Não precisa pegar mais de uma semana de tweets de campanha para concluir que a manutenção de Carlos Marun no Conselho de Itaipu Binacional está diametralmente contra o que foi proposto pelo governo. A campanha não foi de propostas e metas, mas de valores. Toma-lá-dá-cá estava fora do tabuleiro, conforme dito à exaustão.
O moralismo tem um problema sério: geralmente quem aponta o dedo para as falhas dos outros não se preocupa com o próprio comportamento. E cá estamos, em menos de uma semana, com uma ameaça de revogação, uma volta atrás e uma possível mentira vinda da Presidência da República, o que seria inadmissível caso tivéssemos realmente valores morais.
Podemos discutir os acordos políticos por trás da manutenção de Marun, mas a mentira não. E temos agora uma história toda mal explicada. O que foi publicado, sem gravação, pelo Estadão e depois repercutido pelos “blogueiros sujos” do atual governo é que a nomeação feita por Michel Temer não pode ser desfeita porque trata-se de ato jurídico perfeito. O ministro Onyx Lorenzoni deu, em público, outra versão: a de que o governo respeitaria a decisão porque é um auxiliar de confiança do governo anterior.
Embora a fala do chefe da Casa Civil possa dar margem a críticas, já que a campanha foi toda feita com base no fim dos conchavos, é sincera e transparente, como devem ser as falas de um servidor público. A se confirmar a versão do “ato jurídico perfeito”, trata-se de uma tentativa maliciosa de escamotear a verdade.
Realmente as nomeações para cargos públicos, se não são feitas com base em erro formal, são atos jurídicos perfeitos. E isso significa que Jair Bolsonaro não pode revogar a nomeação feita por Michel Temer. Porém, a substituição pode ser feita se permitida. No caso, é textualmente permitida no anexo A do Tratado de Itaipu, que constituiu a binacional.
Obviamente tanto Marun quanto Temer – que é um dos mais renomados constitucionalistas do Brasil – sabem que é característica do cargo escolhido a livre nomeação a qualquer tempo. Assim são os cargos que não têm função de investigar ou pedir prestação de contas ao governo, mas de defender seus interesses. É ilegal interromper mandatos, por exemplo, em agências como Anvisa, Anac, Anatel, que fiscalizam as relações entre empresas e governo tendo em vista o interesse do povo. Em órgãos como os Ministérios, por exemplo, que executam ações de governo, cargo de confiança é passível de destituição a qualquer tempo.
Assim que assumiu, o vice-presidente, também conhecedor da lei, defendeu a exoneração. Carlos Marun fez pouco caso do General Mourão via imprensa, tão certo que está de sua estabilidade. Se os políticos cruzam a linha para descumprir aquilo que está no papel, determinados acordos desse universo têm mais força que lei. É devido a essa segurança que o ex-deputado renunciou ao cargo para assumir Itaipu.
Surpreende que os apoiadores de Bolsonaro, tão eficientes em desmentir boatos contra o presidente da República, tenham espalhado a mentira sem checar se é ou não possível exonerar um representante do Conselho de Itaipu. Temos aí uma nova geração de Dilmas Boladas?
O presidente da República tem agora 3 saídas:
– Não retoma o assunto e joga a história do “ato jurídico perfeito” no colo da imprensa, dizendo que foi equivocado.
– Explica claramente por que decidiu manter Marun mesmo podendo exonerá-lo e apesar dos protestos do vice-presidente da República.
– Exonera Carlos Marun.
A decisão vai depender dos compromissos que foram firmados, não da promessa de um “Novo Brasil” feita ao povo. Ganha destaque a importância do núcleo duro de Temer, que conta também com o sogro de Rodrigo Maia, apoiado pelo PSL para a presidência da Câmara. Fazer campanha, definitivamente, é muito diferente de governar.
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