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As declarações do deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) durante seu voto pelo impeachment geraram indignação em grande parte da sociedade brasileira e levam a questionamentos sobre a possível responsabilização do parlamentar pelo que falou em plenário. A bancada do PSol na Câmara fará uma denúncia ao Ministério Público contra ele por apologia ao crime. Bolsonaro citou o golpe de 1964 como se fosse uma vitória e dedicou seu voto ao coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, ex-chefe do DOI-Codi de São Paulo, reconhecido centro de tortura do regime militar – e“o pavor de Dilma Rousseff”, nas palavras do parlamentar. A possibilidade de Bolsonaro ser responsabilizado divide opiniões. Se por um lado ele tem a imunidade parlamentar como garantia à liberdade expressão, por outro, há o decoro como limite.

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Precedentes do STF

“As afirmações tidas como ofensivas pelo Querelante não foram feitas em razão do exercício do mandato parlamentar: hipótese em que o Querelado não está imune à persecução penal (imunidade material do art. 53 da Constituição da República).”

Ministra Cármen Lúcia - 15/10/2007

“A prerrogativa indisponível da imunidade material - que constitui garantia inerente ao desempenho da função parlamentar (não traduzindo, por isso mesmo, qualquer privilégio de ordem pessoal) - não se estende a palavras, nem a manifestações do congressista, que se revelem estranhas ao exercício, por ele, do mandato legislativo. ”

Ministro Celso de Mello - 21/11/2002

Colaboração: Melina Fachin

A Constituição Federal define, no artigo 53, que “Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”. Mas tanto o regimento interno da Câmara dos Deputados, quanto a Constituição, no artigo 55, apontam que é incompatível com o decoro parlamentar o abuso das prerrogativas constitucionais.

O caminho mais objetivo para se questionar o comportamento do deputado está na própria Câmara dos Deputados, no âmbito do Conselho de Ética, que poderia avaliar se houve ou não quebra de decoro. Os parlamentares que vão apresentar a denúncia ao Ministério Público também estudam adotar essa medida. Mas a condução de um processo no Conselho de Ética depende de vontade de política – o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, por exemplo, conseguiu diversas vezes adiar o prosseguimento de seu processo disciplinar. Apesar de não ter o poder de presidente da casa, Bolsonaro tem amplo respaldo entre a bancada evangélica.

Para o jurista René Ariel Dotti, devido à imunidade parlamentar, “o problema deve ser resolvido no âmbito do parlamento”. O advogado explica que, no Conselho de Ética, Bolsonaro deveria ter a oportunidade de justificar o porquê de sua referência ao torturador. “Embora não seja justificável”, afirma Dotti.

O professor de direitos humanos do Unicuritiba, Thiago Assunção, também considera que a via mais provável para que Bolsonaro seja responsabilizado é o Conselho de Ética, que poderia até mesmo decidir pela perda do mandato. Mas ele não descarta a possibilidade de que interessados no assunto façam queixa-crime ao STF.

Assunção também aponta que até mesmo a presidente da República, Dilma Rousseff, poderia pedir indenização por ofensa à honra, já que foi citada diretamente na declaração de Bolsonaro.

“O Deputado Jair Bolsonaro, mas não apenas ele, teceu considerações absolutamente condenáveis durante a sessão de votação”, diz o constitucionalista Clèmerson Clève.

“Alguns entenderão que afirmações com tal conteúdo, em função de sua especial gravidade, não estão protegidas pela imunidade material. Outros pensarão que, por vezes, tolerar a estupidez é essencial para o robustecimento da democracia”, analisa Clève. “O que está fora de dúvida, porém, é que o limite da imunidade material (inviolabilidade) é o decoro”, explica o professor de direito constitucional.

Imunidade não é absoluta

“Imunidade parlamentar não é e não pode ser absoluta”, diz Melina Fachin, professora de direito constitucional e direitos humanos da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Ela explica que a liberdade de expressão jamais pode ser censurada previamente, mas que isso não significa que os parlamentares não possam ser responsabilizados por proferir ofensas e “práticas abjetas”. A professora diz também que a jurisprudência já aponta que a liberdade de expressão é estritamente necessária ao exercício do mandato (veja ao lado).

Jéssica Morris, diretora executiva da Conectas, organização de defesa dos direitos humanos argumenta: “O Código de Ética determina que deputado tem a obrigação de cumprir a lei. E o Código Penal determina que apologia ao crime e a criminoso também é crime”.

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No Código Penal, a pena para que fizer “apologia de fato criminoso ou de autor de crime” tem pena de três a seis meses, ou multa.

Direito internacional

No direito internacional, conforme explica Melina, há dois crimes que são considerados absolutamente vedados: a tortura e a escravidão. A proibição dessas práticas é semelhante às cláusulas pétreas na constituição brasileira.

A professora da UFPR explica que o Brasil ainda apresenta relatórios periódicos à Corte Internacional dos Direitos Humanos devido à condenação no Caso Araguaia. Na opinião dela, declarações como a de Bolsonaro podem ter péssima repercussão no contexto internacional. “O fato de ainda termos parlamentares que expressam em público expressões desse tipo mostra que ainda há um déficit democrático”.

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