Zélia Cardoso de Mello teve papel de destaque no governo Collor (1990-1992), ocupando a pasta da Fazenda| Foto: PROTASIO NENE/PROTASIO NENE

A nova formulação da Esplanada dos Ministérios no governo Temer traz à tona um problema histórico na política brasileira: a pequena participação das mulheres. Na lista do primeiro escalão do governo do presidente interino Michel Temer (PMDB) não há sequer um nome feminino. Desde o governo de Ernesto Geisel (1974-1979), essa é a primeira vez que nenhuma mulher ocupa um cargo em ministério.

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O número de mulheres na Esplanada nunca foi representativo. Até o governo Lula (2003-2010) não passava de cinco nomes. A presidente Dilma Rousseff (PT) foi a que mais teve participação feminina no primeiro escalão no governo federal. Passaram pela Esplanada 18 mulheres desde o início do governo, em 2011. Quatro delas ocuparam o cargo interinamente. Nos últimos dias de governo, eram oito nomes femininos nos ministérios, três deles de ministras interinas.

Mulheres no ministério

Fernanda Trisotto

O último governo sem nenhuma mulher nos cargos de alto escalão foi o governo de Ernesto Geisel (1974-1979). O general só nomeou ministros homens.

Foi João Figueiredo (1980-1985) o primeiro presidente a nomear uma mulher para ocupar uma pasta. A escolhida foi a advogada e professora Esther de Figueiredo Ferraz, primeira mulher ministra de estado do Brasil: ela ocupou a pasta de educação.

José Sarney, presidente entre 1985 e 1990, nomeu mais uma mulher: Dorothea Werneck ocupou a pasta do Trabalho no último ano do governo. Fernando Collor (1990-1992) tinha Zélia Cardoso de Mello como ministra da Fazenda. Itamar Franco (1992-1995) teve como ministras Yeda Crusius (Planejamento) e Margarida Coimbra do Nascimento (Transportes).

Fernando Henrique Cardoso (1995-2003) também nomeou duas mulheres: Dorothea Werneck para Indústria e Comércio e Cláudia Costin para a pasta de Administração e Reforma.

Foi no governo Lula (2003-2010) que a participação das mulheres começou a aumentar.

Foram várias, incluindo a própria presidente DIlma Rousseff, que começou como chefe do ministério de MInas e Energia e terminou na Casa Civil. As outras ministras de Lula foram Benedita da Silva (Secretaria Especial da Assistência e Promoção Social, com status de ministério), Erenice Guerra (Casa Civil, enquanto Dilma disputava as eleições presidenciais), Izabella Teixeira (Meio Ambiente), Márcia Lopes (Desenvolvimento Social e Combate à fome), Marina Silva (Meio Ambiente), Marta Suplicy (Turismo), Matilde Ribeiro (Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial), Nilcéia Freire (Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres) e Sandra Meira Starling (Trabalho, interina).

A prática foi consolidada no governo Dilma (iniciado em 2011). Ela teve como ministras Ana de Hollanda (Cultura), Emília Maria Silva Ribeiro Curi (Ciência, Tecnologia e Inovação), Gleisi Hoffmann (Casa Civil), Ideli Salvatti (Pesca, Relações Institucionais e secretaria dos Direitos Humanos), Inês da Silva Magalhães (Cidades), Iriny Lopes (Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres), Izabella Teixeira (Meio Ambiente), Kátia Abreu (Agricultura), Luiza Helena de Bairros (Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial), Maria Fernanda Ramos Coelho (Desenvolvimento Agrário, interina), Maria do Rosário (Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República), Miriam Belchior (Planejamento) e Tereza Campello (Desenvolvimento Social e Combate à Fome).

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Para a cientista política da UFSCAR Maria do Socorro Braga, a baixa participação feminina no primeiro escalão do governo é um reflexo da participação feminina na vida política como um todo. “Está muito relacionado com a prévia participação, chamada background, das mulheres no ponto de vista da participação em várias esferas políticas”, analisa. Para Maria, o fato dos partidos serem a principal força de indicação de nomes para ministérios explica a baixa participação feminina, já que há poucas lideranças femininas nas legendas.

“Nós somos ainda uma sociedade machista, temos uma tradição cultural com a submissão da mulher”, analisa o professor de Ciências Sociais e do mestrado em Direitos Humanos da PUCPR Lindomar Boneti. “Nós temos uma herança cultural voltada para o homem no comando, como voz ativa. Isso a gente vê dentro da família, quanto mais com a representação política”, explica o professor.

Pico

O pico no número de mulheres participando do governo Dilma, além da presidente ser mulher, pode ser explicado pelo partido de esquerda da presidente. “Se você olhar o perfil é de se esperar que elas [ministras de Dilma] sejam mais partidárias e menos técnicas. Normalmente os partidos mais de esquerda são os que atraem mais as mulheres”, analisa Maria.

“A mulher na política hoje se sobressai quando há uma valorização dos movimentos sociais, quando existe uma presença maior dos movimentos sociais no governo, como é o caso do governo Lula em partes e do governo Dilma”, analisa Boneti. “Eu não vejo, por exemplo, que o governo Temer tenha um perfil de valorização dos movimentos sociais. Parece-me que ele tem apoio de mais segmentos de direita onde os movimentos sociais não tem guarida”, diz o professor.

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Retrocesso

No momento em que o país assiste ao impeachment da primeira presidente mulher da história, e a episódios como o perfil da esposa do vice-presidente Michel Temer (PMDB), em que a revista Veja classificou o vice de “um homem de sorte” ao descrever Marcela Temer como uma mulher “bela, recatada e do lar”, a redução do número de mulheres na Esplanada preocupa. “É um retrocesso na luta pela igualdade de gênero. É um pouco assustador o perfil político de não lembrar desse fator tão importante”, diz Boneti.

Maria também chama a atenção para o retrocesso que representa a composição dos ministérios no governo Temer em relação à paridade de gênero. “Se não houver estímulo dos principais atores, lideranças que estão a frente de um governo nesse sentido, a gente vai reduzir cada vez mais a entrada das mulheres nesses quadros”, alerta.

Para o professor, seria politicamente positivo para Temer garantir a participação feminina no governo. “Seria uma estratégia política inteligente, isso iria contrabalancear politicamente [o impeachment]”, analisa.

Eleições

A falta de participação feminina não é exclusividade da composição dos ministérios. O número de mulheres concorrendo -- e sendo eleitas – em eleições municipais, estaduais e nacionais também é baixo e mostra como ainda há muito a avançar na inclusão de gênero.

Um levantamento realizado pela Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República mostra que o número de candidatas a prefeita nos municípios brasileiros nas últimas eleições era de apenas 13,4%. O número de prefeitas eleitas naquele ano é ainda menor: 11,8%.

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Quando analisados os dados por estado é possível perceber que o estado com o maior percentual de candidatas mulheres em relação aos homens é Roraima, onde 23,4% dos concorrentes são do sexo feminino. Mesmo assim, a proporção não chega nem a um quarto dos candidatos.

Quando o cargo é o de vereadora, o número de candidatas é um pouco maior: 31,9% em 2012. O número de eleitas, porém, é bem menor: apenas 13,3% das cadeiras em Câmaras Municipais no país são ocupadas por mulheres.

Paraná

No Paraná, a tendência não é diferente da política nacional em relação às mulheres. O estado nunca teve uma governadora, por exemplo, assim como Curitiba nunca foi liderada por uma prefeita. As casas legislativas sediadas em Curitiba -- Assembleia Legislativa e Câmara de Vereadores -- também nunca tiveram uma líder feminina.

O número de mulheres eleitas também é baixo. Em Curitiba são cinco vereadoras para 38 cadeiras. Na Assembleia Legislativa, das 54 vagas, apenas quatro são ocupadas por mulheres. No Congresso, dos 30 deputados da bancada paranaense, só há dois nomes femininos. No Senado, a única representante feminina do Paraná é Gleisi Hoffmann (PT).