
A população foi a maior prejudicada pela decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), na última quinta-feira, de manter a proibição ao jornal O Estado de S. Paulo de publicar reportagens sobre as investigações da Polícia Federal envolvendo o empresário Fernando Sarney, filho do senador José Sarney (PMDB-AP). Essa é a opinião de especialistas que se manifestaram sobre a decisão.
O jornal está há 134 dias proibido de divulgar o teor das gravações telefônicas da investigação sobre supostas irregularidades nas empresas da família Sarney e de tráfico de influência de Fernando, que teria tentado negociar a nomeação de parentes e aliados em órgãos e empresas públicos.
Na quinta-feira, o STF, em vez de analisar o mérito da liminar do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) que censurou o Estadão, ativeram-se a uma questão processual para manter a proibição. Os ministros, por seis votos a três, não aceitaram o argumento de defesa do jornal, que pediu o fim da censura com base na derrubada pelo próprio STF da Lei de Imprensa julgamento realizado neste ano no qual ficou consagrado o amplo direito constitucional à liberdade de imprensa. Para o STF, os dois julgamentos não tinham conexão e o recurso do Estadão deveria ser extinto.
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Britto, disse que o Supremo perdeu uma boa oportunidade de extirpar a censura prévia no país. "O STF deixou em aberto a possibilidade de magistrados imporem a censura prévia no Brasil, o que, de fato, vem ocorrendo em várias instâncias do Judiciário", disse ele.
Para Maurício Azêdo, presidente da Associação Brasileira de Imprensa, o Supremo demonstrou inadequado entendimento sobre a Constituição, que não admite restrições à liberdade de imprensa. Em nota, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo e o Instituto dos Advogados Brasileiros também criticaram o STF.
O advogado Rodrigo Xavier Leonardo, professor de Direito da UFPR, criticou a postura do STF e disse que é mais um sinal de que a decretação de inconstitucionalidade da Lei de Imprensa foi um equívoco. "Ocorre que o STF, como a última instância a se recorrer no Brasil, só é alcançado mediante o último dos recursos. E esse tempo para se alcançar o STF é extremamente prejudicial para a imprensa." O presidente do Sindicato dos Jornalistas do Paraná, Márcio Rodrigues, também criticou a extinição da Lei de Imprensa, que deixou o trabalho da imprensa sem regulamentação.
Em nota, a Associação Brasileira de Imprensa teceu duras críticas ao STF e disse que a decisão prolonga a censura prévia.
O Estadão informou que vai recorrer da decisão ao próprio STF após a publicação do acórdão. Paralelamente, o jornal aguarda também o julgamento do caso no Superior Tribunal de Justiça. As entidades de representação da imprensa acreditam na possibilidade de a censura ser derrubada assim que o mérito da discussão seja analisado por um tribunal superior. "Foi uma decisão de caráter técnico-processual, não tratou do mérito. Pela defesa que muitos ministros fizeram da liberdade de expressão, estamos confiantes nas próximas decisões", disse o diretor da Associação Nacional dos Jornais, Ricardo Pedreira.
O presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB-PR, Zulmar Fachin, acredita que em breve o STF terá de se manifestar novamente sobre o caso, principalmente sobre o mérito. "Na prática, este caso voltará ao STF porque existe um conflito constitucional entre o direito à informação e o direito à privacidade." A defesa de Fernando Sarney alega que o teor da investigação não pode ser divulgado porque haveria, em grampos telefônicos, conversas íntimas dos investigados.



