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Soldados russos em um tanque de batalha, nos Jogos Internacionais do Exército ARMI-2022, nos arredores de Moscou, Rússia, 27 de agosto de 2022.
Soldados russos em um tanque de batalha, nos Jogos Internacionais do Exército ARMI-2022, nos arredores de Moscou, Rússia, 27 de agosto de 2022.| Foto: EFE/EPA/YURI KOCHETKOV

A Federação Russa, o maior país do mundo, invadiu a Ucrânia, o maior país localizado totalmente na Europa. Esses dois gigantismos territoriais somam-se ao fato de que a Rússia busca manter uma esfera de influência no que chama de “Exterior Próximo”, ou “Mundo Russo”, os Estados pós-soviéticos. A combinação de todos esses fatores, mais os sucessos militares ucranianos recentes, podem deixar Vladimir Putin sem opção que não declarar uma mobilização geral russa para a guerra.

No início do conflito na Ucrânia, comentamos aqui em nosso espaço como os ucranianos poderiam sofrer de um “cobertor curto”. O país estava ameaçado de ataques por todos os lados. Ao sul, vindos da Crimeia. Ao leste, dos territórios do Donbass e da própria Rússia. Ao norte, da Rússia e de Belarus. Mesmo ao oeste, as forças russas na região moldava da Transnístria poderiam ser uma ameaça.

Hoje, entretanto, quem sofre com o cobertor curto é a Rússia. Na guerra da Ucrânia, nos últimos dias, os russos tiveram que ceder mais de mil quilômetros quadrados, com contra-ofensivas ucranianas ao sul, na região de Kherson, e ao nordeste, na região de Kharkiv. De maneira assombrosa, mesmo com grande superioridade numérica e tecnológica, a Rússia não conseguiu estabelecer domínio aéreo mesmo após seis meses de guerra.

Com isso, os ucranianos têm realizado ataques aéreos e com mísseis contra alvos na retaguarda russa, dificultando o abastecimento e o deslocamento de forças. Com dezenas de milhares de baixas, somando mortos, feridos e capturados, a Rússia está perigosamente ficando sem reservas para uma rotação apropriada de tropas. O país também está passando por um momento de necessidade de adaptação frente às sanções ocidentais e alguns dos componentes de origem ocidental que utiliza para fabricar equipamentos bélicos.

Presença militar russa 

A Rússia não está ficando sem soldados ou sem forças armadas. A questão é que um país que ocupa 11% da massa terrestre não pode simplesmente deslocar todo seu exército contra a Ucrânia e simplesmente deixar suas fronteiras desguarnecidas. Também não pode usar toda sua munição do dia para a noite e correr o risco de não ter os meios necessários para resguardar essas mesmas fronteiras e os seus interesses.

Principalmente, existe também o fato de que alguns dos principais meios militares russos estão empregados fora do país. A Rússia está presente militarmente no Cazaquistão, na Armênia, no Quirguistão, no Tadjiquistão e na Síria. Também ocupa territórios internacionalmente reconhecidos como de Moldova, na citada Transnístria, desde o fim da União Soviética, e da Geórgia, na Abecásia e na Ossétia do Sul, desde a guerra de Agosto de 2008.

Mercenários ligados à Rússia, como o Grupo Wagner, operam na Líbia, no Mali e na República Centro-Africana, dentre outros locais. A Rússia vai retirar suas tropas desses locais, correndo o risco de criar um vácuo, para reforçar sua guerra na Ucrânia? Provavelmente não, embora existam relatos de casos pontuais, como o de uma bateria antiaérea enviada da Síria para a Crimeia. E existe outro risco, o de crises na vizinhança russa ganharem força, aproveitando o fato de Moscou estar presa em um atoleiro.

No último mês de julho, o presidente do Azerbaijão, Ilham Aliyev, recebeu a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, para a assinatura de acordos em Baku que dobraram as importações europeias de gás natural azeri para pelo menos 20 bilhões de metros cúbicos por ano até 2027. Naquela ocasião, escreveu-se aqui que a retórica europeia de democracia e Direitos Humanos para diminuir a compra de gás russo era balela. O ponto era que a Rússia é uma ameaça potencial aos europeus, enquanto Azerbaijão e Argélia não o são.

Comentamos também que o Azerbaijão poderia usar as divisas para se voltar contra a Armênia, seu rival histórico e que derrotou na recente guerra de 2020. A Armênia, do fraco premiê Nikol Pashinyan, que sofreu um ultimato das forças armadas, têm na Rússia o seu único aliado. Foram os russos os garantidores e mediadores do acordo de paz que encerrou o mais recente conflito, e forças russas foram deslocadas para a região como tropas de paz.

Nova guerra no Cáucaso? 

Na noite do dia 12 para o dia 13 de setembro, no horário local, foi relatado que o Azerbaijão está atacando a Armênia em múltiplas frentes. Não se tratam mais de combates em território azeri que estava ocupado pela Armênia, ou na região separatista de Artsakh, também conhecida como Nagorno Karabakh, mas de ataques contra o território da república da Armênia. Enfraquecidos após a última derrota, os armênios estão em clara desvantagem contra o Azerbaijão.

A ditadura azeri usa grandes fatias do dinheiro dos hidrocarbonetos para compras militares, e recebe equipamentos e treinamento de seus aliados turcos. Logo após o início da ofensiva azeri, supostamente para conter “sabotadores armênios”, Pashinyan já teria conversado por telefone com Putin e com o presidente francês Macron. Finalmente, veio o “vazamento”de que o Conselho de Segurança da Armênia teria decidido pedir oficialmente ajuda de Moscou e acionar o Tratado de Segurança Coletiva, o acordo de defesa que une seis ex-repúblicas soviéticas.

É o mesmo tratado que foi invocado pelo Cazaquistão no início do ano, permitindo que tropas russas entrassem no país enquanto as forças armadas cazaques reprimiam os protestos. Trata-se de invocar uma aliança militar com o risco de colocar Rússia e Azerbaijão em guerra. O governo de Baku certamente pensa que os russos não possuem condições de mais um fronte de guerra e não virão socorrer os armênios caso uma solução diplomática não consiga ser negociada.

Putin teria, então, que escolher entre o desgaste de mais um conflito ou ver um aliado ser humilhado, diminuindo a credibilidade russa perante seus outros aliados. Como deslocar ainda mais forças para o Cáucaso e manter a guerra na Ucrânia? Caso Putin decida por manter o país em guerra, que ele não pode correr o risco de perder, frise-se, ele provavelmente terá que ordenar uma mobilização geral e oficializar a beligerância de seu país. Até lá, terá que lidar com o “cobertor curto” do maior país do mundo.

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