Como subjugar um povo e este ainda por cima agradecê-lo por isso? É semelhante ao caso da jovem que diz: “Meu padrasto é um monstro, mas ele paga minha faculdade”. Ou ao caso do comerciante dominado pela máfia: “Eu tenho que pagá-los todo mês, mas eles me protegem”. Napoleão também agia assim. Invadia os países vizinhos, mas anunciava que havia chegado para ajudá-los a terem seus direitos, por meio do seu Código Civil. Era como se magicamente uma dominação se transformasse numa libertação. A magia da propaganda.
Napoleão seguia uma estratégia muito semelhante àquela praticada pelo Império Romano. A cada povo que conquistavam, diziam: “Trazemos a Pax Romana. Agora vocês são nossos protegidos. Basta pagarem impostos a Roma que garantimos sua segurança”. E você achando que os sicilianos teriam sido os primeiros a ter essa ideia…
Podemos, talvez, dizer que foram os romanos que criaram o combo Bolsa Família + Futebol como ferramenta de controle perpétuo.
Para os povos conquistados, o Império usava como propaganda a ideia de paz, como argumento para facilitar a conquista. Entretanto, para manter a dominação ao longo do tempo, a estratégia principal de controle envolvia o famoso Panem et Circenses (Pão e Circo), ou seja, a distribuição de pão (trigo) e a promoção de eventos no circo (espetáculos). Podemos, talvez, dizer que foram os romanos que criaram o combo Bolsa Família + Futebol como ferramenta de controle perpétuo.
A ideia do circus era muito importante na sociedade romana. O termo em latim (que significa “anel” ou “círculo”) se refere às grandes estruturas de eventos, de formato arredondado e teto descoberto, usadas para corridas e duelos de gladiadores. Ainda hoje é possível visitar não apenas o Coliseu (de arquitetura muito ao estádio de futebol moderno) e o Circus Maximus, dedicado às corridas de bigas e aos principais festivais religiosos, sendo considerada a maior arena de entretenimento de Roma. Ali, o povo esquecia-se de suas mazelas e agradecia aos aristocratas pela diversão a eles oferecida.
Diversão é a palavra-chave aqui. O termo procede do latim divertere (“mudar de direção”). Guarda muita semelhança com a ideia de distração, em latim, fruto da união de dis (“para longe” + trahere (“conduzir”). Ou seja, o melhor caminho para afastar as pessoas daquilo que realmente é importante e levá-las a amenidades e temas supérfluos e a distração trazida por meio da diversão. Daí o termo “diversionismo”, que no meio militar é usado para se referir a uma estratégia para fazer o inimigo desviar o foco para algo menos importante.
Não podemos negar que a Copa do Mundo, funcionando como o Circus Maximus contemporâneo, exerce muito bem esse papel. Principalmente para os vitoriosos. Não podemos esquecer que poucos dias antes da vitória dos argentinos acontecia algo inédito em Buenos Aires: a primeira vez que uma vice-presidente em exercício foi julgada e sentenciada. Cristina Kirchner foi condenada a seis anos de prisão por administração fraudulenta. Seria motivo de grande comoção nacional, mas a Copa funcionou muito bem para “distrair” o povo.
Ainda cabem recursos, o que pode fazer o processo ainda se afastar por anos. Além disso, na condição de vice-presidente, ela tem imunidade até o fim do atual mandato, que se encerra no dia 10 de dezembro de 2023. Mas o período de proteção pode ainda ser alongado uma vez que, como o processo ainda não transitou em julgado, ela poderá concorrer a um novo cargo no pleito do ano que vem.
Mais uma vez, o circo cumpriu seu papel: divertiu, distraiu e facilitou a vida da aristocracia, que segue tranquila em seu plano de perpetuação no poder.
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