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Bolsonaro adota tom social
Bolsonaro no Nordeste, reduto lulista a ser conquistado.| Foto: Alan Santos/Presidência da República

O efeito positivo do auxílio emergencial de R$ 600 na popularidade do presidente Jair Bolsonaro – segundo mostra pesquisa Datafolha –, principalmente entre os mais pobres e moradores da região Nordeste, era tudo o que as forças desenvolvimentistas do governo esperavam para impulsionar medidas de mais distribuição de recursos às camadas de menor renda da população.

Mas a melhora na avaliação de Bolsonaro não é atribuída somente à ajuda financeira durante a pandemia. O tom adotado ultimamente, sem declarações incendiárias e próximo ao Centrão, revelou um novo caminho ao presidente, mais distantes das alas radicais de apoiadores, especialmente grupos de ataque ao Supremo Tribunal Federal (STF), ao Congresso e defensores de intervenção militar.

De olho na reeleição em 2022, Bolsonaro elegeu os redutos tradicionalmente lulistas para avançar. O bolsarismo tem como estratégia arrebanhar simpatizantes do lulismo – que já vinha perdendo suporte –, tornando Bolsonaro imbatível nas próximas eleições presidenciais.

Na área econômica o motor da versão “Bolsonaro social” chama-se Renda Brasil. A proposta do novo programa social tem previsão de ser enviada ao Congresso no início do próximo ano. O que está em estudo é como aumentar o valor do benefício repassado às famílias de baixa renda por meio do Bolsa Família e elevar o número de beneficiários. Há cálculos que preveem acrescentar mais 6 milhões de famílias às 14,2 milhões que recebem o Bolsa Família.

Bolsonaro co  Temer
Bolsonaro com Temer no envio de ajuda ao Líbano: 'nova versão' do presidente usa máscara de proteção à covid-19.

Atualmente, o benefício médio pago a cada família é de R$ 189,21. Dentro do governo chegou-se a cogitar a elevação do valor para cerca de R$ 250, em média. Também está na mesa estudos para postergar o auxílio emergencial até o final do ano, com valor menor que os R$ 600 concedidos nos últimos meses.

Considerando a base dos que receberam o auxílio emergencial, o número de pessoas a serem atendidas pelo novo programa social do governo Bolsonaro aumentaria exponencialmente. Seriam 38 milhões de beneficiários a mais, segundo projeções não oficiais.

A guinada de Bolsonaro para o social trouxe apreensão para representantes de setores econômicos preocupados com a ‘gastança’. Pressionado, na quarta-feira (12) Bolsonaro reforçou que tem compromisso com o teto de gastos – lei que impede que as despesas cresçam em ritmo superior à inflação. A declaração foi feita ao lado dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).

“Respeitamos o teto de gastos, queremos a responsabilidade fiscal e o Brasil tem como realmente ser um daqueles países que melhor reagirá à crise.”

Jair Bolsonaro, presidente da República, em pronunciamento na quarta-feira (12).

Mas a firmeza dos propósitos do presidente foi colocada em dúvida um dia depois. Durante transmissão nas redes sociais, na quinta-feira (13), Bolsonaro abriu exceções. Disse que o Brasil pode furar o teto de gastos públicos em casos emergenciais, como no combate à pandemia do novo coronavírus e em outras obras. "A ideia de furar teto existe, o pessoal debate. Qual é o problema? Na pandemia, temos a PEC de Guerra (emenda constitucional que viabilizou gastos extraordinários). 'Presidente, nós já furamos o teto em mais ou menos R$ 700 bilhões, dá para furar mais R$ 20 bilhões?' Qual a justificativa? Se for para (combate ao) vírus, não tem problema nenhum", afirmou.

A equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, busca saídas para resolver a equação ‘teto de gastos versus aumento dos gastos’. Uma saída seria atrelar o Renda Brasil à proposta para antecipar medidas de ajuste envolvendo outros programas.

Pela proposta em discussão nos gabinetes governamentais, entrariam na negociação do Renda Brasil programas considerados ineficientes pelo governo (como o abono salarial) e privilégios (como os existentes nos salários do funcionalismo), os quais poderiam ser cortados para garantir mais verba a ser destinada ao novo programa assistencial de baixa renda.

Entram também na negociação a proposta apelidada de "DDD", sigla que se refere a desvincular, desindexar, desobrigar.

A desindexação possibilitaria romper com o reajuste automático de mais de dois terços dos gastos públicos. Com a desvinculação, a equipe econômica quer retirar as normas que atrelam amarras a maior parte das receitas do governo federal a determinados gastos – por exemplo, saúde, educação, meio ambiente, segurança e infraestrutura. Sem as amarras, o governo teria margem maior para usar o dinheiro público. Quanto ao ‘D’ de desobrigar, a medida em estudo atingiria parte das despesas obrigatórias, em que o governo não tem a opção de deixar de pagar.

Ministros negam que o Renda Brasil mire a reeleição. “O presidente não precisou desses votos para se eleger em 2018, mas sempre se preocupou com os mais vulneráveis e brasileiros invisíveis que não apareciam em nenhum cadastro do governo”, disse o ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, em entrevista ao portal Bloomberg. Segundo o ministro, o governo encontrou 26 milhões de pessoas em situação de vulnerabilidade social durante a pandemia e que serão atendidas pelo novo programa.

Na questão política, o ‘Bolsonaro social’ tem várias faces. Uma delas usa máscara de proteção contra a covid-19 em aparecimento público, o que não era comum até bem pouco tempo. Outra face abre trégua à ‘guerra’ com o Poder Judiciário e interrompe as declarações explosivas à imprensa, diante de apoiadores, na porta do Palácio da Alvorada.

Entra também no jogo político o distanciamento de apoiadores mais radicais, a diminuição da influência da corrente ideológica do governo e a busca de moderação e acordos com parlamentares do chamado Centrão. Sinal claro dessa mudança veio com a troca da liderança do governo na Câmara. O deputado Major Vitor Hugo (PSL-GO) foi substituído pelo ex-ministro de Michel Temer, o deputado Ricardo Barros (PP-PR), nome expoente do Centrão.

A entrega da liderança ao Centrão foi precedida da distribuição de vários cargos no governo a integrantes de legendas como PSD, PP, PL e Republicanos. Um dos cargos mais importantes foi para o deputado Fábio Faria (PSD-RN), nomeado ministro das Comunicações. Faria é casado com a apresentadora Patrícia Abravanel, filha de Silvio Santos, dono da rede de televisão SBT.

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