• Carregando...
 | Bigstock/
| Foto: Bigstock/

Vivenciamos nos últimos anos sensível aumento no número de diagnósticos de doenças de difícil tratamento. Com isso, o Estado, que deveria garantir a saúde de todos, se mostra absolutamente incapaz de fazê-lo. Para não depender das longas filas do SUS, muitos brasileiros recorrem aos planos de saúde, e o pensamento por trás da contratação é bastante simples: “vou pagar, porque, quando eu precisar, o plano de saúde vai cobrir o meu tratamento”. Contudo essa expectativa muitas vezes pode acabar sendo frustrada.

No Brasil, os planos de saúde são fiscalizados e regulados pela Agência Nacional de Saúde (ANS), portanto todos os contratos devem respeitar regras claras de coberturas mínimas de tratamento.

No modelo seguido em nosso país, o beneficiário do plano é tratado como consumidor, que paga um preço fixo mensal ou variável (quando se trata de planos co-participativos) por uma expectativa da prestação dos serviços de cobertura assistencial, em patamares previamente estipulados pelo fornecedor (segundo critérios mínimos, segundo segmentação, regulados pela Agência Nacional de Saúde).

Ocorre que o contrato precisa existir justamente para dar segurança ao consumidor de que, caso ocorra o evento futuro e incerto (já que ninguém contrata plano de saúde pensando em ficar doente), terá assegurado a cobertura nos padrões e termos contratados para as doenças elencadas no rol de cobertura.

Esse é o problema.

Quando firmamos esses contratos, por não termos conhecimento técnico suficiente, jamais discutiremos cláusulas contratuais. E, mesmo que tivéssemos, não se tem conhecimento de negociação de cláusulas contratuais, já que os contratos são padrões ou, tecnicamente chamados de adesão, não permitindo discussão dos seus termos.

Então, acaba sendo impossível dizer qual é o melhor plano de saúde para cada pessoa ou família, já que não é possível adivinhar qual doença aparecerá no futuro!

Com isso, os plano de saúde acabam por se beneficiar, inicialmente seduzindo o consumidor pelo “preço mais atrativo” e pelos “benefícios” na hora da contratação, mas, quando o beneficiário vai fazer uso do plano, este nega a cobertura de tratamentos e exames mais caros e complexos, com a simples alegação de que “não existe cobertura contratual para tanto”. E fica por isso mesmo?

Sabemos que todos os esforços dos médicos são destinados a prescrever o tratamento mais eficaz e que possibilite, antes de tudo, uma qualidade de vida razoável ao paciente para enfrentar toda a maratona de um tratamento complexo de câncer, buscando, quando possível, a cura da doença.

Vários procedimentos burocráticos impostos pelos planos de saúde acabam se tornando obstáculos que nem sempre são vencidos. Pedidos administrativos e justificativas médicas acabam sendo simplesmente ignoradas pelas auditorias internas criadas pelos planos de saúde, desrespeitando, para não dizer, ignorando a opinião do médico que definiu o tratamento para seu paciente.

Junto com isso, soma-se a angústia, o desconforto e, em alguns casos, a piora do estado de saúde do paciente, que acreditava estar protegido por ter contratado seu plano de saúde, mas que, na hora de maior necessidade, se depara com negativas contratuais por ele impostas.

Diante desse contexto, algumas pessoas podem e devem estar se perguntando: mas e a autonomia médica de prescrever determinados medicamentos ou solicitar a realização de determinados exames para melhor diagnóstico não deve ser respeitada pelo plano de saúde? De fato, a realidade vivida pelos médicos é, acima de tudo, frustrante em determinados casos, pois ficam à mercê das auditorias dos planos de saúde ou dependendo de futuras e incertas decisões judiciais.

Sim, este é o caminho! Se o plano negar a cobertura contratual de um tratamento de câncer, deve o paciente buscar um advogado de sua confiança para ajuizar demanda judicial. Assim, lamentavelmente, as decisões judiciais passam a conduzir os rumos dos tratamentos prescritos pelos médicos.

E você pode se perguntar se todo esse procedimento demora. Na grande maioria dos casos, não! Já que estamos falando do risco de morte do paciente.

O juiz, por meio de suas decisões e com a imposição de altíssimas multas em caso de descumprimento, decide se determinado paciente tem ou não direito ao tratamento prescrito pelo seu médico, com base em laudos e exames médicos. E, normalmente, se o plano de saúde cobre o diagnóstico de determinada doença, o entendimento é de que todo o tratamento também estará assegurado.

Assim, o pronunciamento judicial se traduz no acesso ao tratamento adequado indicado pelo médico e o afastamento de cláusulas contratuais abusivas e que não atendem a necessidade, nem a expectativa do paciente! Eis o conflito a ser enfrentado na via judicial, que pode decidir entre a continuidade ou não da vida do paciente, ou mesmo um tratamento com mais dignidade.

Vivemos tempos de incertezas, mas precisamos continuar acreditando no Judiciário como equalizador da justiça e do contrato, da expectativa criada e da realidade vivida.

Na próxima semana, nosso próximo artigo será dedicado as isenções tributárias concedidas as pacientes diagnosticados com câncer.

Não percam!

Carlos Dipp, professor do Curso de Direito do UniBrasil, e Michelle Hartmann, mestre em Direitos Fundamenteis e Democracia pelo UniBrasil, advogados em Curitiba (PR).
0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]