Marcelo Andrade/Gazeta do Povo| Foto:

O PT é um partido no estilo da velha esquerda, com laivos de via chilena e pitadas de esquerda de câmpus. Um dinossauro no cenário das democracias liberais e sua “crise de meia-idade” – como diz David Ruciman em seu How Democracy Ends (como acabam as democracias). O atavismo político e social brasileiro sustenta a vivacidade de nosso debate político.

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O PT pretende, desde sua fundação, chegar ao poder e não sair dele nunca mais. Se há nele “elementos democráticos” (como respeitar a ordem institucional), esses “elementos” existem na dependência da sobrevivência do partido como ferramenta viável de chegada ao poder e sua manutenção por tempo indeterminado. Entre a ordem institucional e a defesa da manutenção do poder, escolhe-se a segunda. Para o PT, o Lula é a ordem institucional, dane-se o resto.

Pergunta-se, por exemplo, se as Forças Armadas quebrariam a ordem institucional. Mas há uma pergunta anterior, que podemos perceber indícios por toda parte – e a insistência do PT que fazia de Lula seu candidato mesmo após sua condenação em segunda instância só reforça essa percepção. Qual a função da democracia liberal burguesa e sua ordem institucional para a visão política marxista-leninista que é a raiz filosófico-política das inteligências que alimentam o PT e grande parte da esquerda nacional? Respondo: a função da democracia liberal burguesa é apenas servir de trampolim para sua posterior destruição.

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Sei. Dirão que essas são categorias históricas superadas. Mas grande parte da estrutura política latino-americana é atávica mesmo. Se patinamos em modos coloniais de funcionamento, repetindo estruturas herdadas da escravidão, repetimos também modos políticos que vão do século 19 à Guerra Fria do 20, no tocante à expectativa “democrática revolucionária” do tipo leninista, trotskista ou maoísta. Somos atrasados até nisso: a “esperança” da esquerda brasileira é voltar para a primeira metade do século 20. Ela ainda quer “derrubar” a ditadura.

Se a esquerda fala tanto da ditadura militar no Brasil é porque ela está, ainda, mentalmente e politicamente, naquele lugar. A União Soviética ruiu, mas não na América Latina. Cuba e o delírio que intelectuais brasileiros mantêm com a ilha mantida na miséria são as provas evidentes desse atavismo mental e político.

Para qualquer pessoa letrada em marxismo e leninismo, é evidente que questões como corrupção, respeito à ordem institucional, defesa da liberdade de expressão e afins só importam enquanto servirem como retórica para tomada e manutenção do poder, jamais como valores intrínsecos. E a razão é a própria teoria marxista, que tem desprezo pelo vocabulário e imaginário da democracia liberal burguesa. Se o burguês é dado a uma forma hipócrita de humanismo (chora por crianças com fome e demite seus pais pelo lucro), ele também fala de democracia, contanto que “as massas exploradas” continuem servindo cafezinho. E, portanto, a democracia da burguesia não vale nada. E sua ordem institucional tampouco.

Sim. Dirão que o PT é um partido da social-democracia europeia. Direi que não. Até pode haver laivos disso nele, mas social-democracia europeia é coisa de rico. No Brasil, estaria mais ligado ao povo chique que vive entre a Praça Panamericana e Higienópolis, tipo o PSDB histórico (a Sorbonne do então PMDB). O discurso do PT e da esquerda brasileira se aproxima mais da “via chilena” dos anos 1970: chegar ao poder via voto popular e dele não sair nunca mais. Isso implicava, e implica, na transformação da ordem institucional para sustentar sua própria concepção de democracia. A mesma transformação de Cuba e Venezuela (com diferenças aqui e ali). A esquerda destruiria a ordem institucional facilmente, com apoio, inclusive, de grande parte da inteligência pública, na mídia e nas universidades.

Faça um teste: pergunte o que grande parte dessa moçada pensa de Cuba e Venezuela. O que o PT pensa já sabemos. Seus governos foram íntimos aliados e defensores (inclusive com o nosso dinheiro) dos “ditadores democráticos” desses dois países. E a esquerda de câmpus? Essa é a nova esquerda, que tem medo de sangue e quer um shopping para chamar de seu. São os departamentos de Ciências Humanas que “pesquisam” gênero, votam no PT, mas fariam xixi nas calças diante de Marx e Lenin e detestam gente que cheira a ônibus.

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A esquerda marxista-leninista sempre desprezou a ordem institucional. Falam nela pra enganar bobo.