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Foto: Nelson Almeida/AFP
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Em 2005, Juvenal Gomes do Nascimento, 18 anos, foi preso pela polícia na cidade de Pedra, Pernambuco. Seu crime? Após uma tentativa frustrada de furtar uma moto junto com dois comparsas num sítio pertencente a um casal de idosos, para não perder a viagem, Juvenal passou a mão num galo e numa galinha. Pelo seu ato, em 2006 foi condenado a cinco anos de prisão em regime semiaberto por furto qualificado. Os dois animais custariam, dependendo da raça, entre R$ 50 e R$ 100. O galo foi devolvido, mas a galinha morreu.

Para piorar a sua situação, o defensor público não recorreu da sentença e Juvenal foi enviado para o local errado por um erro do Judiciário. Em vez de ser transferido para a Penitenciária de Canhotinho, lugar sem grades e com atividades agrícolas para condenados com seu perfil, foi enviado para o Presídio de Arcoverde, local com capacidade para 150 detentos, mas que abrigava 500.

Também em 2005, Angélica Aparecida Souza, 19 anos, foi presa na cidade de São Paulo. Seu crime? Furtou um pote de 200 gramas de manteiga de um mercado. O produto custava R$ 3,10 na época.

Para piorar a sua situação, foram negados pelo Judiciário os quatro pedidos de liberdade provisória feito por seu advogado. Depois de mais de quatro meses presa, o Superior Tribunal de Justiça concedeu liminar e ordenou a soltura de Angélica. Mais tarde, porém, ela foi condenada a quatro anos de prisão em regime semiaberto. Pelo furto de um pote de manteiga, a empregada doméstica ficou 128 dias atrás das grades.

Em 2011, um homem foi preso em flagrante pela polícia na cidade de Registro, no interior de São Paulo. Seu crime? Furtou uma lata de leite condensado e três pacotes de bolacha (ou biscoito) num supermercado local. Os produtos, que foram devolvidos quando da prisão, custavam na época R$ 7,48.

Para piorar a sua situação, porque não tinha R$ 600 para pagar a fiança e responder ao processo em liberdade, o homem ficou detido. Em seguida, o juiz negou o pedido de liberdade feito pela defensoria porque o acusado não tinha comprovante de residência. O problema é que o Judiciário não encaminhou a decisão ao defensor, que só a descobriu cinco meses depois, ao preparar um recurso para o Tribunal de Justiça de São Paulo, que determinou a revogação da prisão. Pelo furto de uma lata de leite condensado e três pacotes de bolacha (ou biscoito), ficou sete meses atrás da grades.

Em 2018, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não foi preso. E não foi preso mesmo depois de ter sido condenado pela segunda vez por instâncias judiciais diferentes. Seus crimes? Corrupção passiva e lavagem de dinheiro ao se valer de estratagemas de ocultação e dissimulação para esconder que era o titular formal do tríplex do Guarujá, que fora comprado (e reformado) pelo Grupo OAS e dado ao ex-presidente como vantagem indevida pelos benefícios recebidos pela empreiteira durante o governo do petista, segundo decisão do juiz Sergio Moro confirmada pelos desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região na semana passada. Somando o valor do imóvel e a reforma bancada pela OAS, o ex-presidente foi beneficiado com R$ 3.738.738.

Lula foi condenado a 12 anos e um mês de prisão pelo TRF4, mas continua solto graças à lei e ao trabalho feito desde o início por um batalhão de advogados renomados. Desse privilégio de contratar os melhores advogados, só gente rica como Lula pode usufruir, ao contrário de gente pobre como Juvenal, Angélica e tantos outros.

Não coloco os exemplos do Juvenal, da Angélica, do Lula numa perspectiva comparada para relativizar o furto de galinha ou de manteiga frente a esquemas de corrupção gigantescos como o do PT. Ou mesmo para afirmar que quem cometeu crimes menos graves não deve ser punido. Pelo contrário: cada um deve ser responsabilizado pelos seus atos.

Trouxe esses casos para que tenhamos em mente a desproporção entre atos criminosos distintos e suas respectivas condenações e o cumprimento das punições, para mostrar como criminosos condenados que têm dinheiro e influência, como é o caso de Lula e de tantos outros, estão soltos porque têm condições financeiras de ter os melhores advogados.

Lula é um privilegiado há décadas. Faz parte de uma elite econômica que ele só insulta por método, por estratégia, para não ser tratado como membro de um grupo cujos ataques desferidos por ele permitiram-no construir a sua própria imagem de homem do povo que luta contra as elites do mal. Lula faz parte do 1% mais rico da população brasileira e, como tal, pode ser condenado como foi e continuar impune como continua. E, solto, ainda cospe nas instituições e nas nossas caras ao afirmar em discurso, um dia depois de ser condenado, que não tinha “nenhuma razão para respeitar a decisão” do TRF4.

Lula conta com a possibilidade – agora remota, é verdade – não apenas de não ser preso este ano se for beneficiado por recursos no Superior Tribunal de Justiça ou no Supremo Tribunal Federal, como de ser candidato à Presidência pelo Partido dos Trabalhadores. Se isso acontecer, o PT, outrora vendido para os tolos e ingênuos como o partido da ética, terá o político mais adequado para representá-lo na eleição de 2018: um partido acusado de ser corrupto terá um candidato condenado por corrupção.

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