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Prédio do INSS em Curitiba
| Foto: André Rodrigues/André Rodrigues

Está em um detalhe da reforma da Previdência um processo de privatização que pode ser o maior projeto para destravar um mercado dentro do governo Bolsonaro. O texto prevê que uma lei complementar poderá permitir a entrada do setor privado no sistema de concessão de benefícios não programados.

A equipe econômica, segundo relato de segunda-feira (12) de O Globo, já está preparando o texto dessa lei complementar. O projeto permitirá que os empregadores troquem o INSS por empresas privadas para prover a seus trabalhadores benefícios como auxílio-doença, licença-maternidade e auxílio-acidente. Aposentadorias e pensões por morte não entram nessa categoria de benefícios.

Essa medida, se aprovada pelo Congresso, criaria um mercado bilionário ligado ao setor de seguros e teria um potencial grande para reduzir custos para as empresas e melhorar as condições de trabalho. Modelo semelhante já é usado em outros países que usam bem a complementaridade entre serviços sociais e a iniciativa privada, como Inglaterra e Áustria.

Haverá um grande incentivo para que as empresas contratem serviços privados para segurar seus trabalhadores, já que o governo promete desonerar esse custo da contribuição patronal à Previdência. No lugar do INSS, os empregadores poderão contratar empresas privadas, mais eficientes na gestão de risco e personalização de serviços.

Além de poderem controlar diretamente esse custo procurando um mercado competitivo, os empregadores terão incentivos maiores para reduzir acidentes e outros riscos associados ao trabalho, já que isso se refletirá no valor pago às seguradoras. É como ocorre com qualquer seguro de carro, por exemplo, que é calculado de acordo com o risco e os hábitos do condutor.

Outra vantagem é que as seguradoras tendem a ser mais rápidas na avaliação dos benefícios e a construir programas mais eficientes de monitoramento de riscos e reabilitação de trabalhadores. O INSS peca enormemente nesse segundo quesito, a ponto de o governo ter de fazer de forma rotineira um "pente-fino" para suspender benefícios indevidos.

Ainda não está claro se o governo pretende manter o INSS no mercado concorrendo com empresas privadas. Se esse for o caso, há o problema de o setor público ter de absorver as empresas com maior risco e menor empenho em reduzir seus acidentes. Uma alternativa seria o próprio INSS construir uma seguradora com funcionamento diferente do atual.

Pelo tamanho desse mercado, é provável que essa seja a maior privatização do governo Bolsonaro, pelo menos quando consideramos esse termo de forma ampla - a passagem de um negócio controlado pelo Estado para a iniciativa privada. O governo deixou de fora da pauta a venda de suas maiores empresas (Petrobras, Banco do Brasil e Caixa) e deve apenas se desfazer de participações em estatais menores. Além disso, há uma pauta de concessões, incluindo grandes blocos de petróleo, que já era aberta à iniciativa privada e deve ser acelerada se o governo conseguir colocar em prática suas intenções.

Processo de privatização maior do que esse só se a equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, conseguir formular e aprovar no Congresso um projeto de capitalização da Previdência. Nesse caso, seria um mercado que movimentaria trilhões no longo prazo e levaria a uma transformação na forma como enxergamos a poupança privada no país.

O caso dos benefícios não programados é um exemplo muito bom de como o Brasil precisa urgentemente de mais mercado. Digo isso no sentido de usar mais amplamente o mecanismo de mercado para intermediar soluções para a sociedade. Isso é possível em serviços de educação (há modelos como o de vouchers do Chile e as charter schools dos Estados Unidos), saúde (muitos países usam o subsídio aos seguros privados como forma principal de mediação do atendimento público) e saneamento (no qual as estatais brasileiras fracassaram enormemente). E até onde achamos que já existe mercado - setores onde há concentração excessiva, falta de abertura à competição ou cartéis, por exemplo.

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