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Os mais jovens – os millennials, a Geração Z e até mesmo os Alpha (os que estão vindo depois da Geração Z) – podem não acreditar, mas houve um tempo em que os filhos respeitavam a autoridade dos pais. Hoje, como se sabe, a família convencional, com pai e mãe preocupados com a formação das crianças, virou uma coisa fora de moda – ou, pior ainda, passou a ser vista como uma instituição fascista, a serviço da opressão falocrática, da reprodução de papéis sociais heteronormativos e de um projeto autoritário de poder.

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Os pais - e, por extensão, a família - viraram inimigos a abater. Desconfio que o mandamento “Honrar pai e mãe” poderia ser classificado hoje como “cringe”: atualmente faz tanto sentido para um adolescente obedecer aos pais quanto dar importância ao café da manhã ou usar um determinado modelo de roupa ou corte de cabelo. Aliás, é questão de tempo para cancelarem os 10 Mandamentos nas redes sociais.

Nesse contexto, fiquei sinceramente impressionado ao ler que uma médica em São Paulo, Fernanda, excluiu as contas de sua filha de 14 anos nas redes sociais, preocupada que estava com os efeitos da internet na formação de sua filha Nina. Aos 14 anos, a menina já tinha mais de 2 milhões de seguidores no Instagram e no TikTok, era considerada uma “influencer” e tinha diversos fã-clubes.

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Pelos padrões atuais, muitas mães estimulariam essa "carreira" e até trabalhariam como assessoras da filha. Fernanda não. E ela explicou por quê, em um texto postado no Instagram que viralizou nas redes sociais. Naturalmente, apesar de sua enorme sabedoria, o texto – reproduzido abaixo com grifos meus – provocou revolta e indignação entre muitos seguidores de Nina. Mas nem tudo está perdido: provocou também reações de apoio de muitos pais e adultos em geral. Deveria ser leitura obrigatória para todos os adolescentes cuja ambição é ser famoso nas redes sociais.

“Turminha teen, eu vou escrever aqui porque recebi muitos directs de seguidores da Nina querendo saber o que aconteceu por ela ter sumido.

Decidi apagar a conta do Tiktok e do Instagram dela. Chata, eu sei, mas nossa função como mãe não é ser amiguinha de vocês e isso vocês só vão entender em retrospectiva. Papo de tia.

O carinho que vocês têm por ela é a coisa mais fofa mas eu não acho saudável nem para um adulto e muito menos para uma adolescente basear referências de autoconhecimento em feedback virtual.

Isso é ilusão e ilusão mete uma neblina danada na estrada do se encontrar. Entre suas mídias eram quase 2 milhões de seguidores, dezenas de fã clubes, tudo muito doce mas também prejudicial para qualquer adolescente em processo de descoberta e busca pela individualidade.

Eu não quero que ela cresça acreditando que é esse personagem. Não quero ela divulgando roupas inflamáveis de poliéster made in China. Não quero minha filha brilhante se prestando a dancinhas diárias como um babuíno treinado. Acho divertido... e mega insuficiente.

Triste geração em que isso justifica fama. Li outro dia que a gente tem que voltar a ter vergonha de ser burro e é bem por aí. Saudade de quando precisava ter talento em alguma coisa para se destacar. Nascemos com vários dons que nos fazem únicos, mas quando a gente copy paste a manada eles se diluem no processo e a gente cresce sendo só mais um na multidão.

Não quero que ela se emocione com biscoitos (assim que fala?) e elogios. Nem que se abale com críticas de quem não conhece. Opiniões são só reflexos de quem está oferecendo e não de quem recebe. Você me acha linda pq você é linda ou está feliz. Você me acha feia pq você é feia ou teve um dia ruim. Eu não tenho nada a ver com isso. (...)

A vida só presta quando se é feliz offline primeiro. Bjs da tia Fê”

Concordo com tudo. A função dos pais não é ser amiguinho dos filhos, é educar e proteger.  E não é saudável basear as referências de autoconhecimento e identidade em feedback virtual, mas esta é cada vez mais a regra, infelizmente. Mas concordo, principalmente, com isso: as pessoas precisam voltar a sentir vergonha de ser burras. Porque hoje elas são incentivadas a ter orgulho da burrice. A inteligência virou um defeito: em breve será proibido ser inteligente, porque isso oprime os burros. Nada de bom pode vir daí.

Aparentemente, muitos seguidores da adolescente não captaram a mensagem. Tanto que, segundo foi divulgado, Fernanda voltou a postar sobre o assunto o texto abaixo, igualmente rico em sabedoria:

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Perfeito, mais uma vez: um texto tão curto quanto repleto de lições. “Ser famoso em rede social é como ser rico em banco imobiliário” é uma frase que merece ser emoldurada. Até quando vamos ensinar aos nossos filhos que é mais importante ser famoso que estudar e ter uma profissão? Os jovens precisam romper com isso e mirar mais alto. Como pai de uma adolescente, só tenho duas palavras a dizer à dra. Fernanda: parabéns e obrigado!