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Antonio Fernando Souza criticou a condução da investigação sobre o escândalo de corrupção na Petrobras. | Wenderson Araújo/Gazeta do Povo
Antonio Fernando Souza criticou a condução da investigação sobre o escândalo de corrupção na Petrobras.| Foto: Wenderson Araújo/Gazeta do Povo

Antonio Fernando de Souza entrou para a história quando, recém-chegado à Procuradoria-Geral da República, ofereceu a denúncia de 40 pessoas envolvidas no mensalão, em 2006. Aos 66 anos, ele agora defende o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), no envolvimento em inquérito da Lava Jato, função que disse desempenhar de forma “plenamente confortável”. Souza reafirmou que havia “carradas de provas” de que houve o mensalão e elogiou o trabalho da força-tarefa da Lava Jato, sem deixar de criticar indiretamente o atual procurador-geral, Rodrigo Janot. Ele afirmou que, no mensalão, “não houve divulgações parciais de nada”, argumento usado por seu cliente para criticar o atual procurador.

No caso da Lava Jato, há muita pressão em cima dos procuradores. Foi assim também no mensalão? O procurador vira o alvo preferencial dos réus e advogados?

O inquérito em si, o acompanhamento do inquérito pelo Ministério Público ocorreu a partir de agosto, setembro de 2005. E a denúncia já foi em março de 2006, um período de oito, nove meses [entre um e outro]. Pelo que eu me lembro, havia mais o questionamento de alguns políticos, se a procuradoria ia ou não ia atuar, mas nós fizemos uma investigação absolutamente sem divulgar nada, tanto que, ajuizada a denúncia, dez dias antes, ninguém sabia, já estava protocolada e ninguém sabia, nem a imprensa. Lá, não houve a preocupação de fazer divulgações parciais de nada, a investigação seguiu a denúncia.

Qual foi o momento mais tenso desse percurso?

Olha, eu não senti em nenhum momento qualquer preocupação. Quando assumi a procuradoria, assumi com o compromisso de exercer na plenitude o cargo, sem me preocupar de agradar ou desagradar alguém, e agir de maneira imparcial e à luz do que fosse apurado. Então não houve e nem podia ter havido pressão, até porque se fez tudo com muita discrição, e pouca gente sabia do andamento, praticamente só o gabinete sabia do andamento das investigações. O único momento mais delicado foi quando a CPI [dos Correios] foi levar o resultado lá e a essa altura a denúncia já estava oferecida.Nós já tínhamos aproveitado muito do que a CPI tinha levantado, tínhamos um procurador lá, então foi o momento mais delicado pela surpresa que causou aquilo [entre os políticos].

Como lidou com as críticas, que continuam hoje, de que o mensalão foi um julgamento político, uma perseguição ao governo do PT?

O Supremo Tribunal Federal é extremamente rigoroso nos seus julgamentos, especialmente nos de natureza penal. E o Supremo ficou confortável, diante desse conjunto de provas que foram apresentadas, para tomar as decisões que tomou. Então não houve julgamento político de ninguém, nem o Ministério Público quando ofereceu a denúncia teve essa preocupação política, nem o Supremo, creio eu com toda a segurança, considerando os pronunciamentos que ele tem em matéria penal, não teve nenhum problema. O grande equívoco é se falar que o Supremo condenou sem provas. Eles tinham carradas de provas sobre tudo que foi dito.

Há uma discrepância entre as penas estabelecidas ao núcleo político e aos outros. Por que as penas foram mais duras para esse núcleo [do Marcos Valério] do que para os políticos?

Na verdade, existiam mais ações praticadas por eles, então houve uma continuação delitiva, o que em princípio gera mesmo um número maior de sanções. Ele [Marcos Valério] estava em vários pontos do episódio.

Ao contrário do que acontece na Lava Jato, ainda não houve ressarcimento do dinheiro desviado do mensalão. A denúncia foi feita de forma corrida, sem apreciar esse tipo de questão?

Não, a denúncia foi feita no prazo, foram 7, 8 meses, uma coisa que foi trabalhada todo os dias com muita dedicação. Agora, o Supremo não tem iniciativa nenhuma em matéria cível contra pessoas. Então no mesmo momento em que foi feita a denúncia, foi feito um desmembramento e encaminhados para vários lugares os procedimentos para serem adotados nas medidas cabíveis, inclusive essa. E várias estão em curso por aí ainda. Mas, do procurador-geral, só se esperava era aquilo mesmo, o oferecimento da denúncia criminal que envolvia parlamentares.

Olhando em retrospecto, à luz do que acontece hoje, o senhor teria lançado mão de instrumentos como a colaboração premiada? acha importante?

Tudo que se possa conseguir para resultar numa informação é importante, mas certos instrumentos são mais delicados, e por isso devem ser manejados com muito mais perícia, para que não gere ofensas a direitos. No próprio caso do mensalão, teve uma delação, e ela foi muito útil e foi usada na medida correta.

O senhor acha que hoje há um uso indiscriminado?

Não, não estou fazendo comparação, que é importante usar, é. Mas eu não estou participando das investigações do Ministério Público, então não sei como estão usando. São mais pessoas envolvidas, evidentemente pode ter mais gente [fazendo acordos], agora, estou falando em tese que não é desprezível, mas é daqueles instrumentos muito delicados que exigem um manejo muito cuidadoso.

Mas o senhor acha que hoje está sendo usado em excesso e isso pode ser perigoso?

Olha, é que o conjunto de fatos está muito grande, são muitas pessoas, mas essa avaliação quem tem que fazer é o Ministério Público e, evidentemente, que os advogados de defesa vão explorar issona medida em que for possível. O importante é saber usar, na medida certa.

O senhor ofereceu a denúncia do mensalão e agora está do outro lado, passa a advogar para um acusado da Lava Jato. Como é essa transição de acusador a defensor?

Eu estou aposentado desde 2006, estou fazendo advocacia e estou fazendo uma defesa em que me sinto plenamente confortável, porque eu vi todas as informações, todo o material apresentado e estamos fazendo uma defesa quanto ao mérito da questão, de que nós não conseguimos ver, com todo respeito, nenhum indício que possa comprometer a pessoa que eu defendo.

O senhor hesitou em aceitar?

Não, eu avaliei, só fiz a defesa depois de ter examinado o pedido de abertura de inquérito e todo o material que se apresentava, como devo fazer com qualquer cliente, mas eu estou confortável em fazer essa defesa. Sei que cumpri a minha missão como procurador-geral integralmente, com tudo que tem que ser feito, e como advogado também tento cumprir com o rigor que se espera.

Já foi criticado por agora estar defendendo o Eduardo Cunha?

Eu não fico acompanhando, mas se alguém criticar, pode criticar, mas eu estou confortável. Eu hoje sou advogado, não sou mais membro do Ministério Público e eu honrei o Ministério Público durante os 34 anos em que passei lá, sendo absolutamente rigoroso em tudo que fiz.

Como advogado da defesa, o senhor agora critica o procurador Rodrigo Janot por, por exemplo, não ter incluído o Delcídio Amaral...

Não foi isso que eu fiz, a crítica que se fez foi que o critério de aferição dos elementos probatórios não foi uniforme. Diante da mesma situação fática, diante dos mesmos fatos, houve uma valoração diferente. Agora, isso é o que foi constatado, entre o que se fez num pedido e se fez em outro. Não é uma crítica injusta, é uma crítica baseada num elemento que está documentado e qualquer pessoa pode olhar e ver, que houve uma quebra daquela isonomia que tinha que haver naquele tratamento. Mas não estou advogando que abra um inquérito contra o Delcídio.

O senhor já trabalhou com algum dos procuradores que hoje integram a força-tarefa da Lava-Jato? O que acha deles?

Eu conheço os procuradores que estão lá, são todos de altíssimo nível, acho que o Ministério Público tem uma gama de membros importante, dedicada, que trabalham bem, o que dificulta o trabalho dos advogados (risos). Mas não tenho nenhum reparo a eles.

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