perto aquele curitibano desconfiado e taciturno. "Em Curitiba, você sempre tem de provar alguma coisa e com critérios fortes", diz Iria. Para Wella, os primeiros dois anos na capital paranaense confirmaram a fama do habitante da capital. "Não fizemos [eu e minha mulher] nenhum amigo. Para o meu casamento foi ótimo; ficávamos juntos o tempo inteiro", brinca o professor, que é casado com uma paulista como ele. "Mas depois nós conhecemos as pessoas certas e descobrimos a cidade", diz ele. Ainda assim, Wella constata: "Curitiba e os curitibanos não são tão fáceis". Três filhos e milhares de aulas de Português em Curitiba depois, a sensação é de pertencimento à cidade. "Hoje eu sou curitibano."

Para Iria, a ambientação de forasteiros como Wella tem sido boa para a "saúde cultural" da cidade. Mas ela ainda sente falta de que as pessoas de "tribos" e estratos sociais diferentes escapem de seus circuitos cotidianos e se misturem mais. Ainda assim, há luz no fim do céu nublado da cidade, diz ela. "Há um pouco mais de sol e menos sofrimento na vida das pessoas."

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Terceiro ciclo

Para o jornalista e historiador social Ulisses Iaro­­chinski, o traço cultural do curitibano tradicional – sisudo, obediente e desconfiado – fatalmente vai ficar para a história. Para ele, a cidade se transforma e, com ela, mudam seus moradores.

Segundo ele, historicamente houve três grandes ciclos migratórios para Curitiba, separados entre si por duas décadas, que modificaram a cidade. "Em 1975, a geada negra dizimou os cafezais. E os trabalhadores rurais do Norte do Paraná vieram fazer as favelas na periferia de Curitiba. Em 1995, a chegada das montadoras trouxe um contingente grande de trabalhadores, a maioria de São Paulo, que mudaram a cara da cidade, por exemplo, com a abertura de muitos bares e restaurantes." Iarochinski prevê que estamos no fim de um novo ciclo: "Após Copa do Mundo, o terceiro ciclo se fechará e a cidade vai se transformar em outra".

Compreensão

Essa cidade em transformação aparece nos resultados de enquete feita pelo Instituto Paraná Pesquisas com 410 moradores da cidade. O levantamento, encomendado pela Gazeta do Povo, mostra que o curitibano já começa a ver a si próprio e a seu vizinho não somente como "frio e fechado". Se forem utilizadas e compreendidas adequadamente, essas novas características do morador, somadas às antigas, podem ajudar o futuro prefeito a promover o bem-estar dos cidadãos.

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Na enquete, por exemplo, os moradores foram convidados a citar espontaneamente qual é a melhor qualidade do curitibano. "Educação e gentileza" foi a resposta a mais citada – educação, no caso, com o sentido de polidez. Em segundo lugar, aparece a tradicional sisudez e discrição. Mas a reserva que beira a hostilidade para principiantes, fama pela qual o curitibano é conhecido país afora, vem perdendo espaço. Já está empatada com a solidariedade e prestatividade como traços definidores do caráter local, no imaginário da cidade.

O "curitibano solidário" se revela de forma mais incisiva, porém indireta, nas respostas de outra questão da enquete: qual é o seu maior sonho? Quase um terço dos entrevistados (31,1%) citou desejos voltados ao bem-estar familiar e da coletividade – ou seja, ele pensa antes na satisfação dos outros do que em si mesmo.

O altruísmo, a solidariedade e a educação tornam o curitibano um cidadão com capacidade de se engajar em campanhas por boas práticas de cidadania e para promover a urbanidade, as pequenas gentilezas cotidianas. Isso, é lógico, se o motivo for nobre e a campanha educativa, bem feita. Até mesmo a discrição e frieza curitibanas, nesse sentido, podem ser benéficas: significam que os moradores gostam de preservar o seu espaço – ponto de partida para reconhecer o direito do vizinho de também ser respeitado.

Mas essas formas de o morador se enxergar têm outra implicação. Fica subentendido que o curitibano exige uma contrapartida do poder público: que seus representantes tenham um comportamento ético parecido.

Adesão a campanhas educativas é alta

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O curitibano gosta de aderir a campanhas educativas. Desde que sejam bem apresentadas e tenham uma causa justa, as mobilizações coletivas costumam dar resultado em Curitiba. Alguns traços da personalidade do morador da cidade e o gosto pela ordem, quando aliados ao sentimento de que o curitibano se preocupa com o bem-estar coletivo, podem explicar por que na cidade as campanhas estimulando boas práticas sociais conquistam grande adesão da população.

"Uma campanha educativa bem feita é um forte instrumento de transformação social em Curitiba; os curitibanos gostam de fazer parte [das campanhas]", observa a professora de Psicologia do Trânsito Iara Thielen, da UFPR.

Para o escritor Cristovão Tezza, há também um componente histórico na formação do curitibano. Em uma crônica publicada na Gazeta do Povo, ele afirmou que "orientações oficiais" encontram uma população pronta a não criar caso e a obedecer à regulamentação que lhe "vai delineando os passos".

Como exemplo, Tezza lembra que, quando a utilização do cinto de segurança ainda não era obrigatória no país, a prefeitura de Curitiba baixou uma lei pioneira obrigando seu uso na cidade. "No dia seguinte, metade dos motoristas curitibanos, em geral selvagens no trato do pedestre, portavam orgulhosamente o cinto", escreveu Tezza.

O certo é que quem viveu um Curitiba nas últimas décadas viu e, provavelmente tomou parte, de uma série de campanhas públicas cujo sucesso formatou o caráter do curitibano. O caso mais notório é o do Lixo Que Não é Lixo, campanha de reciclagem lançada no fim dos anos 80 e início da década de 90. Ainda hoje os curitibanos separam os materiais recicláveis.

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O publicitário Paulo Vítola explica que a boa campanha educativa tem tês elementos: publicidade criativa, ações efetivas do poder público para enfrentar o problema e fiscalização.

Atual diretor da televisão pública E-Paraná, Vítola esteve à frente de uma das campanhas mais bem-sucedidas no que diz respeito à mudança de comportamento dos motoristas: a "Cidadão em Trânsito", criada pela agência OpusMúltipla para a prefeitura de Curitiba. Na época, Vítola era diretor de criação da agência.

O "rato", a "anta" e a "perua", que personificavam os maus motoristas, ficaram famosos não só na cidade, mas em todo o país. "A população realmente comprou a ideia. Principalmente as crianças se identificaram com a brincadeira, que tinha um objetivo muito sério", afirma Vítola.

O resultado se refletiu em números. Segundo dados da BPTran, entre 1997 e 1998, quando a campanha foi veiculada, houve uma queda de 60% nas infrações de trânsito ligadas à campanha (bloqueio de cruzamentos, ultrapassagem em sinal vermelho e estacionamento em fila dupla).

Para a professora Iara Thielen, o novo prefeito de Curitiba não pode deixar de usar o portencial de engajamento dos cidadãos em campanhas para novas investidas em temas como civilidade no trânsito. "A questão do lixo envolvia um comportamento individual que foi repetido pela maior parte das pessoas. Isso pode ser reproduzido em outras frentes", sugere Iara.

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Propagandas educativas da prefeitura de Curitiba que marcaram as últimas décadas