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O "Jornal da Globo" teve acesso a trechos inéditos da famosa gravação, que em fevereiro do ano passado, derrubou Waldomiro Diniz, então assessor do ministro chefe da Casa Civil José Dirceu.

A fita, gravada pelo empresário do jogo Carlinhos Cachoeira, deu início à primeira crise do governo Lula. Trechos até então inéditos mostram a parte da conversa que Cachoeira não quis revelar, em que ele trata de negócios suspeitos com a seguradora Interbrazil.

Logo no começo da gravação, se vê Carlinhos Cachoeira dizendo ao telefone que "o Waldomiro é malandro. A primeira coisa que ele faz é levantar e vir aqui". Logo depois ele prepara uma armadilha, uma câmera escondida. Ouve-se ele dizer para "deixar só o biquinho mesmo da (câmera). Você não tem um esparadrapo, um trem aí? Você entendeu o que eu estou falando pra você? Põe em volta, como se fosse uma caixinha".

Na época, o trecho da fita que foi divulgado era o que interessava a Cachoeira. Waldomiro, então presidente da Loterj, a loteria do Rio, pedia contribuições para campanhas políticas e uma parte para ele. A frase que ficou famosa era: "eu quero 1% para mim".

Esta gravação deu início ao primeiro escândalo do governo Lula. Revelada pela revista Época, em fevereiro de 2004, levou ao afastamento do governo de Waldomiro Diniz, um ex-assessor de José Dirceu.

O "Jornal da Globo" conseguiu uma cópia completa da gravação e documentos inéditos. Juntos, revelam como agia o grupo. O esquema funcionava assim: uma empresa de construção e limpeza, sem expressão nacional, com sede em Anápolis, Goiás, era controlada por Carlinhos Cachoeira. Formava consórcios com grupos estrangeiros que queriam explorar o jogo no Brasil. As concorrências para explorar as loterias do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro foram vencidas durante governos do PT. Como fiadora dos negócios, a seguradora Interbrazil.

A seguradora prometia indenizar o estado. Diz o documento que o seguro foi pago de uma vez, no dia 8 de fevereiro de 2002: pouco mais de R$ 396 mil.

Mas Waldomiro está preocupado. Descobriu que o documento não está quitado. E cobra providências de Cachoeira: "só uma coisa, Carlos, porque, um documento, um documento dizendo o seguinte, está quitado". E Cachoeira pede um tempo: "é hoje, é hoje, eles ficaram de entregar hoje ou amanhã". O documento de quitação apareceu: teriam sido dez depósitos em três datas diferentes. O último deles: R$ 46.

"Eu suspeito que a Interbrazil funcionasse como um braço financeiro das atividades de Carlinhos Cachoeira", diz José Vicente Brizola, ex-presidente da Loteria do Rio Grande do Sul.

Quem assina o comprovante de quitação da apólice é André Marques da Silva, então diretor financeiro da Interbrazil.

Num outro trecho da gravação, é possível descobrir a data em que foi feita. Cachoeira diz ao telefone: "Ô prefeito. Você esquece de mim, rapaz? Ah, o presidente estava aí hoje, né?". Foi dia 24 de julho de 2002. Data em que o então presidente Fernando Henrique visitou a base aérea de Anápolis. No palanque, cumprimentou o prefeito Ernani de Paula. A campanha eleitoral de 2002 estava apenas começando. No telefonema, Cachoeira promete ajudar candidatos ligados ao prefeito. "Sem problema. Vamos ajeitar esses candidato aí. Nós vamos agilizar essa verba aí". Mas faz uma advertência: "Ernani, Ernani, pára de falar que você está apoiando o Serra aí. O Serra não vai ganhar não".

Cachoeira fazia o seu jogo. Num ambiente em que não dá pra confiar em ninguém. Ao fim do telefonema, ele se despede, e depois fala para alguém que estava na sala: "que prefeito malandro. Pior que o Waldomiro. Vagabundo".

O ex-prefeito de Anápolis Ernani de Paula confirmou o diálogo com Carlinhos Cachoeira mas disse que o apoio prometido não se concretizou. Cachoeira disse não se lembrar da íntegra da gravação. Que não vê problemas em quitar uma apólice parceladamente. E negou que existisse alguma ligação entre ele a Interbrazil e entre a seguradora e Waldomiro Diniz. André Marques, da seguradora Interbrazil, não foi localizado.

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