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Tarcísio de Freitas bem que tentou alertar Jair Bolsonaro e seus correligionários do PL. Em um encontro com os bolsonaristas, o governador de São Paulo disse: "Nós não podemos perder a narrativa. A direita não pode perder a narrativa de ser favorável na Reforma Tributária. Senão, ela acaba sendo aprovada, e quem aprovou?". O apelo a uma reflexão racional e estratégica rendeu a Tarcísio vaias, interrupções grosseiras e provocações num ambiente ideologicamente delirante em que a contrariedade aos posicionamentos do ex-presidente é tomada como heresia e alta traição. De última hora, Bolsonaro tentou liderar um boicote ao projeto. Fracassou, e viu encolher sua influencia na oposição.

A Reforma Tributária em discussão no Congresso Nacional nunca foi a “reforma do PT”, como disse Bolsonaro. Sua construção nasce do projeto original de autoria do deputado Baleia Rossi, do MDB. Foi, é verdade, encampada pelo governo Lula, que tratou de elegê-la como prioridade para discussão no Legislativo no inicio do mandato, mas daí a dizer que ela segue as concepções dogmáticas do PT e constitui um texto de esquerda não passa de vigarice. O próprio Lula, alias, afirmou que ela não era exatamente a reforma que ele ou Haddad desejavam, mas que “tudo bem”.

De última hora, Bolsonaro tentou liderar um boicote ao projeto da Reforma Tributária. Fracassou, e viu encolher sua influencia na oposição.

No início da semana, Arthur Lira anunciou que empreenderia “esforço concentrado” para votar a Reforma Tributária até o final da semana. Cancelou todo o restante da agenda da Câmara e tratou de iniciar as articulações para reunir os votos necessários de maneira a aprová-la.

Lira foi construindo o apoio juntando gente do centrão, da esquerda lulopetista e da direita. Não era tarefa fácil, até porque, em boa medida, nunca se tratou de um assunto essencialmente ideológico, mas sim da busca por conciliar uma série de interesses contraditórios e atenuar arestas entre partes que poderiam ver suas demandas preteridas. Na manifestação que fez na tribuna antes da votação do primeiro turno, tratou de deixar claro que a Reforma Tributária não era “joguete político”. Foi um recado ao ex-presidente.

A maior parte da resistência inicial ao esforço em favor do texto, alias, veio de Tarcísio. Por razões técnicas, diga-se. Ele foi o primeiro a vocalizar a inconformidade de governadores do Sul e do Sudeste com aspectos relevantes do projeto, principalmente pelo risco de desequilíbrio representativo no Conselho que vai administrar o futuro Imposto sobre Bens e Serviços (que unificará o ISS e ICMS) e pela eventual perda de autonomia dos entes federados.

Usou o poder e a influência do estado de São Paulo para pressionar mudanças que aprimoraram a versão final do texto. Quando entendeu que havia avançado o suficiente, o governador de São Paulo tratou de se manifestar favoravelmente pela aprovação. Fez política maiúscula, e saiu vencedor na discussão.

Gente séria defendeu e criticou a reforma de forma técnica. É do jogo. É forçoso reconhecer, entretanto, que seria impossível chegar a um denominador comum que agradasse a todos. Modificações estruturais profundas como essa nunca são a materialização do idealismo, mas da realidade. A política, afinal, é “arte do possível”, para citar Fernando Henrique Cardoso.

Ainda que não seja perfeita, a Reforma Tributária pode dar ganho de produtividade ao país, diminuir demandas judiciais, facilitar investimentos, aumentar a previsibilidade econômica e facilitar a vida da sociedade como um todo. Os atores que a apoiaram poderão colher os frutos políticos de seus resultados benéficos. Lira dirá que o Congresso foi protagonista em outra matéria relevante, Lula dirá que o empenho do governo foi fundamental e Tarcísio que ajudou a aprimorar a versão final do texto. Bolsonaro, que poderia passar ao largo da discussão sem acumular desgaste, ficará como dono exclusivo da derrota, apenas porque acha que fazer oposição é desejar o quanto pior melhor.

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