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O deputado federal Cezinha de Madureira é presidente da Frente Parlamentar Evangélica.
O deputado federal Cezinha de Madureira é presidente da Frente Parlamentar Evangélica.| Foto:

As frentes parlamentares são associações que congregam pelo menos um terço dos membros do Poder Legislativo, com representação pluripartidária, para debater sobre determinado tema de interesse da sociedade. São diversas as frentes parlamentares em funcionamento no Congresso Nacional, entre elas a Frente Parlamentar Evangélica.

A FPE guarda especial “vínculo” com nossa coluna. Se nossos textos são, como chamamos, crônicas do Estado laico brasileiro, a frente parlamentar, formada por evangélicos e simpatizantes, transita exatamente entre as duas ordens existentes em uma sociedade laica: temporal/política e espiritual.

Laicidade implica em separação das ordens temporal e espiritual, este é o primeiro requisito de qualquer sistema de laicidade do mundo. Mas existem outros requisitos além deste? Depende de qual laicidade estamos falando. Os sistemas de relação entre o Estado e a Religião ou as igrejas é dinâmico e variam de acordo com a cultura e a acomodação do fenômeno religioso no espaço público das crenças, no seio da sociedade política de um país.

No Brasil, além da separação, a laicidade brasileira conjuga outros princípios, entre elas o da colaboração. Dando um spoiler de nossa nova obra, A laicidade colaborativa brasileira: da aurora da civilização à Constituição brasileira de 1988, a colaboração implica na necessidade de as ordens, mesmo separadas, relacionarem-se entre si, para juntas buscarem o bem comum. O homem é dotado por Deus de direitos inalienáveis, entre eles a busca da felicidade, e esta busca se dá, para a maioria esmagadora dos brasileiros, em estradas que trilham seus caminhos em direção a cidades diferentes: a primeira, dos homens; a segunda, de Deus. Não existe aqui uma colisão, outrossim uma coalizão de objetivos. O endereço da felicidade é alcançado, pela maioria esmagadora dos brasileiros, por meio da coalizão destas duas estradas. É a “coalizão” dos poderes temporal e religioso, na busca do bem comum, que caracteriza a laicidade brasileira.

A colaboração implica na necessidade de Estado e Religião, mesmo separados, relacionarem-se entre si, para juntas buscarem o bem comum

E, para mais de 50 milhões de brasileiros, o mapa para encontrar a cidade de Deus é a Bíblia Sagrada, lida com os óculos da Reforma protestante e dos Evangelhos de Cristo. Entretanto, esta imensa parcela da população brasileira também é cidadã deste mundo. Em outras palavras, além de transitar na estrada que os levará para a Nova Jerusalém, eles possuem um CPF e um título de eleitor, e buscam a felicidade também nesta cidade chamada Brasil.

A partir destas verdades, qual a importância e o papel de uma associação de evangélicos detentores de mandato eletivo, dentro da ordem política estabelecida? Tal associação, denominada de Frente Parlamentar Evangélica, não interfere na ordem espiritual? Ou seria o contrário, a ordem espiritual interferindo na política? Vejamos o que o recém-eleito presidente da FPE, o deputado federal e pastor Cezinha de Madureira, tem a nos dizer.

Deputado Pastor Cezinha, parabéns por sua eleição para a presidência da FPE. Antes mesmo de entrarmos no tema da laicidade, explique ao leitor o papel da Frente na Câmara e perante a sociedade brasileira.

Na Câmara dos Deputados temos uma grande heterogeneidade representativa, assim como na sociedade brasileira. Desta forma, os deputados, além da organização partidária, também se agremiam em frentes e grupos parlamentares para defesa e trabalhos em conjunto para fins específicos e suprapartidários. Esses grupos são importantes, pois possibilitam agrupamento de deputados de diferentes estados e partidos. A Frente Parlamentar Evangélica do Congresso Nacional é um destes grupos e um dos mais importantes do parlamento brasileiro. Hoje temos mais de 150 deputados e senadores das mais diversas denominações religiosas, mas todos com intenções em comum, como a proteção da igreja, da família, dos valores cristãos e morais e a vontade fazer do nosso país um grande nação.

Em uma simples leitura da Constituição brasileira percebemos que a relação Estado e Igreja no Brasil é diferente de sistemas como o da França. Aqui, o exercício da fé é garantido e incentivado em todos os espaços; entretanto, vozes dissonantes protestam dizendo que a simples existência de uma frente parlamentar de evangélicos ofende a laicidade brasileira. Qual sua opinião sobre este fato? A atuação da FPE pode ser legitimada no sistema de laicidade existente no Brasil?

A atuação da FPE possui total legitimidade no Brasil. O Brasil, de fato, é um Estado formalmente laico e uma sociedade plural, mas que dá grande valor às questões religiosas. Conforme dados do IBGE, a maioria esmagadora da população brasileira professa alguma fé, e desta maioria temos ainda a população evangélica, que é a que mais cresce no país. Não podemos confundir Estado laico com um Estado que abomina a religião.

“Temos tanta legitimidade de ocupar os espaços públicos quanto quem defende o meio ambiente ou a produção industrial.”

Cezinha de Madureira, pastor evangélico, deputado federal e presidente da Frente Parlamentar Evangélica

Defendemos os valores que são importantes para nós, estão intimamente ligados a nossa fé, mas são também independentes dela, fazem parte de cada cristão como pessoa. Foi esta população que escolheu democraticamente, nas ultimas eleições, um presidente alinhado com estes valores. Temos tanta legitimidade de ocupar os espaços públicos quanto quem defende o meio ambiente ou a produção industrial. Fazemos parte da população que nos escolheu como representantes diretos.

Entendo que a laicidade do nosso Estado, prevista na Constituição, serve para proteger nossa democracia. E a democracia é isso, conviver com as diferenças em prol da construção de uma sociedade melhor. Todos os integrantes da FPE sabem disso e assim pautam suas ações.

As pautas de ordem moral, também chamadas de “pauta de costumes”, como o impedimento da descriminalização do aborto, das drogas e o combate à ideologia de gênero, não caracterizam interferência da religião nas decisões do parlamento?

Não, pelo contrário! Caracterizam a manifestação legítima da uma sociedade que democraticamente elegeu seus representantes!

A partir do pressuposto de que o Estado laico brasileiro, a exemplo do português e do espanhol, é colaborativo com a Religião, existe expectativa de o parlamento aprovar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 99/11, que concede a entidades religiosas de âmbito nacional o poder de propor Ação Direta de Inconstitucionalidade e Ação Declaratória de Constitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF)?

Todas as pautas levadas a votação pela Câmara dos Deputados e Senado Federal são decididas com antecedência pelo que chamamos de Colégio de Líderes. Se os líderes forem provocados e assim entenderem, este pode ser um item deliberado. Entretanto, no momento atual, com toda a crise da pandemia, temos grandes temas para discussão e apreciação tais como a pauta econômica, de desenvolvimento, a reforma tributária, a reforma administrativa e o enfrentamento direto à Covid-19. Todo o parlamento tem consciência de suas obrigações e responsabilidades que temos. O importante neste momento é darmos bom rumo ao país.

“A laicidade do nosso Estado, prevista na Constituição, serve para proteger nossa democracia. E a democracia é isso, conviver com as diferenças em prol da construção de uma sociedade melhor.”

Cezinha de Madureira

Quais os maiores desafios da FPE, nestes tempos de pandemia, em que organizações religiosas são fechadas no Brasil inteiro, muitas vezes de maneira desproporcional e sem qualquer adequação com a realidade local?

De fato este é o maior problema, a falta de proporcionalidade e adequação com as realidades locais. Nós temos um decreto presidencial que coloca as atividades religiosas como essenciais, tal qual os regramentos de vários estados e municípios. A igreja sempre foi importante e decisiva em momentos difíceis. Sempre nas crises, nas guerras, nos tempos ruins a igreja foi o braço forte, manteve as pessoas dispostas, curou a aflição e trouxe a paz.

No momento atual as igrejas têm tido um papel importantíssimo, muitas vezes não divulgado. Na crise do Amazonas, por exemplo, houve um grande movimento de envio de oxigênio e recursos para estado. A minha própria igreja, que fica em São Paulo, se mobilizou e ajudou neste sentido.

“Não é fechando igreja enquanto não se fiscaliza aglomerações em festas que se combate a pandemia. Igrejas não são locais de contaminação, se observadas as regras de segurança.”

Cezinha de Madureira

É importante destacar que nenhum pastor ou sacerdote quer abrir igreja para disseminar doença. Pelo contrário, queremos abrir para curar doenças. Muitos estão, neste momento, doentes, doentes da alma. E somente Deus age para esta cura. Não é fechando igreja enquanto não se fiscaliza aglomerações em festas que se combate a pandemia. É preciso orientação, proporcionalidade e segurança jurídica. Igrejas não são locais de contaminação, se observadas as regras de segurança. Neste momento precisamos de união e da presença de Deus em nossas vidas.

Quero dizer ao nosso leitor que creia. Creia que dias melhores virão. Tenham esperança no amanhã. Deus é contigo e por nós. Que Deus abençoe e proteja cada leitor!

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
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