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Alexandre de Moraes, presidente do TSE, discursa na inauguração do Ciedde.
Alexandre de Moraes, presidente do TSE, discursa na inauguração do Ciedde.| Foto: Luiz Roberto/Secom/TSE

A liberdade foi encurralada, os ataques a ela são oficiais e não podem ser questionados. O sistema de perseguição, de mordaça, de cala-boca, de censura é pesadíssimo... Está tudo por um fio. A liberdade é esculachada, antes de sua eliminação total. Se ainda pulsa eventualmente, a reação é imediata. Pulam em seu cangote e a espancam, até o último suspiro. Há forças organizadas para isso, maldisfarçadas, fingindo tomar para si a salvação e proteção daquilo que destroem sem dó nem piedade.

O dinheiro dos pagadores de impostos é usado sem pudor para pressionar as empresas de comunicação. Jornalistas reais, que querem buscar a verdade, que não aceitam ser uma “assessoria de imprensa do governo”, têm de ser demitidos. Foi o que aconteceu à editora do Estadão afastada do jornal pouco tempo depois de publicar reportagem sobre a visita da “Dama do Tráfico” ao Ministério da Justiça. Quem acredita nas acusações de assédio contra colegas feitas a ela? Foi o que aconteceu também a três conhecidos meus do Rio Grande do Sul.

Há pouco tempo, quando fui a Porto Alegre para uma palestra, conversei com o diretor de um importante jornal do estado que se rendeu à pressão do PT para que sejam eliminados da imprensa os críticos do governo. Eu não sabia quem ele era e comentei por acaso a absurda e recente demissão de um grande jornalista gaúcho. Imediatamente, ele se identificou como executivo do jornal em que esse meu conhecido trabalhava, confirmou que houve pressão da Secretaria de Comunicação do Lula e disse que foi o único da diretoria a se opor à dispensa.

O dinheiro dos pagadores de impostos é usado sem pudor para pressionar as empresas de comunicação. Jornalistas reais, que querem buscar a verdade, que não aceitam ser uma “assessoria de imprensa do governo”, têm de ser demitidos

O interesse na verba de publicidade do governo parece sempre mais importante do que o compromisso com a independência, com a liberdade, com o verdadeiro jornalismo. Uma verba que nem deveria existir vira instrumento de chantagem, como no caso da Jovem Pan. O grupo ficou praticamente sem receita publicitária do governo e tem sofrido constantes ameaças. Querem que pague mais de R$ 13 milhões em “indenização por dano moral coletivo”, e a JP ainda pode perder concessões de emissoras de rádio.

A Jovem Pan se tornou alvo do Ministério Público Federal por “abrigar comentaristas bolsonaristas”, que foram todos demitidos, ainda que tivessem as maiores audiências da emissora. O Brasil do PT não admite o debate, mas o ministro da Secretaria de Comunicação, Paulo Pimenta, diz que segue recomendações do Tribunal de Contas da União: “cessar, nos contratos sob responsabilidade do governo, o direcionamento de recursos de campanhas publicitárias para mídias que se relacionem a atividades ilegais, como a disseminação de fake news”.

Muitas vezes, nem é preciso haver a chantagem petista, os próprios veículos se antecipam e mandam embora quem poderia atrapalhar a chegada de verbas federais de publicidade. Na minha última emissora de televisão, a estratégia dos donos foi exatamente essa. Eles fizeram esse movimento, cortaram cabeças, promoveram quem certamente agradaria ao governo e ainda botaram no comando do jornalismo um ex-assessor do Lula. Estão aguardando a recompensa.

O jornalista Allan dos Santos continua sendo caçado pelo PT e pelo STF. Ele acabou fechando seu canal, o Terça Livre, que chegou a ter 60 funcionários, e deixou o Brasil. Seu pedido de extradição foi negado pelos Estados Unidos, porque lá não existe “crime de opinião”. Aqui também não havia, mas isso mudou. Na perseguição ao jornalista levada ao extremo, agora o Ministério da Justiça vai pedir sua extradição por “formação de quadrilha e lavagem de dinheiro”. Que quadrilha o Allan formou? Se não há crime, não há quadrilha. E como podem querer enquadrar como “lavagem de dinheiro” o recebimento de receita gerada por conteúdo publicado numa plataforma de vídeos?

As leis vão sendo descumpridas, vão sendo reinventadas ou criadas. Se o Congresso não quer saber do PL da Censura, o TSE o adota, para “regulamentar” as mídias digitais, as redes sociais. Entram no ordenamento jurídico na marra mecanismos para calar opositores dos poderosos, para impedir que as pessoas tenham liberdade de se manifestar. E o aparato estatal de censura vai ganhando comitês, conselhos, ferramentas variadas para perseguir e silenciar as pessoas.

Temos agora o Centro Integrado de Enfrentamento à Desinformação e Defesa da Democracia, que é ligado ao TSE, com a participação do Ministério da Justiça, do Ministério Público, da OAB e da Agência Nacional de Telecomunicações. Só este grupo sabe o que é verdade e o que é mentira. Não há, obviamente, referência à censura, mas a ameaça é bem clara... A logomarca do Ciedde é um olho, como aquele do Grande Irmão, do livro 1984, do britânico George Orwell.

O Estado policialesco tem superpoderes. Vai permitir apenas um tipo de opinião, um tipo de pensamento. Debate não haverá. Críticas, afirmações que desagradem a quem está no controle de tudo, isso será proibido de vez

É o “Ministério da Verdade” instituído pelo Executivo e pelo Judiciário, com o apoio da tal sociedade civil, representada pela OAB... Para alegria do presidente da Agência Nacional de Telecomunicações, que disse o seguinte: “A Anatel irá usar a plenitude de seu poder de polícia junto às empresas de comunicação para retirar do ar todos os sites e aplicativos que estejam atentando contra a democracia”.

Já não vale mais a Constituição, não bastam o Marco Civil da Internet, a Lei Geral de Proteção de Dados, o Código Penal, os crimes de injúria, calúnia e difamação, os crimes cibernéticos... O Estado policialesco tem superpoderes. Vai permitir apenas um tipo de opinião, um tipo de pensamento. Debate não haverá. Críticas, afirmações que desagradem a quem está no controle de tudo, isso será proibido de vez. No império da censura, aqueles que mandam usam conceitos vagos, ambíguos, interpretativos. São eles que decidem o que é “desinformação”, o que significa “fake news”, “discurso de ódio”, “desordem informacional”, nessa sua definição muito particular de democracia.

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
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