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Há muito que as mulheres vêm lutando por espaço igualitário e crescimento pessoal e profissional, aquilo que hoje se convencionou chamar de “empoderamento”. Em 1891, as mulheres brasileiras, influenciadas pelo movimento sufragista europeu, intensificaram a luta pela inclusão do direito de voto feminino na Constituição, que estava sendo elaborada naquele ano. Mas, como elas não eram consideradas “cidadãs”, acabaram sem conquistar o direito. O voto feminino de maneira livre só ocorreu em 1934.

Década de 70. As principais orquestras sinfônicas dos Estados Unidos eram compostas por apenas 6% de mulheres. Decidiu-se então alterar a forma como as audições eram feitas, com a implantação de testes “às cegas” – sem que se soubesse diferenciar homens e mulheres –, o que fez o número de musicistas do sexo feminino subir para 21%.

Década de 80. Após grande pressão social, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo passou a permitir que mulheres prestassem concurso para juíza, o que era vedado até então. No início, a aprovação feminina nesses testes era de cerca de 10%, o que reforçava o argumento de que elas não teriam capacidade de exercer o cargo.

Como ocorreu no caso das orquestras sinfônicas americanas, mudou-se então a forma de identificação nas provas: não mais por nomes, mas apenas por números, o que impossibilitava que se soubesse se o teste era assinado por um homem ou por uma mulher. A aprovação de mulheres nos concursos da carreira da magistratura em São Paulo subiu então para 40% .

Década de 90. A representatividade feminina no Congresso Nacional Brasileiro era de 5% do total de cadeiras. A Lei 9.504/97 estabeleceu então o percentual mínimo de 30% de vagas para as mulheres nas chapas proporcionais – regra válida até os dias de hoje.

No entanto, a “cota feminina” não apresentou os resultados que se supunham. Por óbvio. Sem a obrigatoriedade de apoio partidário efetivo e disponibilização de recursos financeiros (fundo partidário) consistentes, impossível ocorrer mudança significativa.

Essa é a razão pela qual, apesar de todas as mudanças legislativas dos últimos 20 anos, não houve crescimento significativo da representatividade feminina no parlamento. De 5% em 1990, passamos para 9,9% em 2016.

O Brasil ocupa hoje um vergonhoso penúltimo lugar em representatividade feminina nos parlamentos da América Latina, ficando à frente apenas de Haiti e Belize. Do total do eleitorado brasileiro, 52,30% são mulheres. Ainda assim, em 2016, tivemos 7.803 vereadoras eleitas, em comparação com 57.814 vereadores; e 641 prefeitas, contra 4.898 prefeitos.

Nos cargos de chefia, tanto públicos quanto privados, o quadro não muda muito. O Ministério do Governo Michel Temer, por exemplo, foi nomeado inicialmente apenas com homens, situação que se alterou apenas por força da repercussão negativa da opinião pública. Ao se comparar tal situação com a dos Ministérios de Canadá e Itália, com paridade de gênero em sua composição, o Brasil tem novamente um desempenho vergonhoso.

Nas grandes empresas privadas do país, a situação não é diferente. Apenas 7,5% dos cargos de direção são ocupados por mulheres. E mulheres brancas. Na área, temos ainda outra grande prova de discriminação de gênero: os salários masculinos são, em média, 30% maiores que os femininos, ainda que nas mesmas funções. E, quanto mais alto o cargo na empresa, maior a diferença: segundo o IBGE, o salário médio das mulheres equivale a 68% do pago aos homens.

Portanto, cabe destacar que a meritocracia, pura e simples, só pode ser aplicada se partirmos de uma igualdade de base, em que o gênero não seja levado em consideração.Em todos os outros casos, há necessidade premente de ações afirmativas para se permitir a igualdade de oportunidades para mulheres e homens, seja na política, seja na vida privada.

E ações afirmativas, no caso da representatividade feminina na política, passam sim pelas cotas, como com a proposta de reserva de cadeiras no parlamento, com determinação de quociente eleitoral mínimo. Ou, ainda, no caso de mudança no sistema eleitoral de lista aberta para lista fechada, com a alternância obrigatória de nomes entre homens e mulheres.

Tais ações podem também ser adaptadas às empresas privadas, como com a obrigatoriedade de preenchimento de percentual específico de mulheres em suas Diretorias e Conselhos.

Por fim, importante destacar que os países mais igualitários do mundo – Islândia, Finlândia, Noruega e Suécia – estabeleceram, há muito, políticas públicas e ações afirmativas para promoção de igualdade de oportunidades entre os gêneros, tanto na administração pública quanto na iniciativa privada.

Isso levou tais países a grande desenvolvimento político e econômico, comprovando que a igualdade entre homens e mulheres só beneficia a coletividade.

Carla Karpstein, advogada, presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-PR e secretária-geral do Instituto Paranaense de Direito Eleitoral (Iprade)
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