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José Mayer saiu da Globo. Ele tinha sido denunciado por assédio sexual a uma figurinista, Su Tonani. Há quase dois anos sem atuar, o ator teve o contrato encerrado após 35 anos na emissora.

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Mayer chegou a escrever um pedido de desculpas público à figurinista. Basicamente, fora levado pela denúncia a reconhecer a gravidade do que fizera e se colocava, sem ressalvas, à disposição da lei e da sua classe para receber as punições cabíveis.

Mas não houve punição – não segundo as leis que estão escritas. A coletividade preferiu outro método.

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O processo judicial não foi iniciado. A vítima optou por não levar a denúncia adiante, declarando-se constrangida por um delegado. Ao mesmo tempo, a conduta de Mayer era repudiada por atrizes e funcionárias de TV – uma reação importante e necessária contra um tipo de abuso que não pode ser tolerado.

O ator foi exposto a uma (justa) condenação moral, sendo colocado, por sua própria importância artística, no lugar espinhoso do exemplo pessoal a não ser seguido. Aqui se faz, aqui se paga? Não nesse caso.

No percurso do merecido castigo, o observador atento foi notando que não haveria preço a pagar. A fronteira entre a justiça e o justiçamento é o instante em que se deixa de afixar a pena. O justiceiro não quer que o infrator pague. Quer que ele suma.

Bem-vindos ao século 21 – época de ouro das patrulhas implacáveis pela virtude imaginária. Moralista era sua avó.

A corrente supostamente virtuosa pelos direitos da mulher contra o abuso machista do galã virou, como quem não quer nada, uma campanha de banimento. Sabe aquelas culturas super modernas onde a adúltera não merece mais viver em sociedade? Pois é, a sanha politicamente correta adora uma modernidade dessas. Não perca seu tempo com atenuantes, o jogo é esse.

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Transformar José Mayer num personagem contagioso – e proscrito – deu palco a muita gente boa (boa?). Repetindo: não perca tempo com atenuantes, já são quase dois anos de solitária absoluta, sem progressão à vista no horizonte. Pena de morte em vida.

A memória coletiva tem apagado rápido o que a constrange, mas o Google é testemunha fiel. Ninguém fez a ressalva humanitária fundamental: um grande artista de quase 70 anos de idade precisava pagar pelo que fez, mas a pena não deveria nem poderia ser a extinção da sua carreira e a maldição perpétua da sua pessoa.

Uma voz se distinguiu da asfixia – a do autor de novelas Aguinaldo Silva. Se duas ou três outras personalidades dessa dimensão tivessem se juntado a Aguinaldo – não para passar a mão na cabeça de Mayer, mas para alertar a opinião pública contra o risco do castigo virar expurgo –, a própria emissora talvez tivesse voltado a escalá-lo após as devidas punições, sem virar alvo da sanha linchadora também.

Algumas colegas do ator tiveram a dignidade de declarar que o admiravam e não tinham experiências profissionais negativas com ele, mas, salvo engano, Aguinaldo ficou sozinho dizendo que condenar Mayer ao ostracismo era uma barbaridade.

Não teve conversa, e a perseguição fascista fantasiada de causa humanitária venceu. Não é exclusividade brasileira. Hollywood já tem uma coleção de caça às bruxas (adivinha onde os justiceiros daqui se inspiraram?).

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É claro que um macarthismo desvairado desses não ajuda mulheres, nem homens – apenas predispõe uns contra os outros e semeia a desconfiança geral. Depois vocês vêm falar em onda de ódio. Viva a fofura talibã.

A você que hoje é o caçador/caçadora, apenas reze para amanhã não ser a caça.

PS: Curiosamente, a rede de repúdio a José Mayer não foi vista numa campanha da mesma dimensão contra João de Deus, o ex-guru das estrelas. Nenhum mistério do além. Não precisamos comparar o valor dos dois personagens e a quantidade de vítimas deles, você já entendeu o que é oportunismo solidário.