Fernando Haddad e Jair Bolsonaro vão para o segundo turno e agora podem explicar pontos delicados de suas estratégias políticas. Foto: Nelson Almeida/AFP| Foto:

O crescimento da candidatura de Jair Bolsonaro (PSL) na reta final quase o poupou de um segundo turno contra Fernando Haddad (PT). Coincidentemente, os dois eram as figuras mais novas entre os postulantes com mais chances nestas eleições e ambos fizeram campanhas mais curtas que seus oponentes. Haddad só entrou em campo de verdade depois que a Justiça Eleitoral barrou a candidatura do ex-presidente Lula. Bolsonaro ficou quase um mês no hospital, de onde se comunicou por vídeos e posts em redes sociais. Por causa das campanhas tumultuadas, eles não chegaram a se enfrentar em debates diretos. Agora será a chance dos dois se encontrarem.

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Existem boas perguntas que eles podem se fazer em um debate. Sugiro três para cada um responder:

Para Bolsonaro

Qual o papel do general Mourão no governo?

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Esta pergunta é uma forma de entrar na questão do compromisso do deputado federal com a democracia. O próprio Bolsonaro deu declarações polêmicas de apoio à ditadura militar e com ideias para solucionar os problemas do país (como fuzilar o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso), mas seu vice, o general Hamilton Mourão, trouxe as dúvidas mais fortes sobre as credenciais democráticas da chapa. Mourão defendeu abertamente uma intervenção militar no país no ano passado e durante a campanha falou que em caso de anarquia seria justificável um autogolpe. O que é anarquia na cabeça do general é uma incógnita. Para completar, ele disse que seria preciso fazer uma nova Assembleia Constituinte sem membros eleitos. Bolsonaro precisa deixar claro o que pensa sobre as opiniões de Mourão e delimitar o que será a participação do general em seu governo para ajudar o eleitor a tomar uma decisão informada.

Qual seu projeto para a Previdência?

A campanha de Bolsonaro é a que promete o ajuste fiscal mais rápido: quer acabar com o déficit primário no primeiro ano. Em seu programa, também defende a realização de uma reforma da Previdência, com a adoção de um modelo novo para quem entrar no sistema previdenciário – chamado de capitalização, no qual cada trabalhador tem uma “poupança” pessoal. O deputado federal não colocou na mesa ainda qual seria sua proposta de reforma previdenciária. Ele criticou o projeto do governo Michel Temer, que já é considerado por especialistas como insuficiente para lidar com o crescimento do déficit da Previdência. Há, portanto, uma aparente falta de sincronia entre a meta de ajuste fiscal e a superficialidade do projeto de Bolsonaro para a Previdência. O segundo turno pode ajudar a esclarecer este ponto.

Como vai lidar com a falta de consenso?

O deputado federal construiu sua candidatura em torno da oposição ao PT e em nenhum momento acenou que caminharia para o centro do espectro político. Com a votação elevada no primeiro turno, ele provou que a estratégia estava correta – pesou mais o discurso contra a política tradicional e contra a esquerda do que o receio a respeito de seu extremismo político. Depois da eleição, no entanto, um governo precisa construir consensos, especialmente no Congresso. Ao mesmo tempo, em uma democracia é preciso respeitar a oposição e a diversidade de ideias. Como Bolsonaro espera unir essas peças delicadas do jogo democrático sem usar os expedientes de governos anteriores, como a concessão de cargos no governo e liberação de emendas? É uma questão em aberto.

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Para Haddad

Vai continuar visitando Lula na cadeia?

Para Fernando Haddad, a primeira pergunta delicada é se ele continuará visitando o ex-presidente Lula na cadeia. A partir disso, é possível pressioná-lo: ele vai fazer algum movimento para soltar Lula? Ou Lula vai ser uma espécie de “primeiro-ministro” de dentro da cadeia? São questões que permitem ao eleitor entender se o país teria um presidente que saberá respeitar as decisões da Justiça e apto a governar por si mesmo. Fora o constrangimento óbvio de um presidente fazer visitas a uma carceragem da Polícia Federal.

O que vai fazer sem uma reforma da Previdência?

O programa de governo do PT não admite que há um déficit na Previdência e não propõe uma reforma nos moldes da que tramita hoje no Congresso – fala apenas em acabar com privilégios. Se não está nos planos uma reforma profunda, o PT precisa explicar como fará para equilibrar as contas públicas no longo prazo. Haddad quer revogar o teto dos gastos públicos e reduzir impostos (como o Imposto de Renda), o que pode agravar o déficit público. A matemática está contra o candidato, já que esse tipo de política costuma levar a inflação e juros mais altos. É essa sua proposta?

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O que pretende com uma Assembleia Constituinte?

Haddad fala que quer criar condições para a realização de uma Assembleia Constituinte verdadeiramente democrática. Não estão claros os objetivos de se fazer uma nova Constituição em moldes “mais democráticos”, mas a linguagem é parecida com a usada nas reformas constitucionais da Venezuela. Apesar de seus defeitos, a Constituição brasileira não pode ser criticada por alijar cidadãos de direitos fundamentais, nem de ser uma barreira para a democratização desses direitos. No fim, o candidato precisa explicar o que quer de fato com uma mudança legislativa desse tipo.