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É natural que gere desconforto a informação de que o apresentador Luciano Huck usou um financiamento do BNDES com juros camaradas para comprar um jatinho. É fácil imaginar que haveria destino melhor para o dinheiro público.

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Que fique claro, não há nada de errado na contratação do financiamento. Qualquer empresa do país poderia ter solicitado o crédito para comprar um jato da Embraer, desde que cumprisse os critérios exigidos pelo BNDES. Huck tem o direito de investir na aeronave para acompanhar seus negócios, voar nas férias ou o que seja.

O problema, portanto, não é o fato de Huck ter aproveitado uma linha de crédito pública para comprar um jatinho, mas as distorções criadas por décadas de política industrial ineficiente. Você pode não gostar de ver um ricaço comprando um avião, mas esse é o resultado da ideia de que é preciso um estímulo extra para que as empresas invistam em máquinas e equipamentos com um certo grau de nacionalização. Visto por outro ângulo, ninguém criticou o fato de a Embraer ter feito uma venda subsidiada pelo governo porque está bem enraizada no Brasil a ideia de que esse é mesmo o papel do Estado.

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O Finame, a linha de crédito camarada, foi criado no fim de 1964 pelo governo militar. Foi um período em que o BNDES ganhou novas funções para além do financiamento da infraestrutura. O banco público passou a ser um vetor da industrialização e o crédito barato fazia parte da estratégia. A teoria era que as empresas poderiam se modernizar, ao mesmo tempo em que se criaria demanda para o fornecimento nacional de máquinas e equipamentos.

A fórmula teve resultados dúbios. O Brasil de fato deu um salto de industrialização entre o fim dos anos 60 e fim dos anos 70, mas com um custo fiscal elevado, fortalecimento de grupos bem relacionados com o governo, criação de estatais que se tornaram elefantes brancos e fechamento da economia.

Essa visão desenvolvimentista perdeu força nos anos 90. Curiosamente, foi o período em que a Embraer foi privatizada e se transformou em líder na produção de aviões regionais. Foi também por causa da globalização da companhia que ela passou a fabricar jatinhos, como o comprado por Luciano Huck. Essa transição da empresa, claro, não foi sem um empurrão estatal – o crédito para as vendas da companhia continuava existindo, sendo até questionado na OMC.

Mas provavelmente as condições de financiamento nunca foram tão favoráveis quanto no período que começou no segundo governo Lula. Na esteira da crise financeira internacional de 2008, o BNDES recebeu bilhões do Tesouro para ampliar linhas como a do Finame, que passou a ter os juros camaradas de 3% ao ano até o início do segundo governo Dilma através do Programa de Sustentação do Investimento. Era o retorno do desenvolvimentismo com força total.

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Sabemos que o resultado dessa política foi a ampliação do déficit público, sem um salto de produtividade que compensasse o uso de recursos estatais. Não aprendemos com a história: só juros subsidiados não substituem outros componentes de uma economia de mercado, como competição, inovação, mão de obra qualificada e assim por diante.

O jatinho de Huck é fruto de uma visão de Estado que se provou insuficiente para levar ao desenvolvimento. Resta saber se o apresentador, caso realmente se lance como candidato à Presidência, vê com bons olhos o modelo desenvolvimentista ou se apenas fez o que qualquer pessoa faria depois de ver os números. Afinal, 3% ao ano é uma taxa de pai para filho.