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Valdemar da Costa Neto: Câmara não quis nem abrir investigação | José Cruz/ABr
Valdemar da Costa Neto: Câmara não quis nem abrir investigação| Foto: José Cruz/ABr

Corporativismo

Suspeitos de desvio são os que julgam

As estratégias de composição dos Conselhos de Ética e de condução das representações por quebra de decoro expõem as intenções dos parlamentares de se blindarem da opinião pública. A opinião é do professor de Ética e Filosofia Política da Universidade de Londrina, Elve Cenci. "Deputados e senadores trabalham em busca de proteção, em especial do julgamento do eleitor", diz.

Segundo ele, isso fica claro quando congressistas que enfrentam problemas na Justiça são escolhidos para compor os conselhos. Atualmente, sete dos 30 membros do órgão no Senado estão envolvidos em processos no Supremo Tribunal Federal. O atual presidente, João Alberto (PMDB-MA), que já ocupou o cargo três vezes, é aliado político de José Sarney e ficou conhecido como "engavetador" de processos.

"Para muita gente é bom que alguém com um histórico problemático seja colocado para julgar os colegas. Ele não vai querer condenar ninguém, sabendo que o próximo pode ser ele", diz Cenci.

O cientista político Leonardo Barreto, da Universidade de Brasília, ressalta que os parlamentares também têm demonstrado menos medo de confrontar a opinião pública. "Eles adquiriram a percepção de que a opinião pública não contamina a opinião dos eleitores." Segundo ele, apenas a criação de um órgão externo de controle à conduta dos congressistas poderia surtir efeito.

"Hoje não há uma instância válida que possa assegurar o combate à impunidade", diz Barreto.

Voto aberto segue com resistências

Se depender apenas das adesões à Frente Parlamentar em Defesa do Voto Aberto, a proposta de emenda à Constituição (PEC) que acaba com todas as decisões secretas no Congresso Nacional (inclusive de processos de cassação), dificilmente será aprovada. O grupo criado há 12 dias tem o apoio de apenas 265 deputados e 11 senadores. Para ser aprovado, o texto precisa de maioria de três quintos nas duas Casas – 308 votos na Câmara e 49 no Senado.

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  • Fernando Francischini: conselhos são apenas palco de disputas políticas

Brasília - O arquivamento do processo contra o deputado Valdemar da Costa Neto (PR) na semana passada endossa uma tradição dos Con­­selhos de Ética do Congresso Nacional. No Senado, das 20 representações por quebra de decoro parlamentar apreciadas pelo órgão desde 1993, apenas uma acabou em perda de mandato. Na Câmara, foram quatro para 45 casos desde 2001. Somando as duas Casas, menos de 8% das ações apreciadas geraram cassações.

A decisão dos deputados inocentou Costa Neto sem sequer abrir possibilidade para o início das investigações. Ele era alvo de denúncias de envolvimento em reuniões no Ministério dos Transportes nas quais haveria supostos pedidos de propina a empresários em troca da liberação de recursos públicos. O processo foi arquivado por 16 votos a 2, graças ao apoio maciço da base aliada do governo.

"Enquanto os partidos usarem o conselho como um palco de disputas políticas e não de limpeza ética vamos continuar com esse ritmo de absolvições em série", diz o deputado paranaense Fernando Francischini (PSDB), autor do relatório que pedia a abertura das investigações contra Costa Neto. Três meses antes, o Conselho de Ética da Câmara até aprovou o pedido de cassação de Jaqueline Roriz (PMN-DF), por 13 votos a 3, mas ela acabou absolvida pelo plenário.

Além do corporativismo, as regras de tramitação dos processos por quebra de decoro também colaboram para o baixo índice de punições. Desde 2001, quando o Conselho da Câmara começou a funcionar, foram abertas 129 representações. Dentre elas, apenas 45 chegaram até o Conselho – a maioria das outras acabou arquivada sumariamente pela Mesa Diretora.

A primeira cassação ocorreu em 2005, quando o então deputado fluminense André Luiz foi flagrado tentando extorquir R$ 4 milhões do empresário Carlos Augusto da Silva, o Carlinhos Cachoeira. Na época, o relator do caso foi o ex-deputado paranaense Gustavo Fruet. "Com o tempo, a Câmara aprendeu a manobrar com as decisões do Conselho e os deputados passaram a se proteger mais", afirma Fruet.

Na sequência, outros três deputados foram cassados por envolvimento com o mensalão – Roberto Jefferson (PTB-RJ), José Dirceu (PT-SP) e Pedro Corrêa (PP-PE).

No Senado, a situação é parecida. Em maio, o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), arquivou uma ação movida pelo Sindicato dos Jornalistas do Distrito Federal contra o paranaense Roberto Requião (PMDB). A entidade pedia que Requião fosse punido com as sanções de advertência e censura por ter ameaçado fisicamente e tomado o gravador de um repórter no plenário do Senado, em abril.

O único senador cassado da história foi Luiz Estevão, em 2000, acusado de envolvimento no desvio de R$ 169 milhões nas obras do Tribunal Regional do Trabalho, em São Paulo. Em 2007, o Conselho decidiu pela procedência de duas de cinco representações contra Renan Calheiros (PMDB-AL), acusado de ter despesas pessoais pagas por um lobista – ele acabou absolvido pelo plenário em ambos os casos. Em 2009, o Conselho arquivou de uma vez só 11 representações contra Sarney – a maioria ligada ao escândalo dos atos secretos.

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