A Petrobras e as teorias da conspiração| Foto: Arquivo/Gazeta do Povo
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Existe uma guerra contra a Petrobras em curso. A empresa de capital misto, cujo maior acionista é a União, tornou-se o principal bode expiatório da inflação que assola os brasileiros neste ano de eleição, apesar de a crise nos preços ser um fenômeno mundial. Até na Alemanha, por exemplo, idosos estão recorrendo à xepa de produtos vencidos de supermercados porque suas aposentadorias não dão bastam para comprar produtos básicos, com itens como a tradicional salsicha dobrando de preço. Isso não significa que se deva ficar de braços cruzados. Cabe a quem governa o país fazer algo a respeito.

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O governo federal escolheu a Petrobras como a grande inimiga dos bolsos dos brasileiros e reclama que não consegue mudar sua política de preços. Depois do último reajuste, o presidente Jair Bolsonaro disse que vai apoiar a criação de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para investigar a direção da empresa, que segundo ele cometeu "uma traição ao povo brasileiro" ao elevar o preço do diesel em quase 15% e o da gasolina em mais de 5%.

A oposição, leia-se o PT, esfregou as mãos. Nada como uma CPI com ares de retaliação a executivos indicados pelo presidente da República, como o são os da Petrobras, para fazer o tiro sair pela culatra e atingir o próprio governo federal.

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A indignação de Bolsonaro foi ecoada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, que avisou que "vai para o pau" e acusou o CEO da petrolífera, José Mauro Ferreira Coelho, de estar "sacaneando", por não ter ainda renunciado ao cargo.

A guerra contra a Petrobras fez circular uma série de teorias da conspiração a respeito das motivações da empresa e de Bolsonaro. Eis algumas delas:

  • O objetivo dos reajustes é atingir o governo. Essa teoria foi aventada pelo próprio presidente Jair Bolsonaro na véspera do anúncio da nova alta nos preços. "Eu só posso entender que um reajuste da Petrobras agora seria interesse político para atingir o governo federal", afirmou em sua live de quinta-feira (16). Como é próprio do conspiracionismo, ele não deu nome aos bois. Quem, dentro da empresa, teria interesse em prejudicar o governo e por quê? O que justifica um conluio do comando da Petrobras contra a campanha de reeleição de Bolsonaro (que sofre enormemente com a inflação) se a maioria absoluta dos integrantes do conselho da empresa, incluindo o CEO, foram indicados por ele? Obviamente, não foram apresentadas respostas para nenhuma dessas perguntas. Boas teorias conspiratórias, para ganhar asas, precisam ser baseadas em suspeitas vagas, difíceis de serem comprovadas — ou refutadas.
  • A guerra contra a Petrobras é um estratégia eleitoral. Essa teoria circula entre opositores de Bolsonaro. A lógica seria a seguinte. O governo poderia perfeitamente exigir de seus indicados na Petrobras uma mudança na política de preços ou, melhor ainda, já poderia ter nomeado para a presidência da companhia alguém disposto a fazê-lo (afinal, já estamos indo para o terceiro CEO indicado por Bolsonaro desde que este assumiu o poder). Não era surpresa para ninguém que os dois últimos escolhidos por Bolsonaro para a Petrobras eram favoráveis à política do PPI (Preço de Paridade Internacional), que acompanha as oscilações do barril de petróleo no mercado externo. Pois bem, segundo essa teoria da conspiração, Bolsonaro não fez nada disso porque não quis. Prefere fingir que a Petrobras faz oposição ao governo para ter quem culpar pela alta da inflação. E para sustentar, durante a campanha, o discurso populista de que enfrenta forças ocultas que o impedem de governar. Tem mais: segundo essa teoria, a imprensa contribui para essa estratégia porque está fechada com o mercado no argumento de que, de fato, a atual política de preços não pode ser mudada.
  • Tudo não passa de uma estratégia para privatizar a Petrobras. Partindo da premissa acima, de que o governo não segura os reajustes nos preços dos combustíveis porque não quer, essa teoria afirma que o discurso do governo em tom de guerra contra a Petrobras tem o propósito de preparar o terreno para acelerar a privatização da empresa, de preferência antes do fim do mandato de Bolsonaro. Afinal, em maio, tão logo assumiu o comando do Ministério de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, ex-braço direito de Paulo Guedes no Ministério da Economia, tratou de solicitar estudos para a "desestatização" da Petrobras, alegando a necessidade de atrair investimentos, mas dando a entender que a urgência estava atrelada à atual crise no preço dos combustíveis. Privatizar a Petrobras pode ser defensável por outros motivos, mas a medida não serviria para baratear a gasolina ou o diesel no curto ou médio prazo — muito menos nos moldes propostos pela equipe de Sachsida, que é o de capitalização, como foi feito com a Eletrobras. Ora, se a Petrobras tendo a União como maior acionista com poder de voto não prioriza o seu "papel social", como tem reclamado Bolsonaro, quem poderia acreditar que isso ocorreria estando o seu controle nas mãos de investidores privados? O que de fato poderia ajudar na questão dos preços é desfazer o caráter monopolista da Petrobras, que detém 75% da capacidade de refino e 93% da exploração de petróleo no país. A conspiração, portanto, seria a seguinte: Bolsonaro e a equipe econômica estariam fazendo jogo duplo; de um lado promovendo o caos no preço dos combustíveis para vender a farsa de que a privatização vai resolver o problema, e de outro botando para andar um projeto de privatização que atende aos interesses do mercado.
  • A guerra contra a Petrobras é jogo de cena para apresentar Bolsonaro como salvador da pátria. Por essa teoria, o presidente estaria fazendo uma jogada ensaiada com o José Mauro Coelho, que está há apenas dois meses no cargo de CEO da empresa, para convencer os brasileiros de que a pressão do governo deu certo e evitou novos reajustes nos preços. Bolsonaro já indicou um substituto a Coelho na presidência da Petrobras, mas que por questões burocráticas talvez só possa assumir em julho. A menos de 90 dias das eleições, ficará mais fácil adiar novas altas nos preços e Bolsonaro dirá que suas bravatas contra a cúpula da empresa e a determinação de trocar seu comando deram certo (o mais recente reajuste na gasolina ocorreu após um intervalo de 99 dias). Depois das eleições, os preços represados vão ser liberados e os valores nas bombas de abastecimento vão disparar. Mas daí o objetivo eleitoreiro já terá sido cumprido.

Teorias com essas nascem e ganham vida própria porque falta transparência por parte do governo e honestidade por parte da oposição para discutir a questão de maneira técnica. Há outras teorias conspiratórias, a favor ou contra o governo, umas mais e outras menos estapafúrdias, circulando por aí sobre a guerra contra a Petrobras, mas essas são as mais frequentes. Escolha a sua.