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Dia desses, com aquele desassombro que lhe é peculiar, Jair Bolsonaro anunciou que diria um absurdo: “Nós podemos partir para o escambo, troca. Tem país que refina petróleo e tem diesel em abundância. Nós temos alimentos”. Em duas linhas o presidente acabou com a globalização e devolveu o comércio mundial ao período antediluviano.

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Que não se tome a declaração como pura retórica, ainda que seu teor seja irrealizável. Sua proposta é reveladora do primitivismo com que encara a natureza do processo econômico, e foi a baliza de sua atuação política na área ao longo das três décadas em que esteve no Congresso.

Desde o primeiro momento, a ida de Paulo Guedes para o Ministério da Economia cumpriu uma função alegórica. O bolsonarismo encampou a bandeira liberal para subvertê-la desde dentro em nome de um projeto populista, que ganhou força redobrada a partir da pandemia.

A desgraça da peste foi uma oportunidade para a virada de chave definitiva. Apegado ao prestígio do cargo, o posto Ipiranga foi ficando, trocando os ensinamentos da Escola de Chicago pela contabilidade criativa da Escola do Centrão.

O palestrante favorito da Faria Lima está tão confortável na posição que agora até defende o congelamento de preços, uma das instituições mais antigas da América Latina. “Trava os preços! Vamos parar de aumentar preços aí, dois, três meses. Nós estamos em uma hora decisiva para o Brasil”, disse num evento com empresários do setor de supermercados. Por “hora estratégica”, leia calendário eleitoral.

Nessa semana, o Palácio Planalto organizou uma força tarefa para fazer passar o texto que tabela o ICMS sobre os combustíveis e promete ressarcir Estados que zerarem o tributo. A medida é um Frankenstein fiscal que, sob o pretexto de diminuir o preço do diesel, da gasolina e do etanol, consiste em um subsídio mascarado. A um só tempo o monstrengo fiscal fura o teto de gastos, usa recursos limitados e extraordinários de uma privatização que ainda não se concluiu e diminui tributos casuisticamente sem propor corte de despesas.

Tudo, é claro, com prazo exato para acabar: o fim do atual mandato.

O objetivo é: montar um cenário artificial de melhoria das condições econômicas na boca da urna. Segurar o que puder até outubro. É a frase de Dilma Rousseff: “nós podemos fazer o diabo quando é hora da eleição”, só que adaptada ao bolsonarismo e aprofundada por ele.

Se a vitória for alcançada, tanto melhor para Bolsonaro e seus aliados, que terão tempo para novas maquiagens. Caso, contrário, o sucessor que lide com o butim herdado, bem como o desgaste de não manter os benefícios. Parafraseando Jarbas Passarinho, em nome da reeleição se manda às favas toda a responsabilidade fiscal, e, claro, também os escrúpulos.

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