Michel Temer apareceu em público todos os dias desde que assumiu o Palácio do Planalto.| Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

A principal batalha entre o governo de Michel Temer e o grupo político da presidente afastada Dilma Rousseff até o julgamento final do processo de impeachment não será travada no Senado, mas na mídia.

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Ministros de Temer não se cansam de conceder entrevistas para mostrar a “herança maldita” de Dilma, explicar como vão tirar o país da crise e informar a posição da nova gestão sobre assuntos de interesse da população.

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Já o PT reforça o discurso de “golpe” sempre que tem oportunidade, enquanto a militância petista promove manifestações pedindo “Fora Temer”, numa aposta de que a situação do país vai continuar ruim e que isso dará a Dilma uma chance de voltar à Presidência.

Nos primeiros quatro dias de governo Temer, pelo menos sete ministros deram entrevistas – coletivas e exclusivas –, além do próprio presidente em exercício, que falou com exclusividade ao programa Fantástico, da TV Globo, no último domingo (15).

Para o professor de Jornalismo da PUCPR Miguel Manassés, o governo Temer tenta ser o mais claro e acessível que pode para estancar a crise política e econômica. “O que os ministros vêm fazendo é buscar uma aproximação com a mídia para mostrar que é um governo transparente, que está disposto a dialogar”, diz.

O novo presidente sabe que não é popular – pesquisa do Instituto Datafolha divulgada em abril mostrou que 58% dos brasileiros aprovavam um eventual impeachment de Temer, quase o mesmo índice dos favoráveis ao afastamento da petista (61%).

Por isso, a palavra de ordem do Planalto é mostrar a intenção de mudar o rumo do país, sobretudo na economia. O novo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, não esconde em suas entrevistas que aposta que a mera sinalização de mudanças na política econômica será suficiente para animar o ambiente econômico – o que poderia levar à queda dos juros e dar fôlego para o consumo das famílias. E, para que isso ocorra, é preciso comunicar-se com os mercados e a população.

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Diferencial

Uma coisa é clara: o presidente em exercício se comunica melhor do que Dilma –a presidente afastada era avessa a entrevistas.

“A gente ainda não conseguiu ver muito bem para onde isso está indo, mas uma coisa que eu achei um diferencial muito grande que ele fez até agora foi chamar o embaixador Pedro Luis Rodrigues para ser o chefe da comunicação internacional, que é algo que a gente não via até então”, diz o mestre em Ação Política Márcio Coimbra. Para ele, a estratégia foi adotada para ajudar a melhorar a imagem do país. “É para transmitir as mudanças que estão sendo feitas na economia”, explica.

Para Manassés, ainda é cedo para dizer se o relacionamento de Temer com a imprensa vai continuar “uma lua de mel”. “O governo Temer está sendo mais colaborativo, mas ainda é cedo para fazer uma análise de como ficará a relação dele com a mídia”, diz.

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Ministros de Temer “batem cabeça” na mídia

s ministros do governo Temer estão mais soltos para conceder entrevistas em relação à equipe do governo Dilma. Se por um lado a estratégia contribui para conquistar apoio popular, de outro gera controvérsias dentro da própria equipe no primeiro escalão do governo.

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Em menos de uma semana de governo, pelo menos dois ministros já protagonizaram bate-cabeça no governo.

O ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, foi desautorizado pelo presidente em exercício Michel Temer ao falar em uma mudança na maneira como é escolhido o procurador-geral da República (ele defendeu que o mais votado pelo Ministério Público não necessariamente seja o indicado).

O ministro da Saúde, Ricardo Barros, precisou se corrigir ao falar da necessidade de rever a universalização da saúde através do SUS. Outros casos como a necessidade da volta da CPMF e a reforma na previdência também já foram temas de debates entre os próprios comandantes do governo.

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“Nem sempre o que os ministros entendem ser o melhor para o país é aquilo que pode ser alcançado politicamente, e o governo acaba recuando”, afirma o professor de jornalismo da PUCPR Miguel Manassés, lembrando que o jogo político é mais complexo do que se imagina.

Lulistas insistem na tese do “golpe”

Para entender como PT pode usar a comunicação como arma política nos próximos meses, é preciso dividir o partido em dois grupos: o de Dilma e o do ex-presidente Lula. Para o mestre em Ação Política Márcio Coimbra, a falha de comunicação, ao lado da crise política e da crise econômica, foi um fator que levou ao afastamento de Dilma.

“O governo não sabia se comunicar. Quando o João Santana [marqueteiro do PT] foi preso, aí sim desabou o castelo de cartas porque ela não tinha a quem recorrer. Porque ele era o grande mago que cuidava da comunicação e da estratégia”, diz Coimbra. Santana foi preso em fevereiro deste ano na operação Lava Jato e era o braço direito da comunicação da petista.

O professor de jornalismo da PUCPR Miguel Manassés lembra que o relacionamento entre Dilma e a imprensa era melhor no primeiro mandato da petista. “Se a gente fizer uma análise histórica recente, o caldo entre a mídia e Dilma azedou depois da reeleição. Até a reeleição, ela tinha um relacionamento de regular para bom com a mídia”, diz.

Para Coimbra, Lula soube usar melhor a comunicação a seu favor. “O pessoal que serviu o presidente Lula era muito mais profissional do que a comunicação que serve a presidente Dilma”, explica. “O Lula, por conhecer a sua inabilidade em determinadas áreas e saber que ele conseguia fazer o mais importante, que era a ligação com o povo, delegava as demais áreas para especialistas”, completa.

Um dos fatores que explica o melhor uso da comunicação por Lula, segundo Coimbra, é a equipe escolhida. “A comunicação dele era feita por pessoas que, além de petistas, eram lulistas, que não tinham tanta identificação com a presidente Dilma”, diz. Por esse motivo, diz ele, há segmentos do PT que acreditam que o discurso do golpe pode ser melhor fixado pela população caso a presidente Dilma não retome o governo.

“A banda lulista não está interessada que a Dilma volte daqui seis meses, mas sim que a Dilma caia e o PMDB fique com o ônus de arrumar a casa nos próximos dois anos e meio para eles terem um discurso para voltar. Isso tudo reforça politicamente a estratégia para o PT voltar [à Presidência] em 2018”, explica Coimbra.