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voto útil
Ciro Gomes e Marina Silva durante debate da campanha presidencial de 2018: o PT não admite esquerda que não está sob seu controle| Foto: NELSON ALMEIDA/AFP

Durante a campanha presidencial de 2014, os estrategistas do PT destruíram a candidatura de Marina Silva (então no PSB, atualmente na Rede) com fake news. A difusão de mentiras contra a ex-ministra do Meio Ambiente transformada em adversária da presidente Dilma Rousseff ocorreu nas propagandas de TV e nas redes sociais com tons muito mais agressivos do que aqueles direcionados ao candidato do PSDB, Aécio Neves. Marina estava à frente do tucano nas pesquisas de intenção de voto, atrás apenas de Dilma. O PT queria afundar as chances de Marina, com o objetivo de levar Aécio para o segundo turno e, então, angariar o voto útil da esquerda para Dilma.

Deu certo. De maneira vil, Marina foi atacada em várias frentes. Uma propaganda do PT mostrava dublês de banqueiros rindo em uma cena. Em seguida, a comida nos pratos de uma família pobre ia sumindo enquanto um locutor dizia que o plano de Marina de conceder autonomia ao Banco Central daria mais poder aos banqueiros, que poderiam decidir até mesmo sobre emprego e salário dos trabalhadores.

Graças ao PT, Marina começou a despencar nas pesquisas e Aécio foi para o segundo turno, em que foi derrotado por Dilma. Interessava aos petistas, do ponto de vista eleitoral, polarizar a disputa no segundo turno.

Em 2022, a situação é diferente. A polarização entre esquerda e direita já está consolidada muito antes do segundo turno.

Com isso, a estratégia que vem sendo adotada tanto pelos lulistas como pelos bolsonaristas é a de incentivar o voto útil já no primeiro turno das eleições. O discurso dos dois lados é parecido: os eleitores devem "assumir um lado", sob o risco de o candidato que rejeitam (Lula ou Bolsonaro) ser eleito.

Não importam projetos de governo ou propostas para solucionar os problemas do país. Vende-se a ideia de que a única coisa que interessa é impedir que Bolsonaro se reeleja ou que Lula volte à presidência.

Com o objetivo de colocar essa campanha de rejeição e de negação de pé, a militância do PT saiu, na última semana, ao ataque contra qualquer pessoa que não deseja reeleger Bolsonaro, mas que também não se sente confortável em votar em Lula — seja por nunca ter gostado dele, seja por decepção e por não ter caído na esparrela de que ele é inocente nos casos que lhe renderam condenação por corrupção e lavagem de dinheiro.

O alvo preferencial dos petistas, obviamente, é Ciro Gomes (PDT), que está em terceiro lugar nas pesquisas, e seus eleitores. Atualmente, os esforços de cancelamentos e linchamentos digitais estão voltados mais contra o pedetista e seus apoiadores do que para o principal antagonista do lulismo, que é o bolsonarismo.

O PT quer o voto útil de toda a esquerda já no primeiro turno com o argumento de que, se houver segundo turno, Bolsonaro vai tentar dar um golpe ou vai se recusar a aceitar o resultado da contagem de votos. Mas a verdade é que, mais do que isso, o PT quer ser a força hegemônica da esquerda e não aceita qualquer projeto alternativo no seu campo ideológico.

No extremo oposto, o bolsonarismo quer o voto útil da direita e da centro-direita já no primeiro turno com o argumento de que só o presidente é capaz de impedir a volta de Lula e do PT ao poder.

Balela. A rejeição de Bolsonaro é a mais alta entre todos os pré-candidatos à presidência deste ano. Na pesquisa XP/Ipespe divulgada na sexta-feira (27), 59% dos entrevistados disseram que não pretendem votar em Bolsonaro "de jeito nenhum". Já no Datafolha o índice de rejeição a Bolsonaro foi de 54%.

Como alguém rechaçado por mais da metade do eleitorado pode querer vencer uma eleição majoritária? A não ser que um milagre aconteça na economia, os preços parem de aumentar e empregos comecem a ser criados aos montes, é muito difícil superar essa rejeição.

As campanhas de bolsonaristas e petistas pelo voto útil já no primeiro turno exploram o medo de uns de que Lula volte ao poder e de outros de que Bolsonaro permanece nele. Elas apelam para o irracional dos eleitores, uma vez que na matemática eleitoral não fazem sentido algum.

O voto de esquerdistas que não forem para Lula no primeiro turno irão para ele na segunda volta das eleições. E o voto útil em Bolsonaro no primeiro turno não faz sentido pois ele tem baixo potencial de derrotar Lula no segundo turno. Outros candidatos de centro-direita têm mais chances nesse sentido, se fizerem uma boa campanha para se tornarem mais conhecidos.

O voto útil precoce em Lula ou em Bolsonaro mata o propósito de eleições em dois turnos, que é o de deixar o critério da rejeição para o segundo turno e permitir que o primeiro seja focado no debate de diferentes projetos para o país.

Antecipar o voto útil é ruim para o país e péssimo para a democracia. E arrisca-se a não levar ao resultado pretendido.

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