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Era agosto de 2018, e Bolsonaro disputava o 1° turno da eleição presidencial como alguém que propunha mudar o país estabelecendo uma nova era de indicações técnicas e sem interferência de partidos. Em debate na TV Bandeirantes, afirmou que seria o único candidato que poderia romper com o “establishment, a máquina, o sistema”. Garantia isso reafirmando uma suposta moral superior. O discurso inflamado somado ao sentimento antipetista majoritário na sociedade acabaram obnubilando elementos que apontavam para como tudo aquilo não passava de um enorme teatro construído para conquistar eleitores. Bolsonaro, afinal, sempre foi um típico parlamentar do baixo-clero: improdutivo na atuação legislativa, sem fidelidade partidária e chefe de um clã familiar metido na vida política. Não poderia dar em outra. Uma vez no poder, consumou o estelionato eleitoral, que agora apenas se escancara com a interferência indecorosa de seu governo nas eleições da Câmara e do Senado.

Ainda no início de 2020, Bolsonaro iniciou um processo de aproximação com o chamado “Centrão”, grupo fisiológico que está sempre pronto a aderir a quem lhe der verbas, influência e nacos do Estado. Chegou até mesmo a gravar um vídeo com Arthur Lira, deputado do PP enrolado em diversas investigações.

Bolsonaro passou a distribuir cargos para indicados do “Centrão”. Loteou o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação e o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas para nomes ligados a Ciro Nogueira e Arthur Lira. Até mesmo gente na órbita de Valdemar da Costa Neto e Geddel Viera Lima foi nomeada para postos no Banco do Nordeste e no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Outra ação do presidente foi recriar o Ministério da Comunicação, entregando-o para Fábio Faria, outrora um entusiasmado apoiador dos governos petistas.

A eleição nas casas legislativas do Congresso Nacional representou o aprofundamento dessa relação entre o bolsonarismo e o “Centrão”. A intervenção feita pelo Palácio do Planalto em favor das candidaturas de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco foi descarada, valendo-se de todos os instrumentos possíveis, incluindo a negociação de cargos e Ministérios, além da distribuição de recursos extraordinários para consolidar o voto dos parlamentares. Práticas essas que contrariam tudo aquilo que foi dito durante a campanha eleitoral, quando o presidente seus filhos vituperavam contra aquilo que chamavam de “velha política”.

Poucos dias antes da eleição, o jornal O Estado de São Paulo publicou uma matéria revelando a distribuição de R$ 3 bilhões para 250 deputados e 35 senadores. O recurso “extraordinário” teria origem no Ministério do Desenvolvimento Regional, comandado por Rogério Marinho, e seria destinada para obras nos redutos eleitores desses parlamentares. Segundo o jornal só Arthur Lira teria sido agraciado com R$ 109,5 milhões em verbas desse tipo.

O presidente também abriu as porteiras para negociação de cargos no primeiro escalão, incluindo o Ministério da Saúde, que pode ficar com o atual líder do governo na Câmara, Ricardo Barros. Além de fazer moeda de troca com a pasta responsável por cuidar da pandemia, Bolsonaro também aventou a possibilidade de recriar outras, como a da Cultura, a da Pesca e dos Esportes. Os bolsonaristas empreenderam enorme esforço para viabilizar e eleger tanto Arthur Lira quanto Rodrigo Pacheco. O argumento principal é que, alinhados ao Planalto, eles destravariam as pautas do governo que teriam sido boicotadas por Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre. É uma fraude. A começar pelo fato de que na eleição das casas parlamentares em 2019, os candidatos governistas eram esses dois. E, muito pelo contrário, o pouco que se avançou na agenda legislativa se deu pelos esforços empreendidos por ambos, muitas vezes salvando o governo de suas próprias trapalhadas.

A tal agenda de reformas não existe. O único objetivo de Bolsonaro é se blindar dos crimes de responsabilidade que comete em série. Sua intervenção na eleição do Congresso é o tratamento precoce que faz contra o impeachment.

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