Quem pegava ônibus em Curitiba nos anos 80 e 90 lembra bem do significado de um vale transporte. A fichinha redonda de metal era uma unidade monetária paralela usada para comprar de tudo. Também pudera: entre 1989 e 1994, o Brasil teve quatro moedas oficiais diferentes (cruzado novo, cruzeiro, cruzeiro novo e real).
O dinheiro mudava de nome, mas o VT era o VT. Prefeito entre 1985 e 1988, Roberto Requião percebeu esse valor e cravou seu nome nas passagens. Traduzindo para os dias de hoje, seria como se Dilma decidisse colocar sua foto nas notas de cinco reais.
Politicamente, esse sempre foi um ótimo negócio. O paranaense Affonso Camargo conseguiu até concorrer a presidente em cima da imagem de pai do vale transporte, em 1989.
Lá se vão décadas, a relação das pessoas com o VT mudou após o fim da hiperinflação e a chegada dos cartões recarregáveis, mas continua intensa. A explicação é simples. A maioria dos trabalhadores brasileiros segue usando transporte público diariamente – por consequência, o gasto com passagens talvez seja o hábito mais comum do seu cotidiano.
E quer ver alguém nervoso? Quebre a rotina dele. Ou pior: torne-a mais cara.
Pode até haver incertezas sobre a organicidade das manifestações que provocaram os distúrbios em São Paulo na semana passada contra o aumento da tarifa. Tem gente brincando de primavera árabe, mas o ato de protestar (sem vandalismo) e a motivação básica do movimento são legítimos, ao contrário da truculenta repressão policial.
Na mesma quarta-feira em que a violência no centro paulistano começou a descambar de vez, o governador Beto Richa (PSDB) anunciou a redução de R$ 0,10 nas tarifas das linhas de ônibus da região metropolitana de Curitiba. Durante o evento, frisou que o barateamento acontece no mesmo momento da confusão nas maiores cidades do país. Cutucou, é claro, o prefeito Gustavo Fruet (PDT), que tem declarado que não vai reduzir o preço na capital paranaense.
Richa é um especialista no assunto. Nas vésperas da eleição municipal de 2004, ele era vice-prefeito e despontou como candidato à sucessão ao baixar o preço da passagem durante uma viagem do então prefeito Cassio Taniguchi. Depois de eleito, liderou uma campanha nacional pela redução, que não foi para frente.
Já governador, criou um subsídio estadual temporário negociado com o aliado político Luciano Ducci (PSB) no ano passado. Retirou a ajuda neste ano, após Fruet vencer Ducci nas eleições de 2012. A compensação veio com a isenção de impostos sobre o diesel, que também beneficiou outras cidades do interior do estado.
O contraponto é que, ao mesmo tempo em que ajuda a baratear as tarifas municipais, o governo do estado tem o caixa cada vez mais debilitado. Conforme revelou o colunista Celso Nascimento há oito dias, os Correios chegaram a suspender o envio de correspondências da Polícia Militar por causa de uma dívida de R$ 60 mil. O gasto geral com a folha de pagamento do estado também é cada vez mais preocupante.
Moral da história: é óbvio que o dinheiro para financiar o transporte precisa sair de algum lugar.
Ainda assim, há quem calcule que vale a pena lutar pela imagem de “pai” da tarifa barata. Se colar, colou.
Afinal, eles não vão trabalhar de ônibus, mas de carro oficial, com motorista e ar-condicionado.
A propósito, também é o trabalhador comum que paga esse transporte. Sem vale.
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