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“I’m the stuff men are made of” (John Wayne)

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Hoje, não é difícil imaginar o que um inventário sociológico, posto que breve, revelaria sobre a composição social das nossas redações de jornal: que elas são majoritariamente ocupadas por adeptos do progressismo politicamente correto, visão de mundo segundo a qual a humanidade pretérita (bem como vastas porções da atual) é um amontoado de bárbaros ignorantes, cujos valores, hábitos e juízos, que compõem um patrimônio cultural acumulado de geração em geração, devem ser relegados ao esquecimento perpétuo.

Conhece-se o tipo: tênis All-Star, cabelo colorido, calça Skinny e piercings no nariz, o caipira com pose cosmopolita acha-se moralmente superior por não comer carne, andar de bicicleta, reciclar o lixo e cumprir outros pequenos simulacros de virtude, via os quais tenta nos fazer crer que, apegando-se ao próprio estilo paroquial de vida com o desespero de um náufrago, o que faz na verdade é encarnar o ápice da moralidade humana. Daí que, para ele, as lições mais óbvias e autoevidentes, sedimentadas num senso comum universal, representem um verdadeiro escândalo. Ser um progressista politicamente correto é fazer basicamente isto: escandalizar-se incessantemente com o óbvio.

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A mais recente invectiva da tribo dos escandalizados voltou-se contra o ator global Juliano Cazarré, que, em suas redes sociais, fez uma defesa da masculinidade tradicional (“tóxica”, para os escandalizados), da paternidade e da família. Cazarré postou um vídeo no qual uma família de macacos atravessava uma estrada de terra e o macaco macho, o macho-alfa do bando, aguardava a passagem de fêmeas e filhotes, protegendo-os dos carros. Comentando sobre a cena, o ator escreveu em sua conta no Instagram: “A masculinidade é uma construção social... Só que não! PROVER E PROTEGER (sic): a masculinidade faz do mundo um lugar mais seguro. PS1: Quem tem um pai legal sabe. PS2: Esse gorila é mais cavalheiro do que muito homem por aí... dorme com esse barulho”.

Argumentando com internautas, o ator disse ainda que “é muito prejudicial para os meninos crescer sem uma figura masculina. Mães solteiras são heroínas, mas dificilmente saberão transmitir os valores da masculinidade”.

Toda pessoa com bom senso compreende a postagem como um justo apelo à responsabilidade e ao cavalheirismo dos homens, que, na visão do ator, devem amar e proteger mulher e filhos, assumindo o seu nobre papel no seio da família. Assim foi consagrada a ética masculina desde que o mundo é mundo, e o lema “mulheres e crianças primeiro” não é obra do acaso.

Mas não se pode mesmo esperar bom senso dos escandalosos consumidores de soja, para quem uma fila grande no caixa do Starbucks (onde, à espera de um mundo destestosteronizado, se contentam por ora com café descafeinado) já constitui grave violação aos seus direitos humanos. Para estes, a opinião do ator não passou de uma abominável manifestação de – surpresa! – machismo.

Os jornalistas-militantes enxertam a sua própria visão de mundo na notícia, usando pretensos leitores e internautas como laranjas

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Seguiram-se os truques editoriais de sempre, pelos quais o coletivo das redações, menosprezando a inteligência do público, tenta nos fazer crer que a sua opinião minoritária e excêntrica é universal e representativa. Daí que o óbvio vira “polêmica”.

Um dos truques usados foi aquele que venho chamando de “intransitividade maliciosa”, técnica de manipulação pela qual o jornalista-militante transmite a sua posição ideológica fingindo dar uma notícia. Exemplo: “Juliano Cazarré é criticado ao dizer que é prejudicial meninos crescerem sem figura masculina”. Criticado por quem? O redator prefere não dizer, porque, antes que noticiar o fato da crítica, o que pretende, na verdade, é induzi-la.

Ora, são os progressistas de calça Skinny da redação, impregnados da cultura misândrica do feminismo contemporâneo, os mais ofendidos e indignados com a postagem do ator. São eles, e mais ninguém, os obcecados em assassinar a sua reputação, ostracizá-lo e, mediante chantagem politicamente correta, impedir a circulação da opinião por ele representada. Quando se fala em “ditadura do politicamente correto”, é a esse expediente totalitário que muitas pessoas se referem.

Diz outra matéria de mesmo teor: “O conteúdo escrito pelo ator foi considerado machista e patriarcal, conceitos que têm sido colocados cada vez mais em xeque pelas novas gerações”. Temos, de novo, a intransitividade maliciosa. Quem considerou o conteúdo escrito pelo ator como machista e patriarcal? Embora evidentemente omitida, a resposta é óbvia: pelo próprio sujeito que redigiu a matéria, e que, ademais, se acredita representante da voz das “novas gerações”, quando a única coisa que representa é, no máximo, a ideologia afetada da sua patotinha da redação.

É preciso aprender a ler o noticiário atual. Toda vez que topamos com construções maliciosamente intransitivas (“fulano é criticado”, “a opinião do fulano foi considerada isso ou aquilo” etc.), ou com fórmulas declaratórias tais como “diz leitor” ou “internautas apontam”, é sempre a opinião vigente na redação o que vem em seguida. Não tem erro. Trata-se da maneira pela qual, covardemente, sem assumir responsabilidades pelo que está sendo dito, os jornalistas-militantes enxertam a sua própria visão de mundo na notícia, usando pretensos leitores e internautas como laranjas. É o laranjal opinativo do jornalismo contemporâneo.

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E, se o ator Juliano Cazarré sentiu a necessidade de defender a masculinidade e a paternidade tradicionais é porque, de fato, elas estão sob ataque cerrado desde os anos 1960, um ataque perpetrado por ativistas radicais da assim chamada “segunda onda do feminismo”, que, em poucas décadas, conseguiram levar o modelo marxista da “luta de classes” para dentro das relações familiares e de gênero, rebaixando os homens (os “burgueses” do lar) de provedores e protetores respeitados a criaturas desnecessárias e irrelevantes, quando não nocivas. “Um dos problemas mais persistentes e frustrantes na biologia evolutiva é o macho. Por que eles simplesmente não somem?” – escreveu certa vez a jornalista feminista Natalie Angier, colunista do The New York Times.

Incapazes, por óbvio, de sumir fisicamente com os machos, as feministas da segunda onda dedicaram-se a atacar o conceito tradicional de masculinidade, concebida desde então como opressora, violenta e antissocial. Foi assim que a misandria militante do feminismo chegou nas escolas. Antes mesmo de se tornarem adultos (e, logo, pais de família), os meninos vêm sofrendo uma intensa lavagem cerebral por parte da pedagogia progressista, que tudo faz para incutir neles a “culpa de gênero”, a ideia de que devem passar o resto de seus dias se desculpando e se penitenciando por pertencerem ao “sexo opressor”. Trata-se de uma pedagogia ativamente emasculatória.

Como mostra Christina Hoff-Sommers em The War Against Boys, muitas escolas americanas estão ensinando os meninos a reprimir as características naturais do seu sexo biológico, tais como o destemor, a competitividade, o espírito de aventura e o interesse em atividades mais físicas que contemplativas. Nessa cultura pedagógica misândrica e emasculatória, as leituras obrigatórias têm sido sobre temas usualmente favoritos de meninas (contos de fadas, por exemplo), e raramente sobre os de meninos (histórias de aventura e de batalhas). Algumas direções de escola chegaram a eliminar o horário do recreio, preocupadas com as brincadeiras de luta e de guerra que tanto agradam e ensinam aos meninos, mas que, para o feminismo escolar, estimulam a violência, o machismo e a agressividade.

Há, em suma, toda uma cultura de demonização da masculinidade, pela qual os meninos aprendem desde cedo a se verem como “meninas com defeito”. Para aplacar essa culpa lancinante, espécie de maldição de tragédia grega, muitos deles optam por virar “feministos”, adotando uma postura condescendente e covarde em suas relações com o sexo oposto. No fim das contas, a campanha feminista contra a masculinidade tradicional e a ética cavalheiresca a ela associada é um excelente pretexto para que homens irresponsáveis, fracos, hedonistas ou cínicos (e assim, são, em geral, os “feministos”) se sintam dispensados do dever de construir e cuidar de uma família.

Juliano Cazarré tem razão. O gorila, mais ainda.

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