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Curitiba – Um dos ministros mais pressionados para deixar o cargo já no início do governo Lula, por sua estreita ligação com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Miguel Rosseto venceu as resistências ao seu nome para o ministério do Desenvolvimento Agrário e, depois de três reformas ministeriais, é hoje considerado como intocável no primeiro escalão do governo.

Rosseto esteve neste fim de semana no Paraná para inaugurar a Escola Latino-Americana de Agroecologia, na Lapa. Localizada dentro de um assentamento do MST, a escola é fruto de uma parceria entre os governos do Paraná, do Brasil e da Venezuela, com o intuito de formar especialistas em agroecologia. Depois da cerimônia, participou de uma reunião com a militância do PT, na qual defendeu seu apoio às candidaturas de Raul Pont para a presidência nacional do partido e de Dr. Rosinha para o diretório regional. Antes disso, Rosseto recebeu a Gazeta do Povo para uma entrevista, na qual falou sobre crise política, das eleições internas do PT e da atuação do ministério em relação à reforma agrária.

Gazeta do Povo – Como o senhor avalia a atual crise política?Miguel Rosseto – Não temos que minimizar a dimensão desta crise. Ela é grave, agride valores fundantes do PT, especialmente no momento em que temos a responsabilidade de governarmos o país. Ela sinaliza necessidades de mudanças de condutas de regras que evitem a reprodução desta situação. Nós temos condições de retomar uma trajetória de afirmação positiva do PT. E eu estou empenhado nessa direção.

O senhor apóia o candidato Raul Pont para a presidência do PT. O que mudaria no partido uma eventual vitória da esquerda nas eleições internas?O PT vive um momento de profunda reflexão. É o momento de haver um processo de organização partidária ou de refundação. Temos que trabalhar em função desta crise e atualizar uma visão socialista e democrática para o PT. Temos que atualizar uma visão sobre um projeto para o Brasil, aprendermos com a nossa experiência no governo nacional, com seus limites e suas possibilidades e realizarmos uma grande reforma estatutária que recoloque a questão da democracia interna do PT. A crise do PT é essencialmente uma crise político-programática, uma crise da democracia interna do PT. Chegamos à situação da constituição de um verdadeiro partido dentro do partido. Isso é inaceitável. O partido não precisa de campo majoritário, mas de uma direção política a partir das instâncias coletivas que sustentam a opinião da nossa militância. É o resgate dessa democracia partidária que fez o PT diferente dos projetos partidários e que representa a possibilidade de continuarmos afirmando um projeto de esquerda. Esses são os grandes referenciais que as candidaturas da esquerda oferecem à militância do PT.

Qual é a postura do ministério em relação à soja transgênica?É a de respeito às regras ambientais, às quais toda a sociedade está submetida. Penso que os produtores estão aprendendo com este processo, já que o plantio da soja transgênica não vem apresentado os resultados em produtividade e econômicos que eram anunciados. Vivemos agora um momento de reflexão. Creio que nossos produtores, por todas as razões que hoje nos percebemos no mercado internacional, deveriam fazer uma opção pela soja convencional ou especialmente pela soja orgânica.

Para o Paraná, a proibição da exportação da soja transgênica pelo Porto de Paranaguá é positiva?Acho que é uma escolha legítima de quem busca preservar uma atividade econômica mais rentável para o seu estado e, por isso, deve ser respeitada.

O Brasil tem condições hoje de ampliar o território agrícola?A capacidade de produção de alimentos que o Brasil tem é gigantesca. Nosso grande desafio agora é pensar menos em expansão territorial e mais em questões de produtividade, em tecnologias que não degradem parte importante do território produzido.

O modelo de monocultura precisa ser repensado?Sim, nossos agricultores estão vivendo isso, seja por conta da instabilidade do preço ou por conta de que a monocultura é insustentável do ponto de vista ambiental. É um modelo que, para sua sobrevivência, exige uma concentração de terra que é insustentável para um projeto democrático de nação, insustentável de ponto de vista ambiental e insustentável de ponto de vista econômico. As experiências mais vitoriosas nesse sentido estão exatamente nas propriedades que foram capazes de diversificar sua produção.

Nesse sentido, qual é o papel da reforma agrária?O Brasil é um dos países que dispõem da maior concentração fundiária do planeta. Não há nação do mundo que encontrou uma estratégia de oportunidades a todo seu povo com base na grande propriedade. Temos que avançar nisso e estamos avançando.

Mas as grandes propriedades não têm importância fundamental no que se refere às exportações?Isso a rigor faz parte de uma grande propaganda ideológica. Via de regra, a sociedade brasileira é bombardeada por duas fotografias: de um lado, a grande propriedade da monocultura extensiva, com grandes máquinas modernas. De outro, uma fotografia da pobreza rural da pequena propriedade. Isso não é verdade. As últimas pesquisas que tratam do assunto mostram que, em todas as regiões do país, as pequenas e médias propriedades são as que agregam mais valor e têm índices de produtividade médios superior. Hoje, 33% de tudo o que é produzido no setor agropecuário brasileiro vem da pequena e média propriedade, que respondem por 10% do PIB brasileiro. São elas que geram 7 em cada 10 empregos no campo e são responsáveis por grande parte da produção de alimentos em nossos país. Quase 35% da soja produzida no Brasil vem da pequena propriedade.

A reforma agrária que está ocorrendo é a mesma que o senhor idealizou?A reforma agrária no Brasil, diferentemente de outros países, é determinada por três regras constitucionais: grandes propriedades, propriedades improdutivas e a justa indenização aos proprietários. Isso cria obviamente limites e possibilidade. Esses limites são reais e não possibilitam um processo mais amplo e mais veloz como nós gostaríamos. Mas já avançamos muito. Em dois anos e meio, 164 mil famílias tiveram acesso a terra e 71% dos assentamos têm assistência técnica regular. Somente para o Paraná, para este ano de safra 2005/ 2006, já estão disponíveis nas agências bancárias R$ 1,180 bilhão – o que vai permitir que mais de 230 mil famílias de agricultores possam acessar esse crédito. Mas é evidente que eu gostaria de um ritmo maior.

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