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Congresso Nacional convive com paralisia por causa da crise política. | Rodolfo Stuckert/Agência Câmara
Congresso Nacional convive com paralisia por causa da crise política.| Foto: Rodolfo Stuckert/Agência Câmara

A proximidade do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), com pautas mais conservadoras e com algumas bancadas temáticas — ruralistas, religiosos e segurança pública — tem feito prosperar na Casa projetos como a redução da maioridade penal, a dificuldade de demarcação de terras indígenas, a exigência de boletim de ocorrência para uma mulher vítima de estupro se submeter a aborto e a facilidade de acesso do cidadão às armas. Mas o risco de Cunha deixar a presidência de forma prematura por causa de seu envolvimento em escândalos de corrupção faz com que os deputados acelerem a tramitação das propostas. Sabem que, com Cunha, suas ideias vão longe.

Por outro lado, a pauta econômica, que o governo implora para ser votada, vai a passos lentos e está longe de ser prioridade de Cunha, envolto numa queda de braço com a presidente Dilma Rousseff. É o caso da CPMF. Cunha já se posicionou contra e disse que dificilmente a proposta vai passar. A segunda fase do ajuste fiscal está “empacada” no Congresso e foi substituída nas pautas da Câmara e do Senado por uma agenda de propostas bem mais conservadoras e sem relação com a crise econômica. O governo não conseguiu fazer deslanchar a discussão e votação de medidas cruciais para reduzir o rombo fiscal de 2015 e até o de 2016. A votação do projeto que trata da repatriação de recursos, por exemplo, ficou para a próxima semana.

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No Senado, o ritmo das votações caiu, até porque as medidas do ajuste estão agora na Câmara, como destaque para as Propostas de Emenda Constitucional (PECs) da própria CPMF e da prorrogação da chamada DRU (Desvinculação de Receitas da União), mecanismo que permite ao governo mexer livremente em parte de suas receitas.

Os parlamentares ligados aos direitos humanos formam uma minoria aflitiva. Colecionam derrotas atrás de derrotas. Na última terça, foram duas fragorosas, num dia só. À tarde, a turma da “bancada da bala” aprovou, com sobras (19 votos a 8), mudanças no Estatuto do Desarmamento: reduziu de 25 para 21 anos a idade mínima para se comprar arma, a posse agora é definitiva e o porte só será renovado a cada dez anos (antes eram três). À noite, a “bancada ruralista”, com mais sobras ainda (21 a 0), transferiu do Executivo para o Congresso a demarcação de terras indígenas.

“O Congresso é conservador, e essas bancadas se uniram. A nós, resta as armas que não ferem: a palavra, a coragem e a firmeza”, disse o padre Luiz Couto (PT-PB).

Relator do Estatuto da Família — que prevê conceito de família apenas com homem e mulher —, Diego Garcia (PHS-PR) disse, após protesto dos contrários à PEC que mexeu na demarcação de terras indígenas, que esse grupo sempre tumultua. “São sempre os mesmos, que obstruem e não deixam votar projetos que não lhes interessam. Fizeram o mesmo na votação do Estatuto da Família. Não sabem perder”, disse Garcia.

O presidente da comissão das terras indígenas, Nilson Leitão (PSDB-MS), também criticou. “ Fazem o jogo de cena de sempre”.

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Na economia, a especialista em Orçamento e professora da UFRJ Margarida Gutierrez disse que as medidas do ajuste estão paradas no Congresso. Ela não acredita na aprovação da CPMF e afirma que o governo precisa, pelo menos, obter a DRU e os recursos da repatriação.

“Está tudo parado. Não tem essa segunda fase do ajuste. Essa fase não foi implementada, e o ministro Joaquim Levy (Fazenda) não vai ter as receitas adicionais que ele previa. Sem a DRU, será uma paulada para o governo. E acredito que a CPMF não vai sair e o governo terá que aumentar a Cide. O Congresso está em compasso de espera total. Do ponto de vista fiscal, é uma tragédia”, afirmou Margarida.

Chapas

O diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antônio Augusto de Queiroz, diz que a atual composição da Câmara é a mais conservadora desde a redemocratização do país, em 1985.

“Temos uma Câmara conservadora na área social, liberal na economia e atrasada na pauta dos direitos humanos. E muitos desses conservadores foram eleitos em chapas encabeçadas por partido de esquerda. É uma contradição do jogo político”, disse Queiroz.

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A líder do PCdoB, deputada Jandira Feghali (RJ), destaca que, apesar da resistência, matérias conservadoras têm avançado na Câmara, ameaçando direitos de minorias adquiridos ao longo do tempo. “Com Eduardo Cunha na presidência da Câmara, vemos uma pauta com temas absolutamente conservadores. Com um Congresso rico em termos patrimoniais e o crescimento de bancadas de mentalidade atrasada, predominou a pauta conservadora. Ficamos na política de resistência para evitar o retrocesso e perdas de direitos, mas não está fácil. A sociedade precisa se mobilizar mais”, diz Jandira.

Líder da Rede, o deputado Alessandro Molon (RJ) também vê com preocupação a tramitação dessas matérias e nota que, nas últimas semanas, a “onda reacionária” tornou-se mais forte. “O que temos visto nesta Legislatura é uma pressa atípica para votar pautas como a PEC 215 [demarcação de terras indígenas], a revogação do Estatuto do Desarmamento e a redução da maioridade penal, que representam graves retrocessos em conquistas civilizatórias do país. Nas últimas semanas, essa onda reacionária se tornou ainda mais forte”, pontuou o deputado.

Para o deputado Jean Wyllys (PSol-RJ) , a preferência por pautas conservadoras seria uma forma de Eduardo Cunha manter apoio de segmentos “reacionários”. “O conservadorismo político ganhou muita força no Parlamento com a extrema polarização e fulanização da política ocorrida em 2014 e chegou a níveis extremos e assustadores com a eleição de Eduardo Cunha como presidente da Câmara”.

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