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Dias Toffoli e Michel Temer conversam no Congresso na terça (6): presidente da República até pode vetar o reajuste salarial aos ministros do STF, mas, ao que parece, não existe esse risco. (Foto: Pedro França/Agência Senado)
Dias Toffoli e Michel Temer conversam no Congresso na terça (6): presidente da República até pode vetar o reajuste salarial aos ministros do STF, mas, ao que parece, não existe esse risco. (Foto: Pedro França/Agência Senado)| Foto:

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, nem se deu ao trabalho de disfarçar a barganha: deixou claro que a Corte só pautaria o julgamento do auxílio-moradia para juízes – questão que se arrasta há quatro anos no Tribunal – depois de garantir o aumento salarial.

O aumento foi garantido nesta quarta-feira (7), com a aprovação pelo Senado do reajuste de 16,38% aos ministros do Supremo, que havia sido aprovado pela Câmara dos Deputados ainda em 2016. O presidente Michel Temer pode vetar? Até pode, mas pelo jeito esse risco não existe. Foi tudo muito bem negociado nos últimos meses.

Ficamos, então, no aguardo do julgamento do auxílio-moradia. Toffoli ficou de conversar com o colega de Supremo Luiz Fux, “dono” do caso desde 2014, para encaminhar a questão.

É preciso deixar claro que o julgamento não vai, necessariamente, acabar com o auxílio-moradia. Os ministros do STF podem decidir por mantê-lo. Ou encontrar um meio-termo.

É preciso deixar claro, também, que a decisão que o Congresso tomou nesta quarta não favorece apenas os ministros da Corte. O salário deles – antes de R$ 33.763, agora de R$ 39.293 – serve de teto para todo o funcionalismo. Assim, as remunerações de milhares de juízes, promotores e servidores Brasil afora poderão subir na sequência. Quem tinha o salário limitado pelo chamado “abate-teto” poderá ganhar mais.

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O custo anual desse aumento para o contribuinte brasileiro, segundo nota técnica da Consultoria de Orçamentos do Senado, seria de pelo menos R$ 5,3 bilhões, dos quais R$ 1,7 bilhão na esfera federal, que fecha as contas no vermelho desde 2014. Serão R$ 771 milhões no Judiciário, R$ 259 milhões no Ministério Público da União, R$ 84 milhões no Tribunal de Contas da União e R$ 617 milhões para os demais servidores públicos federais.

Os governos estaduais, muitos em situação bem mais delicada que a União – até porque não podem emitir títulos de dívida nem imprimir dinheiro –, terão de suportar um gasto extra estimado em R$ 3,6 bilhões por ano.

Justiça seja feita ao presidente do Supremo. Pode-se concordar ou não com a moeda de troca, mas ele ao menos foi transparente. Já em setembro, logo que assumiu o cargo, ele avisou que pautaria o julgamento sobre o auxílio-moradia assim que a “revisão” salarial fosse aprovada. Articulou à luz do dia nos últimos meses. Nesta quarta, repetiu a promessa. Foi até citado em plenário pelo relator do projeto do reajuste, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), segundo o qual Toffoli se comprometeu a acabar com o auxílio.

Terminada a votação, o presidente do STF fez um agradecimento público ao Congresso, em nome de todo o Poder Judiciário, “principalmente porque agora poderemos enfrentar o problema do auxílio-moradia”.

Um problema de quase R$ 1 bilhão por ano

Ao chamar o auxílio-moradia de problema, aparentemente Toffoli concorda com a opinião de qualquer pessoa sensata: não faz sentido que juízes muito bem remunerados recebam tal benefício indiscriminadamente, mesmo que morem e eventualmente tenham vários imóveis na cidade onde trabalham.

Ainda mais um auxílio de R$ 4,3 mil, quase o dobro do rendimento médio dos brasileiros (R$ 2,2 mil por mês, segundo o IBGE) e mais de quatro vezes o salário mínimo (R$ 954). Cálculos do jornalista Lúcio Vaz, feitos com base em dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), indicam que o gasto com a benesse – que não é sujeita ao teto do funcionalismo – para cerca de 17 mil magistrados chega a R$ 920 milhões por ano.

E por que esperar o reajuste salarial para só então enfrentar um problema desse tamanho? Porque, para muitos magistrados, o pagamento do auxílio servia para compensar a defasagem salarial da categoria. Até Sergio Moro, futuro ministro da Justiça, disse isso com todas as letras.

Não é sempre que se vê os homens da lei justificando um erro com outro. Pelo menos não assim, abertamente.

Justiça seja feita, de novo, a Toffoli, e também a Moro: não foram eles que começaram. O pedido para a concessão indiscriminada de auxílio veio de associações que representam a corporação. Lá em 2014, ao receber as demandas, o ministro Fux liberou primeiro o pagamento aos juízes federais, e depois a membros da Justiça do Trabalho, da Justiça Militar e para magistrados de nove estados, independentemente de regulação do CNJ. Os demais estados já pagavam o benefício. Fux alegou que o auxílio era previsto pela Lei Orgânica da Magistratura, a Loman.

(Mera curiosidade: desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro desde 2016, Marianna Fux, filha do ministro do Supremo, recebe o auxílio-moradia mesmo sendo dona de dois apartamentos no Leblon.)

As decisões de Fux são liminares e ainda precisam ser submetidas ao Plenário do Supremo. Ele chegou a liberá-las para tal mas, em março deste ano, retirou-as da pauta a pedido da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), que solicitou uma mesa de conciliação com a Advocacia-Geral da União (AGU) para discutir o benefício.

Como o diálogo durou três meses e não chegou a lugar algum, cabe a Fux, novamente, encaminhar a questão ao colegiado. O contribuinte aguarda ansioso.

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