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O deslocamento até o Aeroporto Afonso Pena é um ritual obrigatório que se repete muito ao longo do ano, a ponto das pessoas poderem descrever em detalhe o trajeto percorrido. A paisagem, já sem qualquer distinção entre Curitiba e São José dos Pinhais, a não ser a estrita faixa por onde se esgueira o mal tratado Rio Iguaçu, faz as duas cidades estarem ligadas por uma estrutura urbanizada cada vez mais consolidada e sem maiores atrativos.

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Para viajantes de outras localidades, chegar e partir da Terra dos Pinheirais tornou-se um trajeto globalizado, sem uma característica mais relevante que possa representar um “volte logo” mais qualificado. Uma paisagem qualquer, de uma cidade qualquer, é o que temos a oferecer nesse contexto.

No entanto, uma exceção à regra podia ser muito apreciada, já quase nas imediações do Afonso Pena. Nas últimas curvas de acesso, à esquerda do trajeto de ida, um relicto de cerca de um hectare de Floresta com Araucária manteve-se íntegro até há muito pouco, bem ao lado da estrada. Uma preciosidade que poderia ser considerada uma referência fiel do patrimônio natural dos paranaenses. E ser observada com deslumbramento e respeito por todos, a cada trajeto realizado.

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Possivelmente, a maioria dos que estão lendo esse texto não se lembrarão da pequena mata a que estou me referindo. Tanto não lembrarão, como sequer notaram que a mesma foi, em boa parte, destruída ou alterada para uma ampla construção a ser instalada na outra vertente do acesso ao aeroporto, no seu caminho de volta à Curitiba.

Nos últimos dois anos, uma ampla instalação do SESC São José dos Pinhais foi construída nesse local, espremendo o pequeno trecho de floresta nativa cada vez mais pressionada. Dá mesmo a impressão de que mais dia menos dia tudo será transformado em prédios de estacionamento ou qualquer outra coisa útil.

Certamente o SESC obteve licença ambiental do Governo do Estado ou do Município de São José dos Pinhais para construir. E a supressão e alteração de vegetação licenciada a partir de preceitos legais vigentes. Supostamente sim. Mas o ponto não é esse.

Importa demonstrar que ninguém se ateve à destruição parcial desse belo bosque. Nem o poder público nem a população, nem os usuários do aeroporto entenderam a perspectiva de manter intacto esse pequeno pedaço de natureza envolto em metros quadrados de cimento e de asfalto. Um cartão postal dos paranaenses foi suprimido. E ninguém viu.

Todos nós tivemos, por anos seguidos, a chance de desfrutar dessa bela paisagem, representativa de nossa região, antes do embarque. Mas o que se denota, a partir da não reatividade observada, é que esse bosque sempre foi um espaço invisível. Não se destinou nem ao desfrute nem ao respeito dos que usam o aeroporto. Nem foi percebido pelos demais frequentadores ou moradores locais.

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Cabe demarcar como temos nos comportado reiteradamente frente a situações como essa. Somos inatingíveis pela percepção mais aguçada do valor da paisagem natural. Não conseguimos perceber a importância dos remanescentes de vegetação nativa que resgatam o que essa região toda do Paraná foi um dia.

Estamos, por fim, intensamente pobres de espírito. Ao relegar a nenhum plano o que deveria ser motivo de orgulho, deleite e de proteção de parte de nossa sociedade, mostramos no que verdadeiramente nos tornamos. De fato, o verde invisível quase não precisa ter mais essa condição. Até porque está deixando de existir mesmo para os que conseguem enxergá-lo.

 

*Este artigo foi escrito por Clóvis Borges, diretor executivo da OSC Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental – SPVS, parceira do Instituto GRPCOM no blog Giro Sustentável.

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