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Rodrigo de Oliveira/BCB
Rodrigo de Oliveira/BCB| Foto:

O Banco Central abriu uma consulta pública para atualizar as regras seguidas pelas instituições financeiras para detectar casos de lavagem de dinheiro. Seria uma boa notícia, não fosse o clima político em torno do caso Coaf, no qual se investigam depósitos suspeitos em contas de assessores de deputados estaduais do Rio de Janeiro, incluindo Flávio Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro.

Uma versão dada pela Folha de S. Paulo é que a proposta do BC alivia o monitoramento de parentes de pessoas expostas politicamente. Além disso, é frisado o fato de se elevar na proposta o limite para que uma operação seja registrada no Coaf, o órgão federal que analisa as movimentações financeiras. O valor passaria de R$ 10 mil para R$ 50 mil. A repercussão fez o BC divulgar uma nota negando os efeitos negativos das regras.

O momento em que o BC iniciou sua consulta abriu a brecha para uma interpretação incorreta da proposta. Para quem comenta o assunto sem ler, pode parecer que o BC quer mexer com o sistema que está mostrando serviço ao revelar os depósitos suspeitos na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. Os dados do Coaf de fato ajudaram os investigadores a puxar um fio que pode ir longe, inclusive respingando no Palácio do Planalto – parentes do assessor investigado foram empregados por Jair Bolsonaro e um depósito foi feito na conta da primeira-dama, Michelle.

Essa impressão de que o sistema de monitoramento de transações suspeitas não precisa se aperfeiçoar não existiria dois meses atrás. Embora um colaborador importante de operações como a Lava Jato, o Coaf poderia ter um papel mais ativo para detonar investigações. Além disso, em todos os escândalos de lavagem de dinheiro o sistema financeiro passou sem muitos arranhões. Há um vácuo de responsabilidade, já que os bancos cumprem sua tarefa ao disparar alertas que chegam aos milhões ao Coaf – o que não muda o fato de que bilhões de dinheiro sujo circularam pelo país, mesmo depois de iniciada a Lava Jato.

A proposta do BC não é uma novidade, vem sendo discutida há anos em um fórum do qual o Brasil e outros 200 países fazem parte, o Grupo de Ação Financeira Internacional (Gafi). O livro de recomendações do grupo foi adotado em 2012 (com várias atualizações desde então) e há tempos elas fazem parte da política do ministério da Fazenda, que tem um bom resumo em seu site.

A ideia do Gafi é que haja um uso mais inteligente de informações por parte do sistema financeiro, que passa a assumir uma maior responsabilidade pelas movimentações. Na norma proposta pelo BC (que você pode ler aqui), continua existindo a necessidade de registro de pessoas expostas politicamente. Os bancos teriam 30 dias para analisar operações suspeitas, incluindo as que envolvam pessoas suspeitas de terrorismo, além daquelas em que há movimentações atípicas.

Como está em consulta pública, a nova norma do BC pode ser criticada e aperfeiçoada. Mas não tem cabimento relacionar sua existência a qualquer investigação policial em curso. Talvez a autoridade monetária tenha errado o momento de fazer o necessário debate, só não pode ser acusada de estar amolecendo o combate contra a lavagem de dinheiro.

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